O que foram as chamadas invasões bárbaras e por que razão os povos envolvidos eram assim denominadas?

1. RESUMO

A monografia tem por objetivo apurar a história da pena de prisão priorizando demonstrar sua origem. A análise foi realizada por meio de uma pesquisa histórica sobre as circunstâncias que influenciaram o estabelecimento da prisão como principal sanção penal. Serão abordadas duas questões principais: as práticas penais adotadas pelos antigos antes da pena de prisão ser concretizada e os fatores que ocasionaram o seu surgimento. O tema será discutido em três capítulos. De modo que, no segundo capítulo serão abordadas as penas adotadas pelos primitivos e o surgimento da pena de prisão. No terceiro capítulo serão elencados os principais sistemas penitenciários, discorrendo sobre cada um e, quando possível, será feito um paralelo com a atualidade. O quarto capítulo será reservado para discorrer sobre a história da pena de prisão no Brasil. Dessa forma, se destacará os fatos históricos mais relevantes para o estabelecimento da privação da liberdade como pena. O tema é relevante por ampliar a área de conhecimento dos leitores acerca das circunstâncias em que a pena de prisão foi concretizada, para que assim seja possível fazer uma reflexão sobre a ineficácia da prisão como sanção penal.

Palavras-chave: Prisão. Pena. Origem. História. Direito Penal.

2. INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por escopo examinar os aspectos históricos do surgimento da pena de prisão, bem como analisar a causa determinante para ter se tornado a principal sanção penal.

Pretendemos esclarecer a utilidade do direito penal para o controle social e estudando, através de suas causas econômicas e sociais, a origem e a “evolução” da pena de prisão como instrumento de dominação de classe.

Assim, buscamos verificar a influência de cada fase histórica na aplicação da pena, de modo que o trabalho é composto por quatro capítulos, que no seu deslinde irão responder ao seguinte questionamento: como surgiu a pena de prisão?

O segundo capítulo apresenta a digressão histórica desde os primórdios da pena, quando ainda a privação da liberdade não era utilizada como pena propriamente e sim como custódia, até o surgimento do capitalismo, quando a prisão se converteu no principal método punitivo. Sendo assim, a pesquisa terá início no ano 4.000 a. C. indo até o século XVIII, demonstrando as práticas penais durante a Idade Antiga, a Idade Moderna e o Iluminismo.

No terceiro capítulo passaremos a explanar os sistemas penitenciários. Com a pena de prisão já estabelecida como base do Direito Penal, criou-se um ambiente perfeito para surgirem “técnicas de encarceramento”. Nesse desiderato, nasceram os sistemas pensilvânico, filadélfico ou celular, auburniano e progressivo, que foram legitimados pela suposta intenção de “ressocializar” o preso.

O quarto e último capítulo é dedicado a “evolução” histórica da pena de prisão no Brasil. Para tanto, abordar-se-á a contribuição de cada fase da história brasileira. O estudo principia pelo Período Colonial, segue pelo Período Imperial e pelo Período Republicano.

O capítulo em epígrafe esclarece ainda que o sistema penal brasileiro embrionário era marcado por punições desumanas dos senhores sobre seus escravos e que com o passar do tempo a privação da liberdade foi eleita como a forma adequada para a manutenção do controle social, sendo sua finalidade propagandeada como “ressocializadora”.

A metodologia utilizada no trabalho é a bibliográfica (GIL, 2008, p. 44). Tendo por finalidade retratar as transformações sociais que influenciaram os métodos punitivos com passar do tempo, para que assim possamos refletir sobre a pena de prisão e contestá-la nos moldes que é aplicada hodiernamente.

3. A HISTÓRIA DA PENA DE PRISÃO NO MUNDO

3.1. IDADE ANTIGA

A Idade Antiga é o período histórico em que as primeiras civilizações surgiram e se desenvolveram. Essa época foi marcada pelo nascimento da escrita, por volta de 4.000 a 3.500 a. C., até a queda do Império Romano do Ocidente em 476 d.C. e o início da Idade Média no século V (CALDEIRA, 2009, p. 272).

Diferentes civilizações se formaram nesse período. No entanto, o presente estudo abarcará, especificamente, as civilizações clássicas Grega e Romana.

3.1.1. Vingança Privada

Antes da constituição do Estado moderno, considerado o detentor do poder de punir, a sociedade já se organizava em grupos. Mas apenas existiam famílias, clãs e tribos, com nível muito baixo de organização social (TELES, 2006, p. 20).

Os “clãs” ou “bandos”, como costumavam ser preconceituosamente chamados, tentando regular a conduta dos componentes do grupo, estabeleciam regras que visavam ao bem estar comum (TELES, 2006, p. 20).

Tais regras eram direcionadas para a proteção própria ou de quem fazia parte do grupo, constituindo-se no princípio do parentesco (Wolkmer, 2010, p. 3), de modo que a pena era um mecanismo de defesa privado, isto é, uma vingança individual.

Dessa necessidade de estabelecer regras de convivência surgiram as sanções como meio de manter a comunidade unida e protegida, sendo elas uma das primeiras demonstrações de uma estrutura normativa de conduta, como preleciona Caldeira (2009):

O ser humano sempre viveu agrupado, em virtude de seu nítido impulso associativo e lastreou, no seu semelhante, suas necessidades, anseios, conquistas, enfim, sua satisfação. E desde os primórdios, o ser humano violou as regras de convivência, ferindo os semelhantes e a própria comunidade onde vivia, tornando inexorável a aplicação de um castigo (sanção). No início, a punição era uma reação coletiva contra as ações antissociais (CALDEIRA, 2009, p. 260).

Nesse passo, aos que desrespeitassem algum interesse de seus membros punia-se com a perda da paz, que consistia na expulsão do infrator da comunidade, que perdia a proteção do grupo, e ao estranho que violasse qualquer valor individual ou coletivo era aplicada a vingança de sangue (TELES, 2006, p. 19).

As penas eram executadas sem nenhuma proporção, já que atingia tanto a pessoa considerada culpada quanto aqueles que tinham algum vínculo com ela, o que caracterizava sua desproporcionalidade (CALDEIRA, 2009, p. 260).

Nas palavras de Chiaverini (2009, p. 02): “o homem primitivo não pergunta: como isso ocorreu? Pergunta apenas: quem fez?” A verdade é que tal fato se repete nos nossos dias, considerando que existem as execuções privadas levadas a termo por justiceiros.

A característica mais marcante da época em análise, que pode ser observada na atualidade, reflete-se na reação da sociedade que retribuía o mal causado, sendo que a sanção era utilizada com a finalidade de vingar-se do mal feitor (Chiaverini, 2009, p. 02).

Destaca-se que não há registros históricos de prisão nesse período, como explanado acima, as penalidades eram aplicadas pessoalmente pelos que se sentiam lesados, sendo assim o aprisionamento não era conhecido entre os antigos nessa fase da história (Chiaverini, 2009, p. 02).

Assim, o período que compreende a vingança privada foi marcado pela retribuição da vítima pelo mal causado. Não existia um detentor do poder de punir, os responsáveis para penalizar quem agisse em desarmonia com as regras eram o próprio ofendido, os seus consanguíneos e até mesmo o grupo social, uma vez que no contexto familiar da época eram considerados “parentes” (Wolkmer, 2010, p. 3).

3.1.2. Vingança Divina

Ainda na Idade Antiga pôde ser observado outro aspecto relevante que, com o passar do tempo, tomou força entre os antigos que foi a influência da religião, visto que a crença era de que a paz adivinha dos deuses, como ensina Caldeira (2009):

[...] a pena possuía uma dupla finalidade: (a) eliminar aquele que se tornara um inimigo da comunidade e dos seus deuses e forças mágicas, (b) evitar o contágio pela mácula de que se contaminara o agente e as reações vingadoras dos seres sobrenaturais. Neste sentido, a pena já começa a ganhar os contornos de retribuição, uma vez que, após a expulsão do indivíduo do corpo social, ele perdia a proteção do grupo ao qual pertencia,podendo ser agredido por qualquer pessoa. Aplicava-se a sanção como fruto da liberação do grupo social da ira dos deuses em face da infração cometida, quando a reprimenda consistia, como regra, na expulsão do agente da comunidade, expondo-o à própria sorte. Acreditava-se na forças sobrenaturais – que, por vezes, não passavam de fenômenos da natureza – razão pela qual, quando a punição era concretizada, imaginava o povo primitivo que poderia acalmar os deuses. Por outro lado, caso não houvesse sanção, acreditava-se que a ira dos deuses atingiria a todo o grupo (Caldeira, 2009, p. 260).

Destarte, nos primórdios a concepção da sanção não era racional. As penas eram aplicadas levando em consideração as emoções e sentimentos, sendo também baseadas em acontecimentos naturais. Por esse motivo, os eventos que não podiam ser explicados, por falta de conhecimento científico, como por exemplo, os trovões, raios etc., eram considerados sinais dos deuses (CALDEIRA, 2009, p. 261).

Segundo Freud (2013) a essas figuras sobrenaturais que, hipoteticamente, se relacionavam com a comunidade e exerciam influência sobre seus membros na forma de acontecimentos naturais era dada a denominação de totens e tabus. Sendo que o totem era considerado um “objeto material ao qual o selvagem presta um respeito supersticioso, pois acredita que entre sua própria pessoa e cada objeto dessa categoria existe uma relação bem especial” (Freud, 2013, p. 159-160), por sua vez os tabus eram restrições imaculadas às quais:

[...] esses povos primitivos se submetem; isto e aquilo são proibidos, eles não sabem por que e também não lhes ocorre a perguntar a respeito, mas se submetem a elas como se fossem algo natural e estão convencidos de que a transgressão será punida automaticamente da maneira mais dura (FREUD, 2013, p. 62- 63).

Desse modo, por meio da religião, a pena passou a ser encarada como castigo e quem ousasse infringir as supostas ordens divinas sofria a condenação dos deuses.

Nas sociedades da antiguidade, muitas vezes a legislação não era escrita, sendo exposta de forma oral, a pena advinha da vontade divina, as sanções eram aplicadas de acordo com rituais passados através de várias gerações, originando regras de comportamento (Wolkmer, 2010, p. 02). A esse respeito elucida Wolkmer (2010):

Nas manifestações mais antigas do direito, as sanções legais estão profundamente associadas às sanções rituais. A sanção assume um caráter tanto repressivo quanto restritivo [...]. Para além do formalismo e do ritualismo, o direito arcaico manifesta-se não por um conteúdo, mas pelas repetições de formulas, através dos atos simbólicos, das palavras sagradas, dos gestos solenes e da força dos rituais desejados (Wolkmer, 2010, p. 04).

Podemos concluir que em todas as “etapas” da Idade Antiga estavam presentes o aspecto religioso e o consuetudinário e, baseado nesse temor sacro, tornou-se favorável o surgimento de um poder central. Desse modo, quase na totalidade dos casos a interpretação da lei era feita por sacerdotes ou suseranos, pois eram considerados pessoas capacitadas e eleitas pelos deuses para interpretar suas vontades. Logo, eram eles os detentores do poder de punir (Wolkmer, 2010, p. 04).

Assim sendo, o poder era direcionado para os que tinham uma posição social mais elevada, que aplicavam sanções de acordo com a interpretação dos sinais supostamente revelados pelas divindades religiosas (Coulagens; Maine apud Wolkmer, 2010, p. 02).

À vista disso, os condenados pelos sinais afirmadamente sobrevindos dos deuses aceitavam seu destino por medo de que, não se submetendo à punição, aborreceriam ainda mais os deuses, recaindo o castigo da mesma forma sobre sua família ou sobre sua comunidade (CHIAVERINI, 2009, p. 02).

Posteriormente, as leis começaram a ser escritas e aplicadas de forma genérica e homogênea. Isso porque, descobriu-se que a forma escrita era mais prática e eficiente para recordar e manter, em larga escala o poder do suserano. Assim as leis escritas eram melhores depositários do direito e meios mais eficazes para sua conservação do que a memória de certo número de pessoas (Coulagens; Maine apud Wolkmer, 2010, p. 05).

Outrossim, com o avanço da vingança privada e divina chegou-se à Lei de Talião, que para época foi considerada uma verdadeira inovação, na medida em que trouxe a proporcionalidade no tocante à aplicação da pena, restringindo a vingança privada (TELLES, 2006, p. 20). Nas palavras de Chiaverini (2009, p. 03):

“Com a evolução social e diante da necessidade de evitar a dizimação das tribos com as vinganças coletivas, surgiu o talião, que limitava a reação à ofensa a um mal idêntico ao praticado (sangue por sangue, olho por olho, dente por dente).”

Podemos citar, ainda, a Lei das XII Tábuas, o Código de Hamurabi, o Códico de Manu e o Código de Sólon. Essas antigas codificações apresentavam uma série de punições, como variadas formas de pena de morte e mutilação.

A título de exemplo é válido citar cláusulas do Código de Hamurabi. Criado na Mesopotâmia, por volta do ano 1700 a. C., pelo rei Hamurabi, que ao publicar o seu código quis, supostamente, satisfazer o deus Samas, considerado o deus da justiça (pinto, 2010, p. 29), prevendo penas que deveriam ser assustadoras para quem transgredisse alguma norma. Assim estabelecia o Código:

2. Se alguém fizer uma acusação a outrem, e o acusado for ao rio e pular neste rio, se ele afundar, seu acusador deverá tomar posse da casa do culpado, e se ele escapar sem ferimentos, o acusado não será culpado, e então aquele que o fez a acusação deverá ser condenado á morte, enquanto que aquele que pulou no rio deve tomar posse da casa que pertencia a seu acusador.

[...]

22. Se estiver cometendo um roubo e for pego em flagrante, então ele deverá ser condenado á morte (CÓDIGO DE HAMURABI, acessado em 08 jun. 2014).

Outra característica essencial do Código de Hamurabi era a diferenciação das penas de acordo com a classe social. Vejamos:

[...] há um estrato de homens livres, uma camada de homens dotados de personalidade jurídica, mas com liberdade limitada (pode-se chamá-los “subalternos”) e uma parcela de escravos (equiparados ao um bem móvel). Não é difícil concluir que o código dará um tratamento diferenciado a cada um desses segmentos: por exemplo, aquele que, espancando a filha de um homem livre, faz com que ela aborte pagará uma indenização de 10 siclos de prata; se se tratar da filha de um subalterno, 5 siclos; de um escravo apenas 2 (Aymard; Auboyer apud pinto, 2010, p. 33).

Salienta-se que nessa época não era difundida a prisão como pena-castigo, tema central deste trabalho, contudo já era utilizada em algumas situações como pena-custódia ou pena-processual, sendo empregada para assegurar a aplicação da penalidade e não como pena propriamente.

Não obstante as leis falarem pouco sobre as prisões, através da literatura é possível constatar que eram utilizadas nos casos de dívida, rapina, corrupção, rebelião de escravos e para estrangeiros cativos (Morris; Rothman apud Chiaverini, 2009, p. 03).

No Egito a prisão era utilizada com o objetivo de punir, como podemos averiguar na citação abaixo:

No Egito temos notícia da prisão não apenas como custódia, mas como pena. O governo do faraó era divino e evitava penas cruéis e arbitrárias. As prisões conhecidas também impunham aos encarcerados trabalho forçado. As prisões são descritas como fortalezas contendo celas e masmorras ou como casas de trabalho. A fuga da prisão consistia em pena grave. Nesses locais os prisioneiros não eram classificados nem separados de acordo com sua situação. Conviviam presos aguardando julgamento e já condenados, condenados aguardando execução, condenados à pena de prisão perpétua ou indefinida, desertores do Estado ou oficiais que caíram em desgraça, suspeitos de espionagem; sendo que todos eram forçados a trabalhar (Morris; Rothman apud Chiaverini, 2009, p. 04).

Diante de tais assertivas resta clarividente que a prisão não tinha essencialmente o caráter de sanção penal, de modo que a privação da liberdade, na maioria das vezes, não era tida como pena, detendo ao revés a finalidade de conter os apenados para garantir a execução da verdadeira penalidade

3.1.3.  Vingança Pública

Com o passar do tempo diante da maior organização social e política dos povos é possível constatar em algumas cidades-estado, como por exemplo, na antiga Grécia indícios de punições públicas (CHIAVERINI, 2009, p. 04).

Paulatinamente, a aplicação da pena deixou de ter o aspecto religioso. O poder dos suseranos, que já era abundante, ficou mais centralizado e fortalecido e os atos considerados criminosos correspondiam aos que, de alguma maneira, atingissem o Estado representado na pessoa do suserano. Essa realidade levava a uma insegurança jurídica e a desproporcionalidade da aplicação da pena (CHIAVERINI, 2009, p. 04).

Todavia, por mais que se queira não é possível observar uma ruptura radical entre vingança divina e a vingança privada, visto que ainda os suseranos legitimavam suas ações por meio do religioso.

Importante ressaltar que na fase da vingança divina também percebemos um pouco da vingança pública e vice versa, pois já existia a figura do suserano (juntamente com o sacerdote) comandando a aplicação da pena. Entretanto, foi na fase da vingança pública que realmente sua figura ganhou destaque, visto que na fase anterior sobressaia-se a pena com caráter divino, sendo que o suserano apenas a interpretava, no lugar de ser o verdadeiro ditador das normas.

O suserano simbolizava o poder, representando o interesse da comunidade em geral. Nesse ínterim, asseveram Zaffaroni e outros (2003, p. 389) que “o modelo de solução de conflitos pelas partes se sustentou enquanto não foi gerado um poder central verticalizante, mas quando este apareceu e adquiriu força suficiente, confiscou a vítima mediante o modelo decisório ou punitivo”.

Ressalta-se que nada mudou em relação à arbitrariedade e à crueldade em que as penas eram aplicadas, haja vista que as mudanças limitavam-se ao fato de que a pena era executada pelo suserano e não pelas partes envolvidas na questão (ZAFFARONI et al., 2003, p. 389).

Como nas demais fases a prisão não se destacou entre as punições, sendo que o indivíduo ficava confinado de forma temporária aguardando sua condenação (CHIAVERINI, 2009, p. 11).

3.1.4. Direito Grego

O direito na Grécia antiga não divergiu muito dos demais povos da antiguidade. Diante disso serão abordados aspectos mais relevantes no que concerne a prisão.

Através de registros históricos é possível constatar a existência de prisões na Grécia Antiga. Segundo Platão, no livro As Leis, subsistiam três espécies de prisão, sendo a primeira para manter as pessoas presas, com o intuito de prevenir novos delitos, a segunda era destinada para os indivíduos que podiam se recuperar, de forma que não funcionava como punição, mas como correção, a terceira era designada para a função punitiva, destinada aos “criminosos” que cometessem os delitos mais graves (PLATÃO, 1999, p. 430).

As prisões ficavam afastadas, pois a intenção era que o preso permanecesse em constante isolamento (CHIAVERINI, 2009, p. 05).

Não obstante, as prisões, na maioria das vezes, tinham o objetivo de assegurar a aplicação da punição, funcionando como custódia para certificar o cumprimento da verdadeira pena: a execução através da morte ou da disputa na arena (CHIAVERINI, 2009, p. 05).

Na Grécia era muito comum encarcerar o devedor até o pagamento da dívida:

[...] a Grécia também conheceu a prisão como meio de reter os devedores até que pagassem as suas dívidas. Ficava, assim, o devedor a mercê do credor, como seu escravo, a fim de garantir o crédito. Essa prática, inicialmente privada, foi posteriormente adotada como pública, mas ainda como medida coercitiva para forçar o devedor a pagar a dívida (BITENCOURT, 2011, p. 23).

Apesar de prevista, a pena de prisão-castigo não representou o foco das punições da Grécia antiga, visto que as penalidades mais aplicadas eram a pena de morte, o exílio e a multa (CHIAVERINI, 2009, p. 06). Desse modo, o encarceramento era utilizado com fins de custódia.

3.1.5. Direito Romano

Em Roma verificou-se uma considerável redução na crueldade das penas, decorrente de uma nova concepção política, como denota Zaffaroni e outros (2003):

A legislação penal greco-romana pode ser considerada o ponto de secularização do poder punitivo e de uma limitada atenuação na crueldade das penas, como consequência de uma diferente concepção política acerca do governo e da autoridade, o que permitiu o aparecimento da composição, isto é, o cancelamento da pena mediante pagamento à vítima ao a seus parentes (controlada pela autoridade) e a obtenção da primeira distinção entre delicta publica e delicta privada. No direito romano, os primeiros eram perseguidos pelos representantes do estado em seu próprio interesse; os segundos, pelos particulares em benefício pessoal (ZAFFARONI et al., 2003, p. 389).

Na república os crimes privados diminuíram e o suserano assumiu suas funções de jurisdição. Nesse período, existia previsão de prisão para os devedores, entretanto com a finalidade de custódia. Também existe registro de prisões mantidas pelo chefe da família romana na própria casa com o propósito de corrigir os seus membros ou os escravos (Morris; Rothman apud Chiaverini, 2009, p. 06). A esse respeito vejamos:

[...] também em Roma existia a chamada prisão por dívida, penalidade civil que se fazia efetiva até que o devedor saldasse, por si ou por outro, a dívida. [Existia também as prisões denominadas] ergastulum, que era o aprisionamento e a reclusão dos escravos em um local destinado a esse fim na casa do dono. Quando era necessário castigar um escravo, os juízes, por equidade, delegavam tal tarefa ao pater familias, que podia determinar a sua reclusão temporária ou perpétua no referido ergastulum. Se o senhor não desejasse assumir esse compromisso, ocorria a renúncia presumida à propriedade do escravo. Este poderia ser condenado à pena perpétua de trabalhos forçados. Além dos escravos, tais castigos podiam ser empregados a indivíduos ditos de classes inferiores, que, dois de dez anos de serviço contínuo, quando não mais podiam trabalhar, eram entregues aos seus familiares, em descanso forçado (uma espécie de disponibilidade). Contrariamente, os membros das classes superiores eram condenados a trabalhos temporários de caráter público (BITENCOURT, 2011, p. 23).

No período do Império, Roma era governada pelo Rei, que assumia o cargo de magistrado, chefe político e religioso. O poder punitivo começou a se tornar uma atribuição do suserano, vejamos:

[...] com o advento do império, o procedimento penal extra ordinen passou a ser ordinário, afirmando-se assim o caráter público do poder punitivo, razão pela qual os delicta privada foram submetidos a penas públicas, inclusive os delitos mais leves, que durante a república, estavam sujeitos à negociação das partes (ZAFFARONI et al., 2003, p. 387).

Já no fim da idade antiga, no século IV, o Império Romano dividiu-se em dois territórios, quais sejam o Império do Ocidente (Roma) e o Império do Oriente (Império Bizantino). Neste mesmo período surgiu a religião católica, pregada por Cristo, aqui já começa a se desenvolver o direito canônico (GILISSEN, 2001, p. 127), como se verá adiante.

No tocante à pena de prisão, a exemplo de outros povos, ela não era muito utilizada. Logo, Roma não trouxe nenhuma inovação no campo da pena restritiva de libertada, entretanto o Direito Romano é uma das principais fontes do nosso direito penal atual, bem como representa um elo entre a Idade Antiga e a Moderna. Desse modo, não deve deixar de citado.

3.2. IDADE MÉDIA

A gênese da idade Média se deu no século V, com a queda do Império Romano do Ocidente que foi dominado pelos povos germânicos. Seu término ocorreu no século XV, com o fim do Império Romano do Oriente e o declínio de Constantinopla. O final desse período histórico também tem como marco o surgimento da peste negra, doença que dizimou a população européia (CALDEIRA, 2009, p. 263).

3.2.1. Direito Germânico

Iniciaremos a análise desse período histórico a partir do declínio do Império Romano, momento em que Roma começou a ser invadida pelos povos bárbaros. O Direito Germânico se estendeu do século V ao século XI d. C. (ZAFFARONI, et al., 2003, p. 167) .

Ressalta-se que os povos germânicos sofreram quase as mesmas modificações que os povos da antiguidade, passando pelas fases acima elencadas. Desse modo, serão abordados aspectos mais peculiares e que contribuam com o desenvolvimento do trabalho, fazendo ressalvas quando conveniente.

A queda do Império Romano do Ocidente se deu em 476 d. C., quando então foi invadido e conquistado. Dessa forma, iniciou-se um processo de descentralização política, o que, entre outros fatores, gerou o abandono das cidades, tornando a economia de subsistência agrária, baseada no trabalho serviu que colaborou para constituição do feudalismo (NETO, 2010, p. 155):

O Estado tornou-se insolvente e falsário. A moeda tinha apenas 3% de prata, o restante era constituído de cobre e bronze, razão pela qual foi sendo paulatinamente abandonada pela população, o exército não cultivava mais a disciplina dos velhos tempos, era composto essencialmente de 9/10 de mercenários estrangeiros, sendo freqüentemente dizimado para conter o povo, que explodia em rebeliões internas conduzidas pelos pobres de Roma (guerra civil interna). [...] Os federati e os coloni, bárbaros, passaram a ocupar as fronteiras do império, e os habitantes das urbs (cidades) foram paulatinamente migrando para o campo em busca de segurança privada dos grandes proprietários, que tinham exércitos particulares para se defender.

A economia escravista sucumbiu ao trabalho servil e a Europa Ocidental se fragmenta em unidades de produção descentralizadas que constituíram o feudalismo no velho continente [...] (NETO, 2010, p. 155).

O sistema feudal era baseado na servidão, o proprietário da terra dava proteção e trabalho aos camponeses que, em troca, entregavam parte de sua produção. A economia feudal baseava-se principalmente na agricultura, sendo que as técnicas de trabalho agrícola eram rudimentares (CHIAVERINI, 2009, p. 16).

O feudo constituía uma estrutura econômica autônoma. A distância entre as glebas e a insegurança causada pelas invasões bárbaras enfraqueceram o comércio, que passou a ser caracterizado pelas trocas (GILISSEN, 2001, p. 189).

Dessa forma, com a fragmentação do poder, as punições não eram mais aplicadas por um único suserano, uma vez que não existia um poder matriz, assim cada feudo tinha as suas próprias normas. Nesse sentido, Chiaverini (2009) ensina que:

Com a descentralização do poder político, o sistema de punição estatal se tornou impraticável, passando a existir a lei do feudo e a pena pecuniária. A ausência de um poder central forte permitia que qualquer conflito de interesse ameaçasse a paz social, a medida em que qualquer parentes e súditos eram automaticamente envolvidos nesses conflitos (CHIAVERINI, 2009, p. 19).

Consequentemente, a falta de organização atingiu os sistemas legais gerando ambiguidade nas resoluções dos conflitos, uma vez que o indivíduo só respondia pelas acusações que infligissem o feudo do qual fazia parte (santos, 2010, p. 241-242).

Nessa fase o direito penal germânico, sofreu a influência das ordálias ou juízos de Deus, que consistia em rituais sangrentas, como, por exemplo, duelos, prova do fogo etc., essa era a forma de resolver os conflitos e chegar ao veredicto final. Também utilizavam como punição a perda da paz, que consistia na expulsão do ofensor da comunidade, bem como existiam penas coletivas ou públicas para os traidores. Subsistindo a vingança de sangue quando o conflito não se solucionava através dos outros meios (ZAFFARONI et al., 2003, p. 388).

Existiam ainda as imposições de fiança e a composição pecuniária, no entanto, essa penalidade só era eficaz para os que possuíam classe social mais elevada, visto que os de classe desfavorecida, sem condições financeiras, eram submetidos a castigos corporais (ZAFFARONI et al., 2003, p. 167-168).

Podemos observar que o direito penal germânico resgatou a vítima como parte do conflito (ZAFFARONI et al., 2003, p. 388), os bárbaros eram essencialmente privatistas, qualquer conflito de interesse ameaçava a paz social, essa fragilidade trouxe a necessidade de manter a concórdia como premissa maior. Logo, qualquer conduta em desconformidade com as normas estabelecidas era vista como um ato que desestabilizava a ordem social, e quem provocasse a desordem era punido de forma rígida (ZAFFARONI; PIERANGELI, 2008, p. 167).

Em relação à prisão, não verificamos mudanças significantes, dado que ainda era utilizada para assegurar a aplicação da pena cominada. Importante ressaltar que o Rei dos Longobardos determinava que cada cidade dispusesse de um local para aprisionar os “ladrões” pelo lapso temporal de um ou dois anos (BITENCOURT, 2011, 24).

Outro fator relevante é que não existia uma estrutura penitenciária, sendo assim os que aguardavam o julgamento eram presos em lugares impróprios, como, calabouços, castelos em ruínas, torres etc. (BITENCOURT, 2011, p. 26). São elucidativos os ensinamentos de Bitencourt sobre a questão, vejamos:

Há, nesse período, um claro predomínio do direito germânico. A privação da liberdade continua a ter uma finalidade custodial, aplicável aqueles que “seriam submetidos aos mais terríveis tormentos exigidos por um povo ávido de distrações bárbaras e sangrentas. A amputação de braços, pernas, olhos, língua, mutilações diversas, queima de carne a fogo, e a morte, em suas mais variadas formas, constituem o espetáculo favorito das multidões desse período histórico.

As sanções criminais na Idade Média estavam submetidas ao arbítrio dos governantes, que as impunham em função do status social a que pertencia o réu. Referidas sanções podiam ser substituídas por prestações em metal ou espécie, restando a pena de prisão, excepcionalmente, para aqueles casos em que os crimes não tinha suficiente gravidade para sofrer a condenação à morte ou as penas de mutilação (BITENCOURT, 2011, p. 26).

Gradativamente a característica privatista dos bárbaros foi se perdendo e o direito foi retomando o seu caráter público ao mesmo tempo em que a igreja Católica crescia em influência e sua doutrina passava a dominar os germânicos que foram se convertendo ao cristianismo, dando indícios do Direito Canônico (PRADO, 2010, p. 81).

3.2.2. Direito Canônico

Esse período da história foi marcado pela influência do Direito Canônico na legislação penal. A Igreja Católica começou o seu domínio em 313 d. C., com o Édito de Milão, proclamado pelo Imperador Constantino, quando determinou que o cristianismo deixasse de ser perseguido. Em 391 d. C., com o Édito de Tessalónica, o cristianismo tornou-se a religião oficial do Império Romano (CALDEIRA, 2009, p. 263).

Outra causa que colaborou para o fortalecimento da Igreja foi o fato de ser uma das únicas instituições organizadas e dotadas de centralização existente na época (NETO, 2010, p. 155). Ademais, o clero era proprietário de imensas áreas de terra o que a tornava ainda mais poderosa, dado que na Europa prevalecia o feudalismo (Tigar apud SANTOS, 2010, p. 240).

Por conseguinte as punições, paulatinamente, foram se modificando, acarretando, assim, mudanças nas penas e na forma de executá-las, muitas vezes, embora nem sempre, para pior.

Conforme o domínio da Igreja Católica aumentava, os litígios começaram a ser julgados de acordo com os seus interesses, pois a justiça comum e a canônica se uniram para manter a ordem e a moralidade. As decisões eram prolatadas pelos tribunais eclesiásticos, conforme os cânones (Santos, 2010, p. 241-242).

Apesar de a Igreja ter desempenhado um papel central no direito da época, existiam paralelamente cortes laicas que era representativa do poder do soberano (GILISSEN, 2001, p. 136).

O Direito Canônico teve uma importância crucial na idealização da pena privativa de liberdade, em razão da suposta visão de humanização da punição, o que contribui para que as condenações dos bárbaros perdessem aplicabilidade. Desse modo, a Igreja buscou substituir a pena de morte pela reclusão do infrator, além de considerar a punição pública como a única correta (PRADO, 2010, p. 83).

Começando a ser aplicada aos religiosos que cometiam algum pecado a privação da liberdade era uma oportunidade dada pela Igreja para que o pecador, no silêncio da reclusão, meditasse sobre sua culpa e se arrependesse dos seus pecados (CALDEIRA, 2009, p. 264). Foi nesse contexto que nasceram as prisões eclesiásticas. Vejamos:

A prisão eclesiástica, por sua vez, destinava-se aos clérigos rebeldes e respondia às ideias de caridade, redenção e fraternidade da Igreja, dando ao internato o sentido de penitência e meditação. Recolhiam-se os infratores em uma ala dos mosteiros, para que por meio da penitência e da oração, se arrependessem do mal causado e obtivessem a correção ou emenda (BITENCOURT, 2011, p. 25).

As principais penas adotadas pelo Direito Canônico direcionadas aos religiosos eram as detrusio in monasterium. Como mencionado acima, os sacerdotes que infligissem uma norma eclesiástica eram confinados em mosteiros. As prisões geralmente ficavam no subterrâneo, não dispondo de portas nem de janelas (BITENCOURT, 2011, p. 26). Nos dizeres de Hentig, citado por Bitencourt (2011):

A cela monacal cumpria a totalidade de propósitos que a clausura perseguia, embora não se deva esquecer, que na prisão monacal, misturavam-se antigos métodos mágicos com a separação do espaço e a purificação mediante as regras ordinárias da detenção. Encontram-se entre eles a fustigação corporal, a escuridão e o jejum, juntamente com o isolamento, que protege do contágio moral (Hentig apud BITENCOURT, 2011, p. 28).

Em 1215, um movimento oriundo da Igreja, começou a punir atos que atentassem contra sua doutrina. Dessa forma, com o intuito de conter os que praticavam heresias a tortura foi autorizada pelo Papa Inocêncio IV, sendo criados os tribunais do Santo Ofício, dando início a Inquisição (PRADO, 2010, p. 84). Chiaverini (2009) afirma que:

A Santa Inquisição foi criada na Idade Média, durante o século XIII, sob os ditames da Igreja Católica Romana. Ela era composta por Tribunais que julgavam todos aqueles considerados uma ameaça ao Direito Canônico, aos dogmas e valores defendidos pela Igreja. Bastava mera denúncia anônima para que a pessoa se tornasse suspeita, fosse perseguida e condenada. As pessoas estavam sujeitas desde a prisão temporária ou perpétua até a pena de morte na fogueira, onde os condenados eram queimados vivos em plena praça pública (CHIAVERINI, 2011, p. 31).

Nesse ínterim, desde que executadas pelo Estado, as penas de morte e de castigos corporais, anteriormente consideradas como contrárias a doutrina cristã, podiam ser aplicadas. Em razão da conveniência e praticidade de usá-las como instrumento de dominação. De acordo com Prado (2010):

Tem-se que os tribunais eclesiásticos não aplicavam a pena de morte (Ecclesia abhorret a sanguine), sendo que os que deveriam sofrê-la eram entregues às cortes laicas. Mas isso não quer dizer que a pena de morte instituída pelas leis seculares (v.g., delitos de heresia, usura) fosse oposta à vontade da Igreja. Ao contrário essas leis foram expressamente autorizadas e mandadas observar (v.g., Inocêncio IV-1254) (PRADO, 2010, p. 84).

A Igreja denunciava a existência do crime e mantinha esforços para converter o culpado e quando obtinha seu arrependimento o entregava as cortes laicas para que fosse executado (TALARICO; LINKE, 2010, p. 53). Nesse sentido, Naspolini (2010) atesta que:

Após a confissão, vinha a condenação e, em seguida, a execução da pena. Mas, antes disso, o condenado era obrigado a confessar sua culpa em uma igreja, pedindo perdão a Deus e aos Santos por ter-se entregado ao diabo. Nesse evento denominado auto-de-fé, a multidão comparecia para ouvir o relato de suas maldades e seu arrependimento. Em seguida era conduzido ao cadafalso, normalmente situado em praça pública, onde seria queimado pelo carrasco. Algumas vezes, e dependendo da gravidade do crime, o juiz concedia o estrangulamento antes que fosse acesa a fogueira; em outras, o condenado era queimado vivo. Durante a execução, a sentença era lida em público para que todos tomassem ciência dos malefícios por ele praticados (NASPOLINI, 2010, 266).

A privação da liberdade não foi adotada somente a clérigos, mas também aos cidadãos em geral. Desse modo, aos hereges era aplicada a pena denominada murus largus, que consistia no aprisionamento com a finalidade de penitência (BITENCOURT, 2011, p. 26). Os hereges ficavam reclusos em prisões do Estado. Consoante a doutrina de Valdés apontada por Bitencourt (2011):

Na prisão de Estado, na Idade Média, somente podiam ser recolhidos os inimigos do poder, real ou senhorial, que tivessem cometido delitos de traição, e os adversários políticos dos governantes. A prisão apresentava duas modalidades: a prisão-custódia, onde o réu esperava a execução da verdadeira pena aplicada (morte, açoite, mutilações etc.), ou como detenção temporal perpétua, ou ainda até receber o perdão real (Valdés apud BITENCOURT, 2011, p. 26).

Conforme Batista (2010), a pena no Direito Canônico tinha como objetivo a reforma do delinquente. Quem cometia um crime pecava, sendo assim, o pegador era induzido a arrepender-se através da penitência:

A sanção penal – inexoravelmente um fazer sofrer, pois precisamente caracterizada pela inflição de sofrimento ao condenado através da perda ou restrição de direitos [...]. Contudo, nenhum outro corpus jurídico estaria mais aberto à incorporação de tal concepção do que o direito canônico, responsável pelo surgimento histórico de um novo sujeito culpável, acima do qual o magistrado canônico se colocava como pai e senhor. Assim, ao lado de uma poena vindicativa, que reagia, independentemente de qualquer propósito ou de qualquer outro sentido, à infração da lei ou à perversão da fé, emparelhava-se uma poena medicinalis, atenta ao “melhoramento interior”, e que teria sua duração prolongada, subsistindo até a emenda do culpado. A inquisição levaria ao paroxismo esses ingredientes e constituiu um formidável programa salvacionista através da pena, a serviço da “cura” de hereges e mais tarde de bruxas (BATISTA, 2010, p. 22).

Guzman (apud BITENCOURT, 2011, p. 28) faz uma observação interessante acerca do surgimento da palavra penitenciária. Segundo o autor foi com base na palavra penitência que surgiu o termo penitenciária para denominar o lugar onde se cumpre a pena privativa de liberdade, prova da herança deixada pelo Direito Canônico.

Nesse diapasão, mais uma vez a vingança divina é legitimada por uma instituição matriz, que utiliza sua doutrina para ocultar seus verdadeiros objetivos, o da dominação, o do controle social e da obediência sem questionamentos, obtidos através da vulnerabilidade do povo (BITENCOURT, 2011, p. 27).

O Direito Canônico, pois, foi o alicerce da pena de prisão, contribuiu para o seu surgimento nos moldes em que é entendida atualmente, visto que trouxe a ideia de “recuperação” do ser humano por meio da privação da liberdade, quando, então afastado de toda tentação, podia refletir e assim arrepender-se do mal que causou, podendo, dessa forma, alcançar a salvação (BITENCOURT, 2011, p. 27).

3.2.3. Direito Penal Comum

Essa fase da história foi caracterizada pela miscelânea entre o Direito Romano, o Direito Germânico, o Direito Canônico e dos direitos locais. A partir do século XII ocorreu o ressurgimento do Direito Romano, fenômeno denominado pelos historiadores de recepção, além de grandes transformações sociais (RADO, 2010, 84).

Nessa época teve relevância o trabalho dos juristas que interpretavam o Direito Romano, conforme dispõe Anitua (2008):

[...] uma das principais peculiaridades do desenvolvimento do Ocidente foi que somente nos finais da Idade Média européia verificou-se o surgimento de uma administração da justiça autêntica e burocrática. A já mencionada recepção do direito do Direito Romano e a eliminação contemporânea de influências pessoais locais e comunitárias foram possíveis graças à aparição de um novo direito. Este já não estaria à disposição das partes que utilizavam, mas sim corresponderia a uma técnica conhecida e dominada pelo grupo de juristas ou “profissionais” (ANITUA, 2008, p.72-73).

Os novos padrões exigiram a mudança do estilo de vida feudal, o que fomentou a formação do capitalismo. Segundo Marx (apud MELOSSI; PAVARINI, 2006, p. 33), tal situação pode ser denominada de pré-história do capital, o que, com base na mesma doutrina, provocou o processo de separação do trabalhador da propriedade das próprias condições de trabalho.

As atividades comerciais aceleravam-se, trazendo a necessidade de uma maior exploração econômica, o que não era proporcionado pelo sistema feudal, de acordo com Anitua (2008):

De um ponto de vista econômico, isso se verifica em primeiro lugar com o surgimento de novas e crescentes necessidades de renda entre os grupos dominantes, que não podiam ser materializadas devido à ineficácia do sistema feudal. Assim se explica a crise do sistema de exploração feudal. Dentro deste mesmo modelo, as contínuas empresas guerreiras, que garantiam o poderio, bem como o culto à0020demonstração desse poderio em roupas, móveis e comodidades requeriam maiores despejas. A aparição do luxo como demonstração do poder é visível no magnífico exemplo dos palácios da rua Montcada da cidade de Barcelona. O gasto santuário torna-se uma necessidade política e econômica cada vez mais evidente. Por isso, e também devido as possibilidades do comércio, surgiram novas necessidades econômicas que não podiam ser atendidas pelo antigo método de exploração econômica. Naquele, método, a produtividade era escassa e não se podia modificá-la sem empurrar os servos para abaixo do nível de subsistência (ANITUA, 2008, p. 63-64).

Devido à diminuição dos riscos do transporte e a possibilidade de comunicação entre os feudos, ocasionado pela estabilidade que trouxe o fim das invasões bárbaras, os mercadores intensificaram suas atividades, houve uma melhora das condições de vida da população, como resultado o índice de mortalidade foi reduzido (CHIAVERINI, 2009, p. 31).

Entretanto, o crescimento exacerbado das massas desfavorecidas gerou um excedente de mão-de-obra nos feudos, o que acarretou maior exploração dos senhores feudais para com essa parcela da população. Nunca se usufruiu tanto das terras, motivo pelo qual os campos excessivamente cultivados tornaram-se improdutivos e a queda na produção trouxe o empobrecimento da população européia, que migrou para as cidades (ANITUA, 2008, p. 65).

Nessa conjuntura renasceram as cidades e nelas o comércio ganhou impulso, conforme explica Anitua (2008):

Assim, assistiu-se nesse período a uma renovação de velhas cidades abandonadas e a criação de outras que só respondiam á jurisdição real e estavam livres, portanto, da vassalagem feudal (isso pode ser verificado nos nomes de povoação como Villareal, Ciudad Real etc., na Espanha). Não é exagerado afirmar que o capitalismo começou a ser prticado embrionariamente nas principais cidades comerciais do Mediterrâneo cristão, como Palermo, Veneza, Gênova, Pisa, Barcelona, Valência, que eram as mais populosas da época. Também Londres, Paris e as cidades alemãs e nórdicas da Liga Hanseática e dos Países Baixos seriam promotoras destas mudanças (ANITUA, 2008, p. 65).

Nesse cenário, surgia uma nova classe, a burguesia, sucessora dos primitivos mercadores, artesãos e negociantes (MARTINS, 2010, p. 215).

A reaparição das cidades, além de corroborar com o início do capitalismo, suscitou o ressurgimento de estruturas de poder centralizado. Nesse aspecto, é valido ressaltar os dizeres de Gilissen (2001):

Se as instituições feudo-vassálicas subsistiram - mesmo parcialmente até ao fim do Antigo Regime -, passaram então ao segundo plano, sobretudo em França (e, portanto na Flandres), na Lotaríngia e na Inglaterra. O poder do Rei é reforçado e alargado, tanto em França como na Inglaterra; o poder de alguns grandes príncipes territoriais é igualmente consolidado e conduz a uma quase-soberania (GILISSEN, 2001, p. 239).

Por conseguinte, a formação de massas camponesas desempregadas foi inevitável, já que sem alternativa, mendigavam e até mesmo praticavam “crimes” para sustentar-se, viam-se obrigados a submeter-se a essa situação, pois era a única forma de terem o que comer. Melossi e Pavarini (2006) descrevem que:

Os campos, mas, sobretudo as cidades, que já representavam com o desenvolvimento da atividade econômica e, em particular, do comércio, um pólo de atração notável, começaram a prover-se com milhares de trabalhadores expropriados, convertidos em mendigos, vagabundos, às vezes bandidos, porém, em geral, uma multidão de desempregados (Melossi; Pavarini, 2006, p. 34).

O resultado da transição do feudalismo para o capitalismo e o advento das cidades, não alterou somente o campo econômico, refletiu também na questão penal:

Essas novas cidades teriam suas próprias leis, apropriadas ao avanço econômico da burguesia. Essas leis também seriam apropriadas devidos às novas necessidades de controle urbano em um meio caracterizado pela extrema aglomeração e pela especulação imobiliária. Esse controle, no que se refere à questão criminal, começaria a ser segregativo e excludente [continua o autor], mas também mais disciplinar e inclusivo (ANITUA, 2008, p. 65-66).

Com efeito, a influência do poder econômico gerou a opressão dos pobres pelos ricos, fato notado em todas as esferas das histórias. Todavia, o diferencial recai na coragem de demonstrar a indignação.

Em resposta as rebeliões, foram criadas leis penais mais severas, que tinham como alvo os causadores dos conflitos, isto é, a classe desfavorecida. A pena era utilizada como meio de manter o controle social, visando espalhar o medo (BITENCOURT, 2011, p. 30).

Em decorrência ao processo de êxodo rural, exposto acima, a manufatura nascente não conseguia absorver a mão-de-obra progressiva, por sua vez os novos proletariados tornaram-se “mendigos”, “ladrões” e “vagabundos” (Melossi; Pavarini, 2006, p. 34).

Os séculos finais da Idade Média foram marcados por uma série de crises. A falta de alimento provocou à morte de parte considerável da população, assim como a peste negra epidemia que vitimou um terço da população européia. As guerras e os conflitos entre a burguesia e os camponeses contra a nobreza feudal se intensificaram (ANITUA, 2008, p. 83).

3.3. IDADE MODERNA

A Idade Moderna caracteriza-se na história como um período de transição, que compreende o século XV ao XVIII e que acarretou modificações nas relações sociais, bem como no Direito Penal. Os historiadores consideram que seu início se deu com a ocupação de Constantinopla pelos Turcos Otomanos e seu encerramento foi ocasionado pela Revolução Francesa, em 1789 (CALDEIRA, 2009, p. 265).

Importante esclarecer que há divergências na delimitação cronológica desse período no que toca a origem do capitalismo. Seguimos essa “divisão” histórica baseado na doutrina. Outrossim, destaca-se que, apesar do trabalho apresentar-se fragmentado em fases que demonstram a ordem histórica da pena de prisão, um período não elimina o outro, já que são inseparáveis, havendo, por exemplo, fases arcaicas que existem até hoje.

Ocorreram modificações de várias montas nesse período, contudo vamos nos ater ao tema central deste trabalho, destacando o mais relevante para a origem da pena de prisão.

3.3.1. Renascimento e Absolutismo

Findo o período histórico que compreende a Idade Média a perspectiva de mundo, paulatinamente, começou a mudar, uma vez que a visão religiosa da nobreza e do clero foi superada pelo ponto de vista antropocêntrico da burguesia (CHIAVERINI, 2009, p. 42). “Esse movimento tinha por raiz a palavra ‘humano’, o que significava que o homem era colocado no centro do universo, na condição de atenção ontológica de todas as preocupações políticas, econômica e sociais” (ANITUA, 2008, p. 70).

O Renascimento trouxe o retorno da ciência, das artes e da filosofia, que estavam adormecidas, em virtude da influência que a Igreja Católica Apostólica Romana exercia sobre os governos, não admitindo outra verdade senão a sua ideologia cristã. Verificou-se ainda uma ruptura do sistema feudal e a recepção do Direito Romano, levando a uma transformação na economia, que de fechada e estagnada, passou a ser dinâmica (ANITUA, 2008, p. 72-73), como demonstrado acima.

Juntamente com essas mudanças vieram novos valores, a razão passou a ser considerada, assim como o individualismo passou a ter importância (ANITUA, 2008, p. 69).

Vários autores se descararam nesse período, os mais importantes dentre os que tinham como foco as questões penais e a filosofia do direito foram: More, Campanella, Maquiavel e Hobbes (CHIAVERINI, 2009, p. 45).

Durante o período do Renascimento o absolutismo ganhava forma concomitantemente com o fortalecimento dos Estados nacionais, governados por soberanos que legalmente tinham poderes ilimitados, como dispõe Anitua (2008):

O econômico e o político iam de mãos dadas para poder impor o “mercado” e surgia a necessidade de criar o “Estado”. [prossegue o autor] E outra vez, dentro do político, o penal tem uma capacidade explicativa maior. Nesses períodos de consolidação do Estado, só os reis ou imperadores podiam erguer forcas [...] (ANITUA, 2008, p. 67).

Os Estados absolutistas foram marcados pela extrema crueldade na aplicação da penas. As punições eram castigos corporais. É dizer, eram feitas nos corpos dos condenados através de um verdadeiro espetáculo e essas punições eram chamadas de suplícios, penalidade, cujo objetivo era fazer sofrer o condenado, mutilar seu corpo e expô-lo ao público. Com propriedade discorre Foucault (1987):

As penas físicas tinham, portanto, uma parte considerável. Os costumes, a natureza dos crimes, o status dos condenados as faziam variar ainda mais.

A pena de morte natural compreende todos os tipos de morte: uns podem ser condenados à forca, outros a ter a mão ou a língua cortada ou furada e ser enforcados em seguida; outros por crimes mais graves, a ser arrebentados vivos e expirar na roda depois de ter os membros arrebentados; outros a ser estrangulados e em seguida arrebentados, outros a ser queimados vivos, outros a ser queimado depois de estrangulados; outros a ter a língua cortada ou furada, e em seguida queimados vivos; outros a ser puxados por quatro cavalos, outros a ter a cabeça cortada, outros enfim a ter a cabeça quebrada [continua o autor] satisfação à pessoa ofendida, admoestação, repreensão, prisão temporária, abstenção de um lugar, e enfim as penas pecuniárias – muitas ou confiscação (Foucault, 1987, p. 30).

Não obstante, subsistiam penas de banimento ou multa para as condutas consideradas mais leves, porém na maioria das vezes eram acompanhadas de castigos corporais, como um meio de explicitar o poder do soberano perante o povo:

[...] a maior parte das condenações era banimento ou multa [...]. Ora, grande parte dessas penas não corporais era acompanhada a título acessório de penas que comportavam uma dimensão de suplício: exposição, roda, coleira de ferro, açoite, marcação com ferrete; era regra para todas as condenações às galeras ou ao equivalente para as mulheres – a reclusão no hospital; o banimento era muitas vezes precedido pela exposição e pela marcação com ferrete; a multa, às vezes, era acompanhada de açoite. Não só nas grandes e solenes execuções, mas também nessa forma anexa é que o suplício manifestava a parte significativa que tinha na penalidade; qualquer pena um pouco séria devia influir alguma coisa do suplício (Foucault, 1987, p. 30-31).

Os nobres desfrutavam de diversos benefícios, desde penas menos cruéis até a isenção dos impostos. Enquanto os pobres sofriam com as penas rígidas e com os impostos regionais, uma vez que tinham de suportar o ônus no lugar dos abastados (CHIAVERINI, 2009, p. 65).

Dessa forma, o Direito Penal passa a ser uma necessidade do Estado, “um instrumento de preservação e de reprodução da ordem política e social, o sistema penal absolutista reprimia as forças sociais garantindo a expansão da política mercantilista” (CHIAVERINI, 2009, p. 70).

Os excessos do absolutismo geraram uma insatisfação das massas desfavorecidas na Europa, que ensejaram revoltas contra o governo:

[...] as circunstâncias do absolutismo levaram uma enorme quantidade de pessoas á miséria absoluta: revolução dos preços, cercamento dos campos, ausência de trabalho, excesso de oferta de mão de obra, baixo preços dos salários, aumento de impostos para custear a guerras etc. A Idade dos Mendigos exigiu uma centralização do poder punitivo e medidas radicais de contenção da animosidade crescente. Em função disso, a sanção penal se tornou pública e a pena de morte foi aplicada de forma cruel e com frequência, eliminando as pessoas que perderam seu tempo e espaço e não conseguiram se incorporar ao novo modelo social com rapidez imprescindível à sobrevivência (CHIAVERINI, 2009, p. 77).

Diante do exposto, esse período foi caracterizado por penas desumanas, como forma de confirmar o poder do monarca. O corpo do condenado passou a ser o foco da punição, a pena de morte era um espetáculo para a platéia. E mais uma vez as punições eram direcionadas as classes menos favorecidas.

3.3.2. A Origem da Prisão

O sistema penal baseado no sofrimento do condenado e a pena de morte começaram a enfraquecer junto com o absolutismo, apesar de ainda persistir. Os meios utilizados para conter as massas falharam, embora cruéis e rígidos, não tinham eficácia contra a crescente criminalidade. Sendo assim, a pena de morte não era mais conveniente, visto que com crescimento exacerbado da “delinquência”, dizimaria a população (Melossi; Pavarini, 2006, p. 36).

Crescia a preocupação em relação à falta de mão-de-obra que ficava cada vez mais escassa juntamente com o interesse econômico em explorar o condenado. Fatos que levaram à ideia de dominar os ociosos que podiam contribuir com seu trabalho e usá-los, mesmo que de forma involuntária, a favor do capitalismo. A solução era incorporar uma disciplina, uma nova ideologia e nesse caso foi introduzida a “ética ao trabalho” (Melossi; Pavarini, 2006, p. 36). Rusche e Kirchheimer elucidam a esse respeito que:

Nesse contexto surge a ideologia segundo a qual o homem teria inclinação natural para o ócio e o prazer e que se não houvesse necessidade ele não trabalharia; assim a riqueza de um país dependia da existência de uma grande quantidade de habitantes empobrecidos, forçados a trabalhar para sobreviver (RUSCHE; KIRCHHEIMER apud CHIAVERINI, 2009, 83).

Nesse ínterim, surgiu o mercantilismo, criando uma nova concepção de trabalho, gerando um movimento de modificação das penas privativas de liberdade. Começou-se a pensar na prisão como uma penalidade em potencial (BITENCOURT, 2011, p. 30). Assim, “todo sistema de produção tende a descobrir punições que correspondem às suas relações produtivas” (RUSCHE; KIRCHHEIMER apud SANTOS, 2009, 437).

O mercantilismo necessitou de um disciplinamento selvagem dos grupos sociais que não se integravam a nenhum dos grupos economicamente produtivo. A forma de “educar” os não proprietários para que aceitassem como natural esse estado de coisas foi através da violência punitiva. A nova ordem estatal capitalista libertava o servo feudal de suas cadeias, mas também o despojava dos meios de produção – a terra, as fontes comunitárias de subsistência, as ferramentas. As regras de jogo do mercado capitalista tentariam impor um difícil equilíbrio entre a reclamada igualdade no processo de circulação de bens e uma marcada desigualdade no processo produtivo (ANITUA, 2009, p. 114).

Nesses contornos, “o trabalhador integrado no mercado de trabalho é controlado pela disciplina do capital, enquanto o trabalhador fora do mercado de trabalho é controlado pela disciplina da prisão” (SANTOS, 2010, p. 438).

Para solucionar problema da falta de mão-de-obra foram criadas as houses of correction, denominadas de bridewells, que se espalharam pela Europa em um curto prazo de tempo, “esse tipo de instituição foi o primeiro exemplo, e muito significativo, de detenção laica sem a finalidade de custódia que pode ser observado na história” (Melossi; Pavarini, 2006, p. 39).

[...] O objetivo da instituição, que era dirigida com mãos de ferro, era reformar os internos através do trabalho obrigatório e da disciplina. Além disso, ela deveria desencorajar outras pessoas a seguirem o caminho da vagabundagem e do ócio, e assegurar o próprio auto-sustento através do trabalho, a sua principal meta. O trabalho que ali se fazia era, em grande parte, no ramo têxtil, como o exigia a época (Melossi; Pavarini, 2006, p. 50).

Assim, surgiu primeiramente na Europa e depois foi se dissipando pelo mundo como, por exemplo, na Holanda, na Inglaterra, nos Estados Unidos e na França, as casas de trabalho. Para lá eram mandados os “pobres”, “mendigos”, os considerados “vagabundos” e os apontados como “criminosos”, isto é, para lá eram enviados os que tinham tempo disponível por não conseguirem trabalho (THOMAS apud Melossi; Pavarini, 2006, p. 36). Nas entrelinhas, os que incomodavam o sistema capitalista.

Segundo Anitua (2008), as bridewells foram a resposta do que fazer com os “vagabundos” que ficavam circulando pelas cidades colocando em risco a ordem, vejamos:

Foi assim que o modelo de presídio converteu-se no lugar de expulsão dentro do próprio meio, ou “expulsão para dentro”. Porém, de uma forma geral, estes expulsos eram enviados aos cárceres para morrer, para não fazer nada. Essa situação permaneceu inalterada até que necessidades estruturais levaram a que se buscasse aproveitar esta mão-de-obra e criar, também no interior dos lugares de detenção, mecanismos de disciplina (ANITUA, 2008, p. 116).

Outrossim, era imposto o trabalho forçado e o trabalhador tinha que aceitar as condições que lhe eram determinadas, visto que a recusa era crime:

A recusa ao trabalho parece ter sido o único ato ao qual se atribuía uma verdadeira intenção criminosa [prossegue o autor], era facultado ao juiz enviar para prisão comum (common gaol) os ociosos capazes de trabalhar.

Convém, porém, esclarecer o real significado do “recusa do trabalho” no século XVI. Uma série de estatutos promulgados entre os séculos XIV e século XVI estabelecia uma taxa máxima de salário acima da qual não era lícito ir (o que implicava sanção penal); não era possível nenhuma contratação de trabalho, muito menos coletiva; e até se chegou a determinar que o trabalhador aceitasse a primeira oferta de trabalho que lhe fizessem. Ou seja, o trabalhador era obrigado a aceitar qualquer trabalho, nas condições estabelecidas por quem lhe fazia oferta. O trabalho forçado nas houses of correction ou workhouses era direcionado, portanto, para dobrar a resistência da força de trabalho e fazê-la aceitar as condições que permitissem o Maximo grau de extração de mais-valia (Melossi; Pavarini, 2006, p. 37-38).

Podemos perceber que o suposto cerne da pena não era mais o castigo, de agora em diante propagandeava-se a suposta regeneração do indivíduo através do trabalho, para que “recuperado” pudesse ser reinserido na sociedade (CHIAVERINI, 2009, p. 80).

A exemplo das bridewells, foram criadas em Amsterdã as Rasp-huis, com a mesma finalidade, qual seja explorar a força de trabalho, como ensina Anitua (2008):

Em 1596, a Câmara de Amsterdam criou um grande centro de trabalho forçado para reclusos no que era antes um convento, o Rasphuis, e em 1597 outro estabelecimento similar, o Spinhuis. As novas casas recebiam o nome de Rasph-huis – ou “casa de raspagem”-, uma vez que a atividade que desenvolviam era a de raspar a madeira importada do Brasil, que se utilizava para fazer um pó transformado em pigmentos usados para tingir o tecido produzido em outras indústrias nascentes (ANITUA, 2008, p. 117).

Os jovens também eram alvos das referidas casas, buscava-se, dessa forma, controlá-los desde logo. A “disciplina de berço” foi considerada o objetivo central das casas de trabalho e de correção, dando ensejo à criação de novos estabelecimentos direcionados somente para esse “público”, muitas vezes os jovens eram enviados para lá por vontade paterna (Melossi; Pavarini, 2006, p. 53).

Na Holanda a ideia da casa de trabalho também se desenvolveu, derivada da necessidade de mão-de-obra. Nos preceitos de Melossi e Pavarini:

É na Holanda da primeira metade do século XVII que a nova instituição da casa de trabalho atinge, no período das origens do capitalismo, a sua forma mais desenvolvida. A criação desta nova e original modalidade de segregação punitiva responde mais a uma exigência conexa ao desenvolvimento geral da sociedade capitalista do que à genialidade individual de algum reformador [...]. A criação holandesa do Tuchthuis corresponde ao mais alto grau de desenvolvimento atingido pelo capitalismo nesse período.

A função da casa de trabalho é, sem dúvida, mais complexa do que simplesmente tabelar o trabalho livre. Ou, ao menos, pode-se dizer também que este último objetivo deve ser entendido na plenitude do seu significado, que é o do controle de força de trabalho, da educação e domesticação desta (Melossi; Pavarini, 2006, p. 39-41).

Essas instituições objetivavam disciplinar os que podiam “sair do controle”, para tornar mais fácil a administração do trabalhador, atendendo as exigências do capitalismo, consoante a doutrina de Foucault (1987):

A disciplina fabrica assim corpos submissos e exercitados, corpos “dóceis”. A disciplina aumenta as forças do corpo (em termos econômicos de utilidade) e diminui essas mesmas forças (em termos políticos de obediência). Em uma palavra: ela dissocia o poder do corpo; faz dele por um lado uma “aptidão”, uma “capacidade” que ele procura aumentar; e inverte por outro lado a energia, a potência que poderia resultar disso, e faz dela uma relação de sujeição estrita. Se a exploração econômica separa a força e o produto do trabalho, digamos que a coerção disciplinar estabelece no corpo o elo coercitivo entre uma aptidão aumentada e uma dominação acentuada (FOUCAULT, 1987, p. 119).

A França também aderiu às casas de trabalho, como bem acentua Anitua (2008):

A versão francesa destas casas de trabalho seria o renovado – com relação à sua função medieval – “Hospital Geral”, e em seguida a “maison de force”, onde seria desenvolvida a técnica do internato, e também, mas de forma mais discreta, a nova ética do trabalho. A base real para sua propagação por toda a França estava nas ideias que aproximavam os jesuítas das burguesias industriais de Paris ou Lyon. A experiência punitiva de tipo carcerário reconhece algumas origens nas práticas eclesiásticas que não podiam passar desapercebidas destes, que, além disso, observavam o êxito tanto econômico quanto na erradicação de marginais nos países protestantes mais pujantes (ANITUA, 2008, p. 119).

Nas casas de trabalho, as atividades desempenhadas eram exaustivas, quando muito cansados, os condenados, deviam se apegar a Deus, já que a formação religiosa era importante para disciplina do condenado:

O trabalho era tão duro que muitos condenados rompiam literalmente as costas - “se deslombavam”- ao efetuá-lo. O êxito desta iniciativa é claro, uma vez que praticamente todas as cidades do norte da Europa adotaram modelos semelhantes para os mendigos e delinquentes juvenis. [...] O temor a Deus era a forma de impor a disciplina. Para tal, eles tinham de aprende a ler e escrever, em horários noturnos, sendo catequizados corretamente com livros escritos especialmente para os detidos (ANITUA, 2008, p. 117-118).

Além do trabalho árduo com remuneração ínfima, outros aspectos eram desfavoráveis, quais sejam: as condições estruturais não eram apropriadas e os condenados não sabiam por quanto tempo permaneciam nas casas de trabalho, dado que o “criminoso” era mantido preso pelo lapso temporal necessário para sua disciplina, conforme preceitua Anitua (2008):

O funcionamento da casa de disciplina e trabalho baseava-se no fato de a duração das penas ficar à disposição do administrador, que a redimia em função do trabalho realizado e da conduta do detento. Na casa de trabalho, o trabalho obrigatório era desenvolvido em comum – os presos também dormiam em celas de 12 pessoas, cada cama compartilhada por duas ou três pessoas – e recebia-se um salário simbólico. Este salário, o emprego do tempo, a disciplina e a vigilância contínua preparavam esses presos para a vida de operário (ANITUA, 2008, p.118).

Destaca-se ainda as workhouses, instituições de trabalho agrícola criadas na América, como o suposto objetivo de confinar os que praticavam “crimes” de pequeno potencial. Nesse sentido, Santos (2010) sobre a finalidade desses estabelecimentos evidencia que:

[...] para resolver problemas de exclusão social do capitalismo ascendente [foram criadas] casas de trabalho forçado de camponeses expropriados dos meios de subsistência material, com a finalidade da disciplina e a adequação pessoal para o trabalho assalariado. A penitenciária moderna começa nas workhouses, instituições de trabalho forçado do período de germinação do capitalismo [...] (SANTOS, 2010, p. 460).

As casas de correção também foram fundadas em Roma, Madri, Venezuela, Milão, Florença, Berlim, Hamburgo, Munique e em Lübeck (nessas cidades alemãs as casas eram denominadas zuchtäuserem) (ANITUA, 2008, p. 119).

E assim surgiram as primeiras instituições segregadoras, dando indícios da prisão nos moldes atuais, voltadas para submeter à disciplina os “rebeldes”, que eram em particular os pobres. Era essa categoria que, juntamente com os jovens, as mulheres, os doentes e as prostitutas, deveria ser “reeducada”. É dizer, punidos por serem desprivilegiados sociais. As casas de trabalho e correção deixaram seu legado violento, cruel e estigmatizante, como pode ser contemplado nas instituições carcerárias contemporâneas.

3.4. O Iluminismo Penal

O Iluminismo foi um movimento intelectual que teve seu apogeu no final do século XVIII. A sua nomenclatura decorre dos pensadores da época, que se declaravam portadores das luzes que aclararia as trevas a que aquele período estava submerso. A filosofia das luzes defendia que a razão era a única forma de transpor a escuridão. De tal modo, o discurso iluminista estava alicerçado em três convicções que se tornaram o lema da Revolução Francesa, quais sejam: Liberdade, Igualdade e Fraternidade (CHIAVERINI, 2009, p. 92).

No plano político, a burguesia contestava o absolutismo monárquico e criticava também os privilégios que a nobreza e o clero recebiam do governo. Logo, defendiam que o monarca utilizasse o poder concentrado em suas mãos em prol do bem-estar geral (ANITUA, 2008, p. 125).

A compreensão de que o direito de governar era divino foi perdendo força. A partir de então surgiu o “contrato”, que foi fundamental para o novo fundamento do Estado, nesse sentido destacam-se Hobbes e John Locke, conforme se extrai da obra de Anitua (2008):

O contrato de Hobbes [continua o autor] tem como meta afirmar e legitimar o poder absoluto do Estado representado pelo monarca e, por isso, sua metáfora de contrato - a quem ele chamava, com Spinoza, de “razão artificial” – destaca que os indivíduos cedem, por medo, todas suas capacidades ao soberano no ato de constituição da sociedade política e, portanto, o soberano administra esse poder concentrado da maioria que lhe parece mais conveniente.

O liberalismo, que pretende ser o único herdeiro das diversas ideias de “contrato social”, aparece com maior clareza refletido na obra, do licenciado em letras, e também médico, Jonh Lucke. [...]. Lucke teve ideia de um governo baseado na exigência da liberdade dos indivíduos. Foi, assim, em obras produzidas na maturidade, como o Segundo tratado sobre o governo ou a Epístola sobre a tolerância, que ele teoriza a respeito de um Estado liberal em política e em economia. Um Estado que tem seus poderes e suas funções limitados. Um Estado que só se justifica, e ao qual só seres racionais poderiam dar origem, quando serve para assegurar os direitos já existentes no estado de natureza.

O contrato contém duas partes. Na primeira, os indivíduos decidem entre eles criar a autoridade superior; e na segunda eles pactuam com esta autoridade, entregando-lhe, em confiança, a condução de alguns interesses para sua melhor consecução, porém com a ressalva de que os direitos naturais não dependem dessa instituição (ANITUA, 2008, p. 127).

Feitas tais ressalvas, no âmbito do direito penal, os trabalhos realizados pelos intelectuais propuseram a revisão do sistema de penas. Ao menos no aspecto teórico, defendiam um tratamento mais humanitário para os presos. Então, é a partir da contribuição de cada autor que vamos acompanhar a “evolução” da pena de prisão nessa fase da história.

Os intelectuais da época censuravam o sistema da justiça penal. As principais críticas estavam relacionadas à representação do poder pelo clero e a confusão entre Estado e Igreja (CARVALHO, 2010, p. 285). Ademais, a insatisfação também estava ligada com as casas de trabalho e correção (CHIAVERINI, 2009, p. 94). Por conseguinte, reivindicavam um tratamento mais humano e racional na fixação das penas:

As correntes iluministas e humanitárias, das quais Voltaire, Montesquieu, Rousseau seriam fiéis representantes, fazem severa crítica aos excessos imperantes na legislação penal, propondo que o fim do estabelecimento das penas não deve consistir em atormentar um ser sensível. A pena deve ser proporcional ao crime, devendo-se levar em consideração, quando imposta, as circunstâncias pessoais do delinquente, seu grau de malícia e, sobretudo, produzir a impressão de ser eficaz sobre o espírito dos homens, sendo, ao mesmo tempo, a menos cruel para o corpo do delinquente (BITENCOURT, 2011, p. 40).

Nessa conjuntura, Cesare Bonesana, Marquês de Beccaria (1738 – 1794), publicou, em 1764, o famoso livro Dos delitos e das penas. Seus pensamentos filosóficos foram influenciados pelas obras racionalistas francesas. No referido livro desenvolve-se um sistema penal mais humano (BITENCOURT, 2011, p. 41). Sintetizando:

Sugeria mudanças que eram desejadas e apoiadas pela opinião pública. Surgiu exatamente no tempo em que deveria surgir. A Europa estava preparada para receber a mensagem do livro em 1764. Ele serviu para arrasar e destroçar muitos costumes e tradições da sociedade do século XVIII, especialmente por meio da ação dos protagonistas da nova ordem. É indubitável que Voltaire impulsionou muitas das ideias de Beccaria. Não é exagero afirmar que o livro deste é de vital importância na preparação e amadurecimento do caminho da reforma penal dos últimos séculos. Sua obra teve sentido político e jurídico, e seu campo de ação foi de grande amplitude, pois aspirava à reforma do direito penal naquele tempo reinante (BITENCOURT, 2011, p. 41).

À vista disso, suas propostas revolucionárias faziam frente à sistemática do Antigo Regime, sua obra foi considerada “o verdadeiro ponto de partida do direito penal moderno e da própria criminologia, enquanto análise crítica do sistema penal e da reação penal como manifestação de poder” (CARVALHO, 2010, p. 285). Bonesana procurou mudar a estrutura jurídica da época com um discurso inovador e avançado, pelo menos para aquele tempo. Todavia, as suas teses devem ser consideradas com certa atenção crítica, uma vez que se baseou na formação rousseauniana (CARVALHO, 2010, p. 286), ou melhor, defendia “a existência de um contrato entre cidadãos, e, com fundamento nesse acordo, justifica-se a existência da pena, sob a suposição de que é imposta a um ser livre que violou o pacto” (BITENCOURT, 2011, p. 42). Prova disso, é que se referiu à concepção de pacto em sua obra, na forma que se segue:

As leis são condições sob as quais homens independentes e isolados se uniram em sociedade, cansados de viver em contínuo estado de guerra e de gozar de uma liberdade inútil pela incerteza de sua conservação. Parte dessa liberdade foi por eles sacrificada para poderem gozar o restante com segurança e tranquilidade. A soma dessas porções de liberdade sacrificada ao bem comum forma a soberania de uma nação e o soberano é o seu legítimo depositário e administrador. Mas não bastava constituir esse depósito, havia que defendê-lo das usurpações privadas de cada homem em particular, o qual sempre tenta não apenas retirar do depósito a porção que lhe cabe, mas também apoderar-se daquela dos outros (Bonesana, 2005, p. 41).

O contrato social beneficiava a burguesia, já que sempre pretendeu “recompensar a atividade proveitosa e castigar a prejudicial” (BITENCOURT, 2011, p. 42). Nas palavras de Chaunu, citado por Bitencourt, avalia que:

[...] esse direito penal, construído em torno do contrato social, não faz mais que legitimar as formas modernas de tirania. Sob a ideia de que o criminoso rompeu o pacto social, cujos termos supõe-se tenha aceito, considera-se que se converteu em inimigo da sociedade. Tal inimizade levá-lo-á a suportar o castigo que lhe será imposto (Chaunu apud BITENCOURT, 2010, p. 43).

Importa observar que Bonesana enunciava a teoria retributiva. Assim, pregava que a prisão deveria ser humanitária, apesar de servir como sanção. Para ele a pena de prisão era a substituição perfeita para as punições corporais (BITENCOURT, 2011, p. 45).

Nesse sentido, Prado (2010) expõe sobre as concepções inovadoras de Bonesana o que segue:

Sem dúvida foi ele, foi ele o autor que em primeiro lugar desenvolveu a ideia da estrita legalidade dos crimes e das penas, operando uma verdadeira sistematização, dominada por três postulados fundamentais: legalidade penal, estrita necessidade das incriminações e uma penologia utilitária. Assim resumidamente: a) a afirmação do princípio fundamental da legalidade pena dos delitos e das penas: só as leis podem fixar as penas em relação aos delitos e essa autoridade não pode residir senão no legislativo; b) a afirmação de que a finalidade da pena é a prevenção geral e a utilidade: a pena deve ser necessária, aplicada com presteza, determinada, suave e proporcional ao delito; c) a abolição da tortura e da pena de morte; d) a infalibilidade na execução das penas; e) a clareza das leis; f) a separação das funções estatais e; g) a igualdade de todos perante a lei penal (PRADO, 2010, p. 88).

Ademais, a outra finalidade atribuída por ele à pena é a prevenção. Seu discurso era no sentido de que “o fim, pois é apenas impedir que o réu cause novos danos aos seus concidadãos e dissuadir os outros de fazer o mesmo” (Bonesana, 2005, p. 62).

Com base no que foi relatado, Santos (2010) denota que, atualmente, a teoria de Bonesana para a finalidade da pena é denominada de prevenção gral negativa. É proveitoso seu parecer:

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A crítica da prevenção geral negativa destaca a ineficácia da ameaça penal para inibir comportamentos criminosos, conforme indicam a inutilidade das cruéis penas corporais medievais e a nocividade das penas privativas de liberdade do Direito Penal moderno. Aliás, afirma-se que não é a gravidade da pena – ou o rigor da execução penal -, mas a certeza (ou a probabilidade) da punição que pode desestimular o autor de praticar crimes [...] (SANTOS, 2010, p. 427).

A doutrina de Bonesana serviu de base para o Código Penal da França, em 1791. Como resultado a privação da liberdade foi estabelecida como pena para muitos delitos (BITENCOURT, 2011, p. 45). Nesse sentido, Anitua (2008) destaca que:

[...] a privação da liberdade, era vista como adequada para o futuro. [...] Beccaria manifestava sua repulsa em relação à pena de morte e aos castigos corporais [...]. A moderação nos castigos se relaciona se relaciona com a eficácia e a utilidade e, por tanto, está ligada a uma velha prática estatal moderna de reclusão, a nova penalidade por excelência dos regimes democráticos contemporâneos - a prisão -, ainda que não apenas a ela uma vez que também defende outros castigos significativos e significantes (ANITUA, 2008, p. 163).

Nesse ínterim, as ideias de Bonesana se dissiparam, influenciando outros estudiosos a analisar com mais empenho a pena de prisão. Por conseguinte, merece destaque o trabalho realizado por John Howard, que se propôs visitar as prisões para relatar a situação em que se encontravam. Sua dedicação estava voltada a conceber uma reforma carcerária (Melossi; Pavarini, 2006, p. 79). Em suas viagens encontrou os cárceres em situações deploráveis, “uma deterioração do regime interno do cárcere, no qual são abandonadas as finalidades econômicas e, por isso, indiretamente, ressocializantes, sendo perseguidos, ao contrário, objetivos punitivos e terroristas” (Melossi; Pavarini, 2006, p. 80).

Nos relatos de Howard enfatiza-se que o surgimento das máquinas e das demais tecnologias trazidas pela Revolução Industrial aumentou o número de desempregados, provocando o retorno aos métodos terroristas nas prisões (Melossi; Pavarini, 2006, p. 82). Mesmo porque, ”em razão do desenvolvimento econômico e das condições do mercado de trabalho, a prisão não precisava cumprir a missão de produzir e formar bons proletários, devendo servir somente como instrumento de intimidação e controle político” (BITENCOURT, 2011, p. 48).

Desse modo, sua proposta era construir estabelecimentos apropriados para o cumprimento da pena privativa de liberdade, assegurando ao apenado um ambiente higiênico, com alimentação adequada e assistência médica. Apesar de na época, como hodiernamente, a reforma das prisões não estar nas pautas das autoridades, seu inconformismo pressionou o governo para que realizasse melhorias nos cárceres (BITENCOURT, 2011, p. 47-48). Por outro lado, defendia que o trabalho servia como meio de regeneração, mesmo que não o considerava obrigatório, bem como acreditava que a religião era a melhor intermediária entre “delinquente” e a “reabilitação”. Destacou a prioridade da reforma do “criminoso” em detrimento da retribuição. Ademais, argumentava que o isolamento noturno do condenado era a melhor proposta para o funcionamento das prisões, tal qual a separação entre mulheres e homens, preventivos e sentenciados e entre jovens e velhos (BITENCOURT, 2011, p. 48-49).

Podemos observar que vários preceitos defendidos por Howard, em 1777, estão presentes no sistema carcerário da época atual. Interessante que as mesmas imperfeições, apontadas há séculos por ele, continuam ainda sem solução, o que nos leva a refletir se o problema real é o da constante necessidade de aprimoramento da pena de prisão ou da insistência das autoridades em mantê-la por ser útil ao controle social.

Bentham também colaborou bastante em matéria de pena de prisão, sua teoria da pena estava baseada na procura da felicidade, uma vez que considerava que “o homem sempre busca o prazer e foge da dor” (BITENCOURT, 2011, p. 52). Foi ele o idealizador do Panótipo, pioneiro no quesito estrutura prisional (BITENCOURT, 2011, p. 52).

Sobre o Panótipo de Bentham, Foucault (1987) descreve que:

O princípio é conhecido: na periferia uma construção em anel; no centro, uma torre; esta é vazada de largas janelas que se abrem sobre a face interna do anel; a construção periférica é dividida em celas, cada uma atravessando toda a espessura da construção; elas têm duas janelas, uma para o interior, correspondendo às janelas da torre; outra, que dá para o exterior, permite que a luz atravesse a cela de lado a lado. Basta então colocar um vigia na torre central, e em cada cela trancar um louco, um doente, um condenado, um operário ou um escolar. Pelo efeito da contraluz, pode-se perceber da torre, recortando-se exatamente sobre a claridade, as pequenas silhuetas cativas nas celas da periferia. Tantas jaulas, tantos pequenos teatros, em que cada ator está sozinho, perfeitamente individualizado e constantemente visível. O dispositivo panóptico organiza unidades especiais que permitem ver sem parar e reconhecer imediatamente. Em suma, o princípio da masmorra é invertido; ou antes, de suas três funções – trancar, privar de luz e esconder - só conserva a primeira e suprimem-se as outras duas. A plena luz e o olhar de um vigia captam melhor que a sombra, que finalmente protegia. A visibilidade é uma armadilha (FOUCAULT, 1987, p. 166).

Ainda no dizer de Foucault (1987, p. 168) o panótipo foi inspirado “zoológico que Le Vaux construíra em Versalhes: primeiro zoológico cujos elementos não estão, como tradicionalmente, espalhados em um parque”, sendo assim “o panóptico é um zoológico real; o animal é substituído pelo homem, a distribuição individual pelo grupamento específico e o rei pela maquinaria de um poder furtivo” (FOUCAULT, 1987, p. 168). Destarte, o panótipo tinha o objetivo de:

[...] induzir no detento um estado consciente e permanente de visibilidade que assegurava o funcionamento automático do poder. Fazer com que a vigilância seja permanente em seus efeitos, mesmo se é descontínua em sua ação; que a perfeição do poder tenda a tomar inútil a atualidade de seu exercício; que esse aparelho arquitetural seja uma máquina de criar e sustentar uma relação de poder independente daquele que o exerce; enfim, que os detentos se encontrem presos numa situação de poder de que eles mesmos são os portadores (FOUCAULT, 1987, p. 166).

Quanto à função da pena, baseado no utilitarismo, defendia a prevenção geral e em segundo plano a prevenção especial. Sua pretensão era que a prisão desestimulasse a prática de outros crimes, servindo como alerta para todos. Sobre isso, Santos (2010, p. 426) aduz que “a função da prevenção geral atribuída à pena criminal tem por objetivo evitar crimes futuros.” Subsidiariamente, admitia o fim correcional da pena, expondo que:

É uma grande qualidade da pena poder servir para a emenda do delinquente, não só pelo temor de ser castigado novamente, mas também pela mudança em seu caráter e em seus hábitos. Conseguir-se-á esse fim analisado o motivo que produziu o delito e aplicando-lhe uma pena adequada para enfraquecer tal motivo. Uma casa de correção para atingir esse objetivo deve ser suscetível à separação dos delinquentes em diferentes seções para que possam ser adotados meios diversos de educação à diversidade de estado moral (Bentham apud BITENCOURT, 2011, p. 53).

Da mesma forma que os outros autores iluministas, Bentham não admitia punições degradantes, via uma finalidade para pena, qual seja a prevenção da prática de novos crimes, dessa forma legitimou a pena privativa de liberdade no fato de ser essencial para evitar futuros problemas e para reabilitar o “delinquente” (BITENCOURT, 2011, p. 53).

É inegável que com o passar dos tempos formularam-se subterfúgios para prosseguir com o encarceramento. Mesmo diante de provas contundentes do fracasso da pena de prisão, continuava a insistência de mantê-la, colocando a culpa do aumento da criminalidade na forma de executá-la e nunca no fato de sua existência. Apesar da aparente preocupação com o ser humano, as medidas adotadas eram somente para atender as necessidades da burguesia que utilizava o controle social que a prisão possibilitava para chegar ao poder.

4. SISTEMAS PENITENCIÁRIOS

No decorrer do tempo a pena privativa de liberdade passou a ser a penalidade mais aplicada do “direito punitivo” moderno, desse modo surgiram teorias para regulamentar a sua execução, donde afloraram os sistemas penitenciários (Bitencourt, 2011, p. 60).

Previamente já foram mencionados estabelecimentos que representaram o prelúdio desses sistemas e que fomentaram a origem da pena de prisão, como esmiuçado no capítulo anterior, os que serão tratados adiante eram considerados “apropriados” e “inovadores” por terem sido elaborados de forma criteriosa por intelectuais que desenvolveram uma “técnica” de encarceramento (Bitencourt, 2011, p. 60).

Assim, analisaremos os sistemas pensilvânico, filadélfico ou celular, auburniano e progressivo.

4.1. O SISTEMA pensilvânico, Filadélfico ou celular

O modelo filadelfiano foi desenvolvido nos Estados Unidos em um período que se propagandeava a privação da liberdade como meio de “recuperar” o condenado. Movimentos promoveram a ideia de prisões mais humanas, a fim de estimular uma reforma penitenciária capaz de revolucionar a pena de prisão e a forma de executá-la (Melossi; Pavarini, 2006, p.187).

O contexto histórico da época estava embasado nas seitas quakers que difundiam a função ressocializante das prisões, sendo consideradas “as protagonistas desta significativa ‘revolução’ no setor da política criminal” (Melossi; Pavarini, 2006, p.187). Nesse cenário, a influência ética que exerciam sobre a sociedade, pressionou as autoridades a tomar providências para criação de um estabelecimento no qual “o isolamento celular, a oração e a total abstinência de bebidas alcoólicas seriam capazes de criar os meios para salvar tantas criaturas infelizes” (BARNES apud Melossi; Pavarini, 2006, p.187).

Os reformadores acreditavam que o modelo filadelfiano seria a solução adequada para resolver as mazelas detectadas nos cárceres. No entanto, Melossi e Pavarini (2006) destacam que:

[...] nenhuma perplexidade tenha ofuscado a mente destes reformadores, convictos como estavam de que o solitary confinement era capaz de resolver qualquer problema penitenciário; impedia a promiscuidade entre os detidos, que se revelava um fator criminógeno de efeito desastroso, além de promover, por meio do isolamento e do silêncio, o processo psicológico de introspecção que era considerado o veículo mais eficaz para o arrependimento (Melossi; Pavarini, 2006, p.189).

Desse movimento “reformador” adveio o primeiro estabelecimento prisional a adotar o sistema filadélfico, qual seja o Walnut Street Jail, inaugurado em 1790 (Melossi; Pavarini, 2006, p.187). Tal sistema baseava-se:

[...] no isolamento celular dos internos, na obrigação ao silêncio, na meditação e na oração. Este sistema garantia, em primeiro lugar, uma drástica redução com as despejas de vigilância; em segundo lugar, este rígido estado de segregação individual negava, a priori, a possibilidade de introduzir um tipo de organização industrial nas prisões (Melossi; Pavarini, 2006, p.188).

O modelo filadelfiano foi a alternativa para o trabalho carcerário no período da produção manufatureira (SANTOS, 2010, p. 462). Nas palavras de Melossi e Pavarini (2006):

O cárcere celular filadelfiano recoloca, em escala reduzida, o modelo ideal (ou seja, a ideia abstrata de como as relações de classe e de produção deveriam organizar-se no “mercado livre”) da sociedade burguesa do primeiro capitalismo. O trabalho não deve ser necessariamente produtivo, mas sim instrumental do projeto então hegemônico, da vontade de “transformar” o criminoso em ser subordinado. O modelo virtual de “ser subordinado” que a execução penitenciária fundada no solitary confinement propõe é aquele do trabalhador ocupado numa produção ainda de tipo artesanal, numa oficina, numa manufatura. Para esta finalidade, a educação para o trabalho deve se dar através de um processo produtivo essencialmente manual, onde o peso do capital fixo é quase nenhum (Melossi; Pavarini, 2006, p.198-199).

De fato, em poucos anos de existência a Walnut Street Jail já apresentava falência, visto que “criminosos” de outras cidades eram enviados para lá enquanto não se construía estabelecimentos congêneres. Ocorre que as autoridades carcerárias não edificaram novas prisões, ocasionando a sua superlotação (Melossi; Pavarini, 2006, p. 187).

Por essa razão, foram construídas duas novas prisões, quais sejam a Western Penitenciary, localizada em Pittsburgh, em 1818, seguindo o modelo panótico de Bentham, marcada pela estrutura de execução do isolamento absoluto, ficando proibido até mesmo o trabalho nas celas, e a Eastern Penitenciary, construída em 1829, que permitia o desenvolvimento de alguns trabalhos no interior da prisão (Bitencourt, 2011, p. 63).

Desse modo, o sistema desenvolvido serviu como instrumento de dominação, sendo o discurso de melhorar as condições da prisão mero pretexto para implantar a ideologia da classe dominante (Melossi; Pavarini, 2006, p. 188).

A partir de então a tortura era configurada de forma velada e silenciosa, não mais no corpo dos condenados e sim em suas mentes de maneira terapêutica (Melossi; Pavarini, 2006, p.189). Nesse sentido Hentig citado na obra de Bitencourt (2011) expõe que:

Depois da dureza dos trabalhos forçados declarou-se, sem horror, como novo procedimento coativo a forçosa ociosidade. A tortura se refina e desaparece aos olhos do mundo, mas continua sendo uma sevícia insuportável, embora ninguém toque no apenado. O repouso e a ordem são os estados iniciais da desolação e da morte (Hentig apud Bitencourt, 2011, p. 64).

O sistema foi perdendo credibilidade nos Estados Unidos, quando se atentou para os prejuízos advindos do isolamento absoluto, que em primeiro lugar “privava o mercado de força de trabalho e deseducava os presos reduzindo sua capacidade de trabalho original” (Melossi; Pavarini, 2006, p. 190) e em segundo lugar foi considerado desumano, já que “elimina ou atrofia o instituto social, já fortemente atrofiado nos criminosos e porque tornava inevitável entre os presos a loucura ou a extenuação (por ananismo, por insuficiência de movimento, de ar etc.)” (FERRI apud Bitencourt, 2011, p. 66).

Hodiernamente, a Alemanha, por exemplo, aplica um sistema penitenciário análogo ao filadelfiano, os condenados por terrorismo são deixados em constante isolamento (Bitencourt, 2011, p. 68). É inquietante ter conhecimento que apesar de terem transcorrido décadas ainda tal modelo é adotado, a verdade é que “o sistema penitenciário, apesar de todos os esforços para convertê-lo em instrumento de ressocialização, não pode deixar de cumprir o papel de eficaz instrumento de controle e dominação” (Bitencourt, 2011, p. 69).

4.2. O Sistema Auburniano

Na época da industrialização o modelo filadelfiano começou a decair, visto que a sociedade industrial necessitava de um sistema carcerário que possibilitasse o trabalho produtivo, o que não era possível com o trabalho individual desenvolvido no interior das celas, a nova era demandava um trabalho coletivo (SANTOS, 2010, p. 463).

Desse modo, a nova realidade socioeconômica americana precisava de um novo sistema de controle social. Com efeito, o isolamento celular e a obrigação ao silêncio impediam a instauração das indústrias nas prisões, o que reduzia a produtividade carcerária, uma vez que os trabalhos desenvolvidos eram de caráter artesanal (Bitencourt, 2011, p. 64). Por outra vertente, perdurava a preocupação de ordem financeira, dado que ficava cada vez mais caro aprisionar (Melossi; Pavarini, 2006, p. 185). Por essas razões procurou-se um sistema mais econômico de administração, sendo eleito o modelo auburniano (Bitencourt, 2011, p. 64).

Assim, o trabalho produtivo no cárcere foi introduzido novamente. O modelo auburniano pareceu a solução para as adversidades econômicas que o antecedente causava (Melossi; Pavarini, 2006, p. 190). O sistema auburniano era baseado no:

[...] solitary confinement durante a noite e o common work durante o dia. O princípio do solitary confinement manteve, numa certa medida, uma influência não desprezível sobre as modalidades de reclusão, perdurando, ainda, a obrigação mais do que absoluta ao silêncio (às vezes, o sistema de Auburn aparece indicado como silent-systenn) no intuito de evitar contatos entre os internos e de obrigá-los a uma meditação forçada; foram também valorizadas positivamente as funções atribuídas à disciplina e á educação em geral.

Em essência, a originalidade do novo sistema consistia na introdução de um tipo de trabalho de estrutura análoga àquela então dominante na fábrica. Chega-se a esse resultado gradativamente. Num primeiro momento, [prossegue o autor] permitiu-se ao capitalista privado assumir, sob a forma de concessão, a própria instituição carcerária, com a possibilidade de transformá-la, às suas expensas, em fábrica. Num segundo momento, aderiu-se a um esquema de tipo contratual, no qual a organização institucional era gerida pela autoridade administrativa, permanecendo sob o controle do empresário tanto a direção do trabalho do trabalho quanto a venda da produção. Essa última etapa assinalou o momento da completa industrialização carcerária. As peculiaridades desse tipo de organização não se limitava apenas ao setor econômico, compreendendo também, mais especificamente, fenômenos como a educação, a disciplina e as modalidades no tratamento enquanto tal, efeitos, todos eles, da presença do “trabalho produtivo” no cumprimento da pena (Melossi; Pavarini, 2006, p. 191).

Nesse sentido, a primeira instituição a utilizar o modelo auburniano foi a penitenciária de Auburn, que deu nome ao sistema (Melossi; Pavarini, 2006, p. 190). No seu interior não era permitido a comunicação entre os presos, a exigência era o silêncio absoluto, Foucault (1987) relata que:

O modelo de Auburniano prescreve a cela individual durante a noite, o trabalho e as refeições em comum, mas, sob a regra do silêncio absoluto, os detentos só podiam falar com os guardas, com a permissão destes em voz baixa. Referência clara tomada ao modelo monástico; referência também tomada à disciplina de oficina. A prisão deve ser um microcosmo de uma sociedade perfeita onde os indivíduos estão isolados em sua existência moral, mas onde sua reunião se efetua num enquadramento hierárquico estrito, sem relacionamento lateral, só se podendo fazer comunicação no sentido vertical. Vantagem do sistema auburniano segundo seus partidários: é uma repetição da própria sociedade. A coação é assegurada por meios materiais mas sobretudo por uma regra que se tem que aprender a respeitar e é garantida por uma vigilância e punições. Mais que manter os condenados “a sete chaves como uma fera em uma jaula”, deve-se associá-lo aos outros, “fazê-los participar em comum de exercícios úteis, obrigá-los em comum a bons hábitos, prevenindo o contágio moral por uma vigilância ativa, e mantendo o recolhimento pela regra do silêncio” (Foucault, 1987, p. 200).

Nesse ínterim, além do rigoroso disciplinamento em que os presos estavam submetidos, destacava-se o ensino religioso difundido no cárcere com o intuito de que pela leitura da bíblia o “delinquente” alcançasse a “reabilitação” (Bitencourt, 2011, p. 77).

Vale registrar que o trabalho nas prisões demandava baixos custos, começando a competir com o trabalho livre. Nesses contornos, os sindicatos e comissões de trabalhadores reivindicavam medidas “contra a ameaça que a colocação das mercadorias produzidas pelos presos no mercado livre representava para sua organização” (Melossi; Pavarini, 2006, p. 203), causando o colapso do modelo auburniano. A esse respeito, Santos (2010) manifesta que os principais fatores para a falência do sistema foram:

[...] dificuldades de renovação tecnológica dos processos industriais na prisão, oposição crescente de sindicatos e organizações operárias contra a ocorrência do trabalho carcerário, exploração predatória da força de trabalho cativo para ampliar a taxa de mais-valia, castigos desumanos por motivos disciplinares ou econômicos etc. impediram a transformação da penitenciária em empresa produtiva (SANTOS, 2010, p. 465).

A exploração do trabalho e o controle social mais uma vez foram legitimados por uma sociedade que justificava a prisão com um suposto discurso humanitário e carismático, que pregava a privação da liberdade como meio eficaz para a “regeneração” dos indivíduos, que por infortúnio da vida nasceram desprovidos de posses. É dizer “o criminoso encarcerado representava o não proprietário encarcerado, mostrando o cárcere como instituição coercitiva para transformar o criminoso não proprietário no proletário não perigoso” (SANTOS, 2010, p. 465-466).

3.3 O SISTEMA PROGRESSIVO

A partir do século XIX a pena de prisão prevaleceu em relação às demais, a busca pela “ressocialização” do recluso chegou ao auge, para tanto se implantou o sistema progressivo das penas, que merece uma atenção especial, já que é adotado, com algumas modificações, pela estrutura penal contemporânea (Bitencourt, 2011, p. 79).

Considera-se que o “apogeu da pena privativa de liberdade coincide com o abandono dos regimes celular e auburniano e a adoção do regime progressivo” (ABADÍA apud Bitencourt, 2011, p. 79).

Foi após a Primeira Guerra Mundial que tal modelo se dissipou por diversos países, mormente na Europa (Bitencourt, 2011, p. 79). O sistema consistia em:

[...] distribuir o tempo de duração da condenação em períodos, ampliando-se em cada um os privilégios que o recluso pode desfrutar de acordo com sua boa conduta e o aproveitamento demonstrado do tratamento reformador [...]. A meta do sistema tem dupla vertente: de um lado pretende constituir um estímulo á boa conduta e à adesão do recluso ao regime aplicado, e, de outro pretende que esse regime, em razão da boa disposição anímica do interno, consiga paulatinamente sua reforma moral e a preparação para a futura vida em sociedade (Bitencourt, 2011, p. 79).

Importante atentar para o fato de que as experiências pregressas levaram ao modelo progressivo atual. Desse modo vale analisar o legado deixado por alguns estabelecimentos que adotaram tal sistema na sua forma embrionária.

Nesse sentido, podemos citar a Ilha de Norfolk, localizada na Inglaterra, lugar onde eram mantidos os “criminosos” considerados “perigosos”. Em 1840 foi implantado o mark system que supostamente “substituía a severidade pela benignidade e os castigos pelos prêmios” (Bitencourt, 2011, p. 80), embasando-se na contagem da pena levando em conta o bom comportamento em conluio com trabalho do recluso. Tal sistema funcionava nos moldes que seguem:

[...] media a duração da pena por uma soma de trabalho e de boa conduta imposta ao condenado. Referida soma era representada por certo número de marcas ou vales, de maneira que a quantidade de vales que cada condenado necessitava obter antes de sua liberação deveria ser proporcional à gravidade do delito. Diariamente, segundo a quantidade de trabalho produzido, creditava-se lhe uma ou várias marcas, deduzidos os suplementos de alimentação ou de outros fatores (Bitencourt, 2011, p. 80).

O sistema progressivo adotado na Inglaterra foi desenvolvido por Maconochie e consistiam três fases, quais sejam: inicialmente o recluso era mantido em isolamento celular diurno e noturno; em uma fase mediadora, o recluso era mantido trabalhando em comum, mas em silêncio absoluto; e no último momento lhe era concedido o livramento condicional (Bitencourt, 2011, p. 81).

Outro registro notável da aderência ao sistema progressivo foi na Irlanda, que através de Crofton no ano de 1853 idealizou um sistema cujo preso percorreria quatro fases para obter sua liberdade (Bitencourt, 2011, p. 81), sendo: a reclusão celular diurna e noturna; a reclusão celular noturna e trabalho diurno em comum; o período intermediário; e a liberdade condicional (Bitencourt, 2011, p. 81).

A inovação de Crofton quando criou um período intermediário assemelha-se com o regime semi-aberto aplicado hoje por alguns países, uma vez que o trabalho podia ser ao ar livre e deveria ser executado em estabelecimentos próprios (Bitencourt, 2011, p. 81).

Vale contemplar a perspectiva acertada de Foucault (1987) sobre o sistema progressivo:

Sob a forma, por exemplo, dos três setores: o de prova para a generalidade dos detentos, o setor de punição e o setor de recompensa para os que estão no caminho da melhora. Ou sob a forma das quatro fases: período de intimidação (privação de trabalho e de qualquer relação interior ou exterior); período de trabalho (isolamento mais trabalho que depois da fase de ociosidade forçada seria acolhido como um benefício); regime de moralização ("conferências" mais ou menos frequentes com os diretores e os visitantes oficiais); período de trabalho em comum. Se o princípio da pena é sem dúvida uma decisão de justiça, sua gestão, sua qualidade e seus rigores devem pertencer a um mecanismo autônomo que controla os efeitos da punição no próprio interior do aparelho que os produz. Todo um regime de punições e de recompensas que não e simplesmente uma maneira de fazer respeitar o regulamento da prisão, mas de tornar efetiva a ação da prisão sobre os detentos (Foucault, 1987, p. 206).

Também com o objetivo de alcançar a reforma moral do recluso destaca-se o sistema desenvolvido por Montesinos que considerava o trabalho como o melhor mecanismo para promover a “recuperação” do “delinquente”, a função terapêutica atribuída por ele ao trabalho contribuiu para o modelo progressivo hodierno, que mesmo sofrendo alterações, conserva características dessa época. (Bitencourt, 2011, p. 87).

Buscando a produtividade no trabalho dos presos, considerava o incentivo financeiro uma arma eficaz para alcançar tal objetivo, além de servir como meio “ressocializador”. Ocorreu que, esses estímulos ao trabalho produtivo nas prisões geraram, mais uma vez, reclamações por parte dos trabalhadores livres que não aceitavam a competição com o trabalho desenvolvido no cárcere (Bitencourt, 2011, p. 87). Nesse sentido, Bitencourt (2011, p. 87) conclui que “o trabalho penitenciário enfrenta a triste sina de ter de ser ineficiente, marginal e improdutivo”.

Para época o sistema progressivo foi considerado um avanço, visto que pelo menos amenizou as condições desumanas no cárcere e permitiu que a pena não fosse integralmente cumprida no “regime fechado”, isto é, era “menos pior” que os outros.

No entanto, hodiernamente, o conceito retributivo do sistema progressivo está em crise (Bitencourt, 2011, p. 89). Sobre as limitações do modelo progressivo podemos assinalar que a prisão não possibilita nenhum benefício para os presos ou para a sociedade, visto que é ineficaz para “recuperar” o indivíduo. Ao revés através dela cresce “substancialmente as probabilidades de reincidência” (Bitencourt, 2011, p. 91).

Pois bem, o modelo progressivo compele o preso a apresentar comportamento “adequado”, para que assim possa atenuar sua pena, mostrando de forma gradativa sua “aptidão” a “reintegrar-se” a sociedade, isso depois de ter aprendido, com o lapso temporal que passou na cadeia, a conviver na sociedade com os “cidadãos de bem” sem causar mais frustrações. A insanidade reside em acreditar que o criminalizado aprenderá a viver em sociedade sendo retirado dela (ZAFFARONI, 2001, p. 135). Zaffaroni assevera que a regressão é a característica principal da prisão explicando que “na realidade, o preso está submerso em um meio completamente artificial, introduzido em uma sociedade com valores que nada têm haver com os da vida em liberdade e que parece uma escola de crianças grandes bastante complicada” (ZAFFARONI, 2012, p. 448).

Enfim, é natural concluir que a pena de prisão não é um meio para resolver questões que estão ligadas a carências acarretadas pela ausência de políticas públicas, uma vez que os “governos vêm se rendendo à tentação de recorrer à polícia, aos tribunais e à prisão para estancar as desordens geradas pelo desemprego em massa, pela generalização do trabalho assalariado precário e pelo encolhimento da proteção social” (WACQUANT, 2011, p. 19).

5. A HISTÓRICA DA PENA DE PRISÃO NO BRASIL

5.1. Período Colonial

O período do Brasil Colônia teve início em 1500. É de conhecimento geral que desse ano em diante nosso país foi descoberto e explorado pela nação portuguesa. Sendo assim, para se falar em história da pena de prisão no Brasil é necessário nos remetermos ao direito dos nossos colonizadores, uma vez que foi o direito português que por muito tempo vigorou no Brasil (TELES, 2006, p. 26).

Importantes as palavras de Colaço (2010) que sintetizam a forma como os colonizadores viam a colônia:

Os colonizadores ao chegarem aqui e tomarem posse das terras dos nativos indígenas, sentiram-se os legitimados para, como verdadeiros donos desse “novo mundo”, ditaram-lhes os rumos em todos os sentidos.

Pelos portugueses colonizadores o Brasil nunca foi visto como uma verdadeira nação, mas sim como uma empresa temporária, uma aventura, em que o enriquecimento rápido, o triunfo e o sucesso eram os objetivos principais. Essas eram as reais intenções dos colonizadores, não obstante o discurso simulado e cínico da necessidade de levar a palavra cristã para os pagãos (COLAÇO, 2010, p. 398).

Informação importante é que o Brasil no período colonial foi caracterizado pela imposição dos padrões culturais dos portugueses brancos aos indígenas e aos afrodescendentes (CRISTIANI, 2010, p. 400). Os índios, que aqui já habitavam antes do “descobrimento”, com a chegada da colonização, não eram vistos como sujeitos de direitos, sendo considerados meros objetos. O que em relação aos afrodecendentes não foi diferente, já que na condição de escravos, eram trazidos da África e jogados em senzalas (CRISTIANI, 2010, p. 400).

Outro ponto a ser salientado é que, inicialmente, a colônia foi dividida em capitanias hereditárias, sendo responsáveis por elas os donatários, pessoas que recebiam a concessão de uma capitania. Eles possuíam poderes semelhantes aos dos senhores feudais, eram eles quem atuavam como legisladores e juízes, o que gerava, em face das várias capitanias existentes, uma descentralização total de poderes, já que cada donatário tinha autonomia nas suas decisões, o que caracterizava um poder punitivo doméstico (ZAFFARONI at al., 2003, p. 412). À vista disso, o sistema de capitanias hereditárias não era considerado como apto para atender o extenso território da colônia. Dessa forma, se destacaram as ordenações do reino, que eram leis compiladas que tratavam de assuntos gerais (cristiani, 2010, p. 403).

Diante da necessidade de centralizar a administração da colônia, tentou-se dar força às Ordenações para serem utilizadas como as principais legislações válidas, mas os donatários ainda exerciam grande influência, sendo assim pouca aplicabilidade tiveram (Cristiani, 2010, p. 403).

A despeito de sua pouca aplicação, a primeira das Ordenações a vigorar na colônia foi as Afonsinas que duraram de 1447 até o ano de 1521:

As Ordenações Afonsinas, em cuja vigência (1447 – 1521) se deu a descoberta do Brasil, não tiveram qualquer influência na nova colônia. Trata-se de uma compilação de regimentos, concordatas e leis régias anteriores [...], que naquela ocasião disputavam autoridade e competência com o direito canônico, com o direito romano (cujas regras são denominadas “leis imperiais”) e com os direitos locais, aqueles forais outorgados a distritos ou concelhos por senhores ou pelo próprio rei, cuja intangibilidade se reduzia desde a crise do feudalismo no século XIV. A matéria criminal se compendiava, ainda que não exclusivamente, no livro V; além da influência canônica (o título I trata dos hereges, e diversos títulos criminalizam a sexualidade segundo padrões canônicos) e romana (nas “forças novas demandadas antes do ano e dia” do título LXVIIII ressoa o interdictum unde vi), estão presentes traços germânicos (como gritos nas ruas que habilitavam a mulher forçada a querelar, no título VI), provenientes do processo histórico inaugurado com o reino visigótico. A cominação abusiva da pena de morte e das penas corporais, o emprego por arbítrio judicial da tortura (V, LXXXVII, 4), a ampla criminalização de crenças, opiniões e opções sexuais e a própria transmissibilidade das penas respondem à conjuntura na qual se inscreve tal compilação (ZAFFARONI at al., 2003, p. 413).

Com a reforma das Ordenações Afonsinas, que não vigoraram por muito tempo, advieram as Ordenações Manuelinas, em 1521. Zaffaroni e outros (2003), a respeito das Ordenações Manuelinas, observam que,

[...] se limitam a recolher e incluir novas leis e pequenas alterações topológicas na disposição dos textos. Nas delegações e jurisdição penal que os soberanos portugueses fizeram, especialmente na primeira metade do século XVI, as autoridades colonizadoras, segundo um modelo com evidentes traços feudais, estavam sem dúvida presentes as estruturas burocráticas desempenhadas nas Ordenações (ouvidores, tabeliães, meirinhos etc.), porém na prática o poder punitivo era exercido desregulada e privadamente (ZAFFARONI at al., 2003, p. 413).

Apesar das Ordenações Manuelinas e de sua antecessora terem sido consideradas vigentes, pouco afetavam o que se passava no Brasil, uma vez que, como já elucidado, a figura dos donatários não desapareceu e continuou a ditar as regras. Os donatários tinham um poder absoluto e estabeleciam arbitrariamente o direito a ser aplicado (Bitencourt, 2000, p. 41). Como esclarece Bitencourt (2000):

[...] e como cada um tinha um critério próprio, era catastrófico o regime jurídico do Brasil-Colônia. Pode-se afirmar sem exagero que se instalou tardiamente um regime jurídico despótico, sustentado em um neofeudalismo luso-brasileiro, com pequenos senhores, independentes entre si, e que, distantes do poder da Coroa, possuíam um ilimitado poder de julgar e administrar seus interesses. De certa forma, essa fase colonial reviveu os períodos mais obscuros, violentos e cruéis da História da Humanidade, vividos em outros continentes (Bitencourt, 2000, p. 41).

Da revisão das Ordenações Manuelinas resultaram as Ordenações Filipinas, em 1603 (cristiani, 2010, p. 403), que trouxeram um pouco de originalidade em relação às precedentes, mesmo não contendo mudanças significativas no seu texto:

Diversamente das Afonsinas, que não existiram para o Brasil, e das Manuelinas, que não passaram de referências burocráticas, causal e distante [...], as Ordenações Filipinas constituíram o eixo da programação criminalizante de nossa etapa colonial tardia, sem embargo da subsistência paralela do direito penal doméstico que o escravismo necessariamente implica. A vigência das Filipinas, em matéria penal, avançou mesmo alguns anos sobre o próprio estado nacional brasileiro, até a promulgação do código criminal de 1830, com os limites e alteração decorrentes da nova ordem constitucional e de algumas leis penais editadas naquele período [...] (ZAFFARONI, 2003, p. 417- 418).

Nesse sentido, o Livro V, das Ordenações Filipinas demonstra que o modelo de sistema penal daquela época previa a pena de morte e outras penas severas e desproporcionais:

[...] verifica-se que a presença da pena de morte na legislação portuguesa (especialmente no Livro V das Ordenações Filipinas) tinha uma aplicação comedida, restrita a reis dos quais se exigia que fossem pios e misericordiosos e estava condicionada à lógica judicial de um absolutista político de inspiração tomista: A dureza da pena prevista no texto da lei combinava-se com a temperança do perdão régio, que fazia parte do processo de dominação e submissão política. A pena de morte visava predominantemente produzir efeitos inibidores – repressivos dissuasórios. A sua aplicação, contudo, incidia mais sobre os crimes de lesa – majestade; vale dizer crimes políticos. Não nos esqueçamos da punição com pena de morte dos cabeças de rebeliões anticolonialistas no Brasil: Tiradentes, enforcado e esquartejado por participação na Conjuração Mineira, em fins do século XVIII; padre Roma, fuzilado aos olhos de seus filhos [...] (NEDER, 2009, p. 80-81) .

As ordenações Filipinas foram as mais importantes para o Brasil, posto que perduraram por longo período de tempo, em contrapartida tais ordenações continham punições extremamente brutais, como a pena de morte acima mencionada e a desigualdade de tratamento penal conforme o sexo e a posição social (AMARAL, acesso em 23 de jun. 2014).

Sobre tais Ordenações conclui Telles (2006):

Punições severas e cruéis, inexistência do princípio da reserva legal e do direito de defesa, penas arbitradas desproporcionalmente pelos juízes, e desiguais, conforme o status do apenado, e punição de delitos religiosos e absurdos, como a heresia e o benzimento de animais. Pena de fogo em vida, de ferro em brasa, de mãos cortadas, de tormentos, além, é claro, da transmissão da infâmia aos descendentes do criminoso, revelam o grau de crueldade e desumanidade desse direito (TELES, 2006, p.27).

Feitas esses considerações preliminares, podemos discorrer sobre as prisões durante o período colonial. A esse respeito dispõe Aguirre (2009):

Durante o período colonial, as prisões e cárceres não constituíam espaços, instituições que seus visitantes e hóspedes pudessem elogiar pela organização, segurança, higiene ou efeitos positivos sobre os presos. De fato, as cadeias não eram instituições demasiadamente importantes dentro dos esquemas punitivos implementados pelas autoridades coloniais. Na maioria dos casos tratava-se de meros lugares de detenção para suspeitos que estavam sendo julgados ou para delinquentes já condenados que aguardavam a execução da sentença. Os mecanismos coloniais de castigo e controle social não incluíam as prisões como um de seus principais elementos. O castigo de fato, se aplicava muito mais frequentemente por meio de vários outros mecanismos típicos das sociedades do Antigo Regime, tais como execuções públicas, marcas, açoites, trabalhos públicos ou desterro. Localizadas em edifícios fétidos e inseguros, a maioria das cadeias coloniais não mantinha sequer um registro dos detentos, das datas de entrada e saída, da categoria dos delitos e sentenças. Vários tipos de centro de detenção formavam um conjunto algo disperso de instituições punitivas e de confinamento: cadeias municipais e de inquisição, postos policiais e militares, casas religiosas para mulheres abandonadas, centros privados de detenção como padarias e fábricas – onde escravos e delinquentes eram recolhidos e sujeitados a trabalhos forçados – ou cárceres privados em fazendas e plantações nos quais eram castigados os trabalhadores indóceis [...]. Logo, o encarceramento de delinquentes durante o período colonial foi uma pratica social regulada simplesmente armazenar detentos, sem que se tenha implementado um regime punitivo institucional que buscasse a reforma dos delinquentes (Aguirre, 2009, p. 38).

Roig (2005) nos traz exemplos de prisões edificadas durante o período colonial:

No Rio de Janeiro Colonial, gozavam de especial destaque a Cadeia Velha, edificada em 1672 para o recolhimento de sentenciados e desativada em 1808 para servir de hospedaria para os membros da Corte de Dom João VI, recém foragidos de Portugal, e a prisão do Aljube, construída nas imediações da Ladeira da Conceição, entre 1735 e 1740 (Roig, 2005, p. 29).

Não obstante a existência de cadeias, o sistema penal que vigorava no Brasil colônia era marcado por punições corporais, públicas de senhores sobre seus escravos e pela subsistência da pena de morte na forca, galés, desterro, degredo e imposição de trabalhos públicos forçados (Roig, 2005, p. 28). Zaffaroni e outros (2003) destacam acerca dos usos punitivos durante o período colonial o seguinte:

Os usos punitivos do mercantilismo, concentrado no corpo do suspeito ou condenado - na reinvenção mercantil do degredo, nas galés, nos açoites, nas mutilações e na morte – encontram-se na colônia, praticados principalmente no âmbito privado. Além de constituir uma tradição ibérica, essa continuidade público-privado se beneficiava, em primeiro lugar, da incipiente e lerda implantação das burocracias estatais no Brasil colonial (ainda assim, atreladas aos ciclos produtivos e à tutela do monopólio); em segundo lugar, do escravismo, inexoravelmente acompanhado de um direito penal doméstico; e, em terceiro, do emprego de resquícios organizativos feudais ao início dos esforços de ocupação (capitanias hereditárias): na reminiscência feudal sobrevive a superposição entre o eixo jurídico privado (dominium) e o público (imperium) (ZAFFARONI et al., 2003, p. 411-412).

Nessa conjuntura chegamos à conclusão de que no período colonial o Brasil não possuía um sistema carcerário. O certo é que as cadeias existiam tão somente para assegurar a aplicação da pena, era o lugar onde se aguardava a execução. Logo, manter o sujeito encarcerado não era uma pena, mas sim uma medida de garantir que o condenado recebesse a sua verdadeira penalidade. O fato é que mesmo não tendo o propagandeado objetivo que atualmente se emprega a ela, a prisão existia, e desde os seus primórdios nunca recebeu os “cuidados” que necessitava, além do mais sempre foi sinônimo de violência e descaso, lugar em que os menos favorecidos eram deixados a própria sorte. O que curiosamente se observa até a presente data.

4.2 PERÍODO IMPERIAL

Após a proclamação da República em 1822, no Brasil iniciou-se uma nova ordem jurídica (cRISTIANI, 2010, p. 403). Enquanto não se organizava um novo Código continuaram vigentes as Ordenações Filipinas, confirmadas pela Assembléia Constituinte do Brasil, perdurando até 1830, quando foi sancionado por D. Pedro o Código Criminal do Império (ZAFFARONI et al., 2003, p. 423).

Em 1824 foi outorgada a primeira Constituição brasileira, que abordava garantias e direitos individuais inspirados no movimento iluminista que inebriava boa parte do mundo na época. Zaffaroni e outros (2003) a descrevem como contraditória:

A constituição de 1824 mantivera a escravidão, sob a fórmula circunloquial de garantir o direito de propriedade em toda sua plenitude (art. 179, inc. XXII). A contradição entre a condição escrava e o discurso liberal era irredutível [...]. De outro lado o tratamento dos conflitos aguçados pela crise fará o projeto liberal de estado refluir para um projeto policial, num movimento de centralização política que explicitamente se veiculará através do poder punitivo, notadamente do processo penal (ZAFFARONI et al., 2003, p. 424).

Em 1830 foi sancionado o Código Criminal do Império. A nova legislação trouxe consigo conflitos de interesses, de um lado as ideias de base iluminista e do outro a escravidão:

A compreensão da programação criminalizante que teve seu núcleo no Código Criminal do Império do Brasil, de 1830, bem como do sistema penal montado a partir dela, pode ser facilitada pela análise de dois grandes eixos, no primeiro dos quais encontramos a contradição entre o liberalismo e a escravidão, e no segundo movimento político de descentralização e centralização, que se valeu intensamente do processo penal. Quando se assenta a poeira dos tensos episódios que assinalam a independência, ascende ao poder do novo estado a classe mais diretamente interessada na conservação do regime: os proprietários rurais, que se tornam sob o império a força política e socialmente dominadora. Paralelamente à decadência do nordeste, a cultura do café no sudeste faz este produto ultrapassar o açúcar e o algodão nas exportações e concentra geograficamente riqueza e poder político, prorrogando a demanda de mão-de-obra escrava (ZAFFARONI et al., 2003, p. 423).

Extrai-se do trecho acima que mesmo com a independência, no Brasil Império manteve-se tanto a monarquia quanto a escravidão, como preleciona Aguirre (2009):

Ainda que os reformadores de viés liberal tenham podido implementar uma série de medidas tendentes a criar um sistema judicial moderno, estes tiveram um impacto limitado em uma sociedade organizada em função de drásticas divisões sociolegais (livres x escravos). Os métodos policiais e punitivos, como vários estudiosos enfatizaram, objetivavam, sobretudo, garantir a manutenção de ordem social, laboral e racial da qual a escravidão constituía elemento central. Os métodos e estatísticas de perseguição policial e detenção em áreas de produção de café e açúcar, por exemplo, refletiam a necessidade de garantir a força de trabalho e o controle social sobre as populações negras escravas e livres (Aguirre, 2009, p. 49).

As manifestações liberais que aconteciam no mundo influenciaram, ao menos no texto, o Código Criminal, dando início à aplicação da pena de privação de liberdade em substituição as penas corporais, pelo menos quando se tratava de “criminosos” livres (TELES, 2006, p. 28). Vejamos:

Além dos castigos corporais infligidos aos escravos pelos senhores e seus prepostos, após 1830, com a entrada em vigor do Código Criminal do Império – em caso de condenação à prisão – enquanto aos libertos e livres, pelo menos em tese, cabiam as então modernas formas de punir (reeducar e ressocializar), aos cativos continuava reservada a pena de açoites. Pena esta que, em casos extremos, de até oitocentos açoites, era caracterizada pelos práticos e cirurgiões que as acompanhavam como morte com suplício – típica punição do Antigo Regime (FERREIRA, 2009, p. 179- 180).

O Código Criminal ainda contemplava a pena de morte, as penas de galés e de degredo, que eram mais direcionadas para os escravos, porém a pena fundamental do novo sistema penal passa a ser a de prisão:

O arsenal das penas estabelecido pelo Código de 1830 compunha-se da morte na forca (artigo 38); galés (artigo 44); prisão com trabalho (artigo 46); prisão simples (artigo 47); banimento (artigo 50); degredo (artigo 51); desterro (artigo 52); multa (artigo 55); suspensão de emprego (artigo 58); perda de emprego (artigo 59). Para os escravos, havia ainda a pena de açoite, caso não fossem condenados à morte nem às galés. Depois do açoite, o escravo deveria ainda trazer um ferro, segundo a determinação do juiz (MOTTA, 2011, p. 78).

Dessa forma, mesmo diante do discurso de índole liberal, o sistema penal brasileiro ainda estava atrelado à escravidão e submetido às vontades dos grandes proprietários de terra. Tanto a Constituição quanto o Código Criminal previam penas desiguais e cruéis aos escravos, e era nessa conjuntura que a pena de prisão era aplicada, nas palavras de Aguirre:

As prisões e o castigo foram usados, nesse contexto, fundamentalmente para promover a continuação do trabalho escravo orientado à economia de exportação. Um reformador de prisões culpou a “escravocracia” pela lentidão no processo de reforma carcerária na Bahia, onde a correção privada imposta aos escravos e outros trabalhadores continuava sendo a forma punitiva preferida tanto por autoridades como pelos proprietários de escravos (AGUIRRE, 2009, p. 49).

Outrossim, subsistiam duas categorias de condenação, quais sejam a pena de prisão com trabalho e a pena de prisão simples. Nesse sentido, vejamos:

A pena de prisão com trabalho era executada dentro das prisões e o trabalho desenvolvido diariamente, na conformidade das sentenças e do regulamento das prisões (art. 46). Podia ser substituída pela prisão simples enquanto não fossem estabelecidas as prisões adequadas para o seu cumprimento, devendo ser acrescida de sexta parte (art. 49). A pena de prisão simples era cumprida nas prisões públicas pelo tempo determinado na sentença (art. 47). Se a pena não fosse superior a seis meses poderia ser cumprida em qualquer prisão no lugar da residência do condenado ou outro lugar próximo, devendo a sentença conter tal determinação (art. 48) (SILVA, 1998, p. 31).

Apesar da pena de prisão ter sido adotada no Código Penal de 1830, só foi colocada em prática a partir de 1850 com a inauguração da Casa de Correção da Corte do Rio de Janeiro, considerada a síntese da legislação punitiva da época, já que o sistema penal era visto como inadequado pelos que defendiam a pena de prisão, uma vez que sentiam o Brasil atrasado em relação ao “progresso” dos outros países. Mas a realidade é que o estabelecimento prisional serviu para alojar os alvos sociais do sistema penal da época (Roig, 2005, p. 37-38). Bretas (2009), acerca da casa de correção narra que:

Esta prisão era uma irônica personificação dos sonhos dos reformadores. Planejada nos anos de 1830 pela Sociedade Defensora da Liberdade e Independência Nacional e baseada no modelo pan-óptico, nunca foi concluída. A primeira ala foi inaugurada em 1850, tornando-se a Casa de Correção. A segunda foi construída alguns nos depois e reorganizada como outra prisão, a casa de detenção, enquanto as outras alas nunca foram construídas (BRETAS, 2009, p. 190).

A promulgação do Código Criminal e as diretrizes adotadas pela Constituição fomentaram a reforma prisional, tornando a pena de prisão a punição predominante entre as medidas penais da época e dando a ela as seguintes atribuições:

Quais são os fins da prisão segundo os reformadores? Os fins de uma prisão vêm a ser três: custódia segura, reforma e castigo. Os antigos calabouços e os grilhões são considerados como expediente dos tempos bárbaros, e a violência física como meio de punição deve ser substituída pelo sistema de uma contínua vigia sobre o preso, invenção de um destes filósofos ardentes pela causa da humanidade. Um desses “gênios beneficentes” era o “venerável J. Bentham” (MOTTA, 2011, p. 106).

A realidade constatada nos cárceres no período imperial era diversa da sugerida pelas legislações, existiam diversos problemas como descreve Roig (2005):

Com o advento do período imperial restaram como prisões civis da Corte a Prisão de Santa Bárbara, a prisão da Ilha das Cobras, o Calabouço e o Aljube. Em todas elas cumpre ressaltar, vigorava a perniciosa e indiscriminada combinação de presos de diferentes espécies.

A primeira das prisões, situada na Ilha de Santa Bárbara, destinava-se aos “criminosos e condenados de crimes mais atrozes, e devo dizer alguns já tão incorrigíveis, que fazem necessária uma casa forte, onde estejam insulados, percam a vontade de fuga e arrombamento e não acabem de contaminar e perder os que ainda não estão nesse último grau de depravação”.

Embora dotada de condições menos precárias que as demais, a prisão de Santa Bárbara se localizava muito distante da cidade, dificultando a visitação e, consequentemente, a provisão de gênero aos reclusos [...]. Outro revés enfrentado pelos reclusos encontra-se relatado em ofício de 15 de fevereiro de 1842, enviado a Secretaria de Estado dos Negócios da Justiça por João Thomaz Coelho, então administrador da Ilha de Santa Bárbara, informando que a iluminação em toda cadeia fora cortada por determinação de chefe de polícia. Por sua vez, a prisão da Ilha das Cobras, erigida onde hoje funciona o Arsenal da Marinha, teve suas masmorras construídas pelos padres jesuítas, destinando-se inicialmente ao recolhimento de militares. Porém a partir de 1834, diante da extrema carência de estabelecimentos prisionais na capital do Império, também passou a abrigar presos civis e escravos (Roig, 2005, p. 30-31).

A prisão denominada Calabouço era destinada aos escravos fugitivos, que quando apanhados, eram enviados para lá com o intuito de serem castigados:

[...] foi edificado no interior da Fortaleza de São Sebastião, no Morro do Castelo, reservando-se aos escravos fugitivos, capturados por caçadores, que esperavam a vinda de seus donos para reclamá-los, aos escravos que deveriam ser “corrigidos com uma temporada na prisão” e principalmente aos escravos, em geral fugitivos, enviados por seus proprietários para a expiação da pena de açoites – em quantidade determinada por estes – e posterior imposição de ferros, com a permanência no cárcere pelo tempo igualmente fixado pelos senhores, nos termos do artigo 60 do Código Criminal de 1830. Nesse momento, percebe-se, o poder público ainda se reportava ao senhor para fins de graduação das punições, imiscuindo as esferas penais públicas e privadas (Roig, 2005, p. 32).

Em se tratando das condições inumanas do cárcere destaca-se o Aljude, considerado um testemunho concreto da transformação do prisioneiro em “vítima de uma justiça despótica” (MOTTA, 2011, p. 92). No que tange sua estrutura apresentava-se numa situação deplorável, pois não havia separação entre os prisioneiros e as condições de higiene eram péssimas. Foi apontado por Motta (2011, p. 91) como “um misto de repugnância moral e física: mistura de acusados com criminosos, de acusados com vítimas de calúnias. A prisão é um depósito de todos os vícios, um antro infernal nela tudo se acha confundido”.

Concomitante a construção da casa de correção aumentavam os movimentos em prol da abolição da escravatura, que resultaram na proibição ao tráfico de escravos (1851), na Lei do Ventre Livre (1871), na Lei dos Sexagenários (1885) e na Lei Áurea (1888) (Morais, 2012, p. 04).

É digno de nota que as prisões após a abolição da escravatura se apresentavam “como uma resposta ás vicissitudes e ameaças sofridas pela ordem escravista” (Roig, 2005, p. 39). Nesse sentido, Roig (2005) afirma que:

[...] o sistema de controle disciplinar carcerário no Brasil teve seus contornos no âmago da sociedade escravista brasileira do século XIX, em especial durante o começo da expansão cafeeira. Muitos eram os focos de tensão e de ameaça à hegemonia do modelo cafeeiro insurgente, destacando-se os interesses ingleses contrários ao tráfico intercontinental, os plantadores escravistas, os produtores interioranos, sobretudo do Sul de Minas, ligados ao abastecimento da cidade do Rio de Janeiro, os colonos das demais regiões, os escravos insurretos e a malta urbana (ROIG, 2005, p. 35).

Fazendo uma análise do Brasil no período do Império, tomando como base as informações apresentadas, concluímos que a conjuntura penitenciária brasileira não divergiu muito do período colonial, sendo que as mudanças ocorridas foram para pior. Sobre a estagnação do sistema carcerário Morais, citado na obra de Roig (2005), arremata:

Nas três épocas sucessivas do Brazil – Colônia, Brazil Reino – Unido e Brazil – Império incipiente, não obedeceram as prisões a qualquer princípio de ordem, de hygiene, de moralização. Muitas das monstruosidades com que aqui deparou D. João VI permaneceram durante a sua estadia e atravessaram o primeiro reinado. E os melhoramentos, depois adoptados, não passaram de palliativos. Nos primeiros anos do século 19º, confundiam-se, em certas prisões do Brazil, paisanos e militares, indivíduos processados e condenados por delictos communs ,presos por qualquer motivo político, presos por nenhum motivo declarado. Não sendo, como não era, propriamente, empregada a prisão para modificar a índole dos, nella, detidos, desinteressava-se a publica administração do seu regime interno, entregue ao bel-prazer do carcereiro (MORAIS apud Roig, 2005, p. 35) (sic).

Diante do exposto, as muralhas das prisões escondiam as vítimas do sistema prisional, a ira do poder punitivo estava voltada novamente para os escravos. A prisão permanecia na profunda indiferença, porém mantinha-se firme por possuir várias “utilidades”, nesse momento da história, era útil para assegurar a escravidão e necessária para satisfazer a economia, que precisava dos escravos para se sustentar.

5.2. PERÍODO REPUBLICANO

A República foi proclamada em 15 de novembro de 1889, com o golpe militar de Marechal Deodoro da Fonseca, o governo teve pressa na elaboração de um novo Código Criminal, assim em 1890 foi criado o Código Penal dos Estados Unidos do Brasil (TAKADA, 2010, p. 03).

O processo ideológico que embasou a elaboração do novo Código tinha suposta base científica:

No discurso deste novo sistema penal, a inferioridade jurídica do escravismo será substituída por uma inferioridade biológica; enquanto a primeira, a despeito de fundamentos legitimantes importados do evolucionismo, podia reconhecer-se como mera decisão de poder, a segunda necessita de uma demonstração científica. Neste sentido, poderíamos afirmar que o racismo tem uma explicável permanência no discurso penalístico republicano, que se abebera nas fontes do positivismo criminológico italiano e francês para realizar as duas funções assinaladas por Foucault: permitir um corte na população administrada, e ressaltar que a neutralização dos inferiores “é o que vai deixar a vida em geral mais sadia; mais sadia e mais pura” (Zaffaroni, 2003, p. 443).

De todo modo, vigorava no Brasil um pensamento positivista com arrimo no discurso científico. O foco do poder médico-policial era eliminar tudo e todos que representassem uma ameaça para a segurança do Estado. Nessa conjuntura se dissipou a intervenção higienista, trazendo a figura dos “doentes mentais”, influenciando as decisões judiciais da época e contribuindo para a criação de manicômios judiciários, que ainda podemos constatar na atualidade (Zaffaroni, 2003, p. 443).

O novo Código Criminal de 1890 previa a pena privativa de liberdade como o centro do sistema penal, seja pela prisão disciplinar, pelo trabalho obrigatório, pelo estabelecimento agrícola, pela reclusão em fortalezas ou pela prisão celular (MOTTA, 2011, p. 295).

Ademais, no que tange a “arquitetura” prisional o Código Penal da República “adotou o sistema de Filadélfia, ou de Pensilvânia combinado com o auburniano e modificado pelo método irlandês” (SILVA, 1998, p. 35).

Dentro desse contexto, os marginalizados pelo Código Penal Republicano eram os capoeiras, os imigrantes, as prostitutas, os vadios, ébrios e os afrodescendentes. Eram eles os eleitos a ocupar as vagas do sistema carcerário brasileiro (MORAIS, 2012, p. 06). É notório que o Código tratou de direcionar os tipos penais para as classes que o governo queria manter sob seu domínio. Nesse sentido, vejamos:

Com a República, os ventos políticos sopraram na direção da criação de um arcabouço jurídico que fosse condizente com as demandas da Federação. De imediato, o código penal republicano, de 1890, tratou de instituir tipos penais que permitissem o controle e a ordenação das classes perigosas pelos governantes (MORAIS, 2012, p. 06).

Em 1891 adveio a Constituição Republicana, que, ao menos no texto, extinguiu as penas de galés e de banimento e limitou a pena de morte, que só poderia ser aplicada em tempo de guerra e trouxe na sua redação a função ressocializadora da pena de prisão (MORAIS, 2012, p. 06):

Se, no plano teórico, tais constituições eram tributárias do ideário transformador da punição, na prática, desde o início, coexistiram com um sistema prisional precário. Afinal, no caso brasileiro, o abismo existente entre a legislação formal e as práticas punitivas empregadas pelas agências repressoras tem sido uma característica que perdura desde o período colonial, atravessa o império e se prolonga pelo regime republicano.

Portanto, o regime penitenciário adotado pela Constituição era de caráter correcional, a pena de prisão era utilizada como meio de regeneração da “delinquencia”, na forma de pensar da época o encarceramento supostamente resolveria o problema da criminalidade (MOTTA, 2011, p. 294). O que não difere da concepção atual sobre o cárcere.

A Primeira República encerrou-se contando com uma legislação formal, porém a realidade dos cárceres era diversa do que o ordenamento jurídico determinava, visto que não foi efetuado o projeto punitivo proposto, como, por exemplo, a construção de novos estabelecimentos prisionais, fato que ocasionou a superlotação nos que já existiam (MOTTA, 2011, p. 294).

Em 1934 foi promulgada a Constituição da República Nova, que concedeu a União competência exclusiva para legislar a respeito do sistema carcerário. O resultado veio em 1935, com a edição do regulamento penitenciário, elaborado para tentar administrar as adversidades em que se encontravam as prisões, já que a falência da pena privativa de liberdade era evidente, prova disso é a reincidência que já aparecia naquela época (MAIA, 2009, p. 117). Desse modo, “criava-se um ambiente reprodutor da delinquência dentro do presídio” (MAIA, 2009, p. 145).

Entrementes, em 1937 o quadro político brasileiro sofreu profundas alterações, acarretando modificações nas leis penais. O começo do Estado Novo foi marcado pela aprovação, por Vargas, da Constituição Polaca, de cunho autoritário, que foi direcionada a satisfazer os interesses políticos, utilizando a pena de prisão para conter os inimigos do governo (MORAIS, 2012, p. 07).

Em 1938, Vargas confiou a Machado à elaboração de um novo Código Penal. No entanto, o projeto foi submetido a uma comissão revisora composta por Nelson Hungria, Roberto Lyra, Narcélio de Queiroz e Vieira Braga, sendo que foi apresentado em 1940 e promulgado em 1942 (Zaffaroni; PIERANGELI, 2008, p. 194).

A pena de prisão apresentou-se com o objetivo de estimular a “regeneração” do condenado. Para tanto considerou o sistema progressivo como o mais adequado para alcançar o fim almejado, o cumprimento da pena passava por quatro estágios, na forma que segue:

A primeira fase compreende um breve período de isolamento celular contínuo, diurno e noturno, com o fim de acentuar, pela situação mais aflitiva desse período, o caráter mais severo da pena de reclusão. O Código limitou o isolamento, nesse período, ao máximo de três meses [...].

Na segunda fase o preso passaria a conviver com os outros presos, no entanto, continuaria em isolamento noturno. O preso deveria trabalhar, dentro dos presídios ou fora, em obras ou serviços públicos como forma de exercício de um direito, mas, também como dever imposto pela pena visto que tratava-se de medida necessária de segurança e moralidade. A terceira fase é o livramento condicional que antecede a liberdade definitiva (SILVA, 1998, p. 40).

No código havia previsão de medidas de segurança classificando os autores de crimes como imputáveis e inimputáveis, dando início ao sistema do duplo binário:

[...] o que se vê, é uma nítida diferenciação entre os autores de crimes que são responsáveis dos irresponsáveis. Surgindo o sistema do duplo binário, ou seja, a aplicação ao delinquente irresponsável das penas normalmente aplicáveis à espécie delituosa e, ainda, medida de segurança. Vale dizer: o Código de 1940 impunha a aplicação conjunta da pena e da medida de segurança (SILVA, 1998, p. 46).

A respeito do Código, atestam Zaffaroni e Pierangeli (2008) que,

É um código rigoroso, rígido, autoritário no seu cunho ideológico, impregnado de “medidas de segurança” pós-delituosas, que operavam através do sistema do “duplo binário”, ou da “dupla via”. Através desse sistema de “medidas” e da supressão de toda norma reguladora da pena no concurso real, chegava-se a burlar, dessa forma, a proibição constitucional da pena perpétua. Seu texto corresponde a um “tecnicismo jurídico” autoritário que com a combinação de penas retributivas e medidas de segurança indeterminadas (própria do Código Rocco), desemboca numa clara deterioração da segurança jurídica e converte-se num instrumento de neutralização de “indesejáveis”, pela simples deterioração provocada pela institucionalização demasiadamente prolongada (Zaffaroni; PIERANGELI, 2008, p.194).

Embora promulgado durante a tirania do regime autoritário, o Código de 1940 está vigente hodiernamente. Apesar de ter sofrido algumas modificações, como se verá adiante, o processo histórico em que foi elaborado difere do atual. Se para a época em que foi publicado podemos considerá-lo impróprio, uma vez que incitava o uso político do aprisionamento, como meio de controle social, em virtude de sua eficácia neutralizadora sobre os indivíduos que representavam ameaça para o governo (Zaffaroni; PIERANGELI, 2008, p. 195), doravante, a persistência desse pensamento só agravou as condições do sistema penitenciário brasileiro. Fato que é recorrente ao analisarmos a história do Brasil.

Com o golpe militar em 1964, a Ditadura Militar era representada por um Estado impetuoso, marcado pela repressão e desamparo da parcela mais frágil da população. No entanto não foi alterada de imediato a legislação penal, somente em 1969 a junta Militar decretou um novo Código Penal, “que possuía modificações tecnocráticas do Código de 1940. Mas mantinha as penas extraordinariamente graves e as medidas de segurança com uma moldura autoritária idealista” (Zaffaroni; PIERANGELI, 2008, p. 195).

Foi nesse período que se difundiu o Regime Disciplinar Diferenciado, que consistia em manter uma cela de segurança para os presos “perigosos”, isto é, para os que contestavam o regime (Roig, 2005, p. 157). Porém, após vacância de quase dez anos o Código foi revogado pela Lei número 6.578, de 11 de novembro de 1978, por não mais corresponder à realidade (Zaffaroni; PIERANGELI, 2008, p. 195).

A Lei 7.209, de 11 de junho de 1984, introduziu uma reforma que trouxe significantes alterações na parte geral do Código Penal e na pena de prisão. As principais mudanças foram a extinção da medida de segurança para os imputáveis, o réu poderia ser condenado no máximo a trinta anos de prisão, considerou como penas privativas de liberdade a reclusão e a detenção etc. (Zaffaroni; PIERANGELI, 2008, p. 196).

De acordo com Zaffaroni e Pierangeli (2008):

O texto que compõe a nova parte geral constitui uma verdadeira reforma penal e supera amplamente o conteúdo tecnocrático da frustrada tentativa de reforma de 1969, posto que apresenta uma nova linha de política criminal, muito mais de conformidade com os Direitos Humanos. De uma maneira geral, o neo-idealismo autoritário desaparece do texto, apresentando apenas uma isolada amostragem de neo-hegelianismo, ao cuidar da imputabilidade diminuída. Retorna-se um direito penal de culpabilidade ao erradicar as medidas de segurança do Código Rocco e ao diminuir, consideravelmente, os efeitos da reincidência. Ainda que sem apresentar alguma fórmula expressa para o concurso real, certo é que, ao menos através de uma forma expressa, elimina a possibilidade de perpetuação da pena, ao estabelecer o limite máximo de 30 anos (Zaffaroni; PIERANGELI, 2008, p. 196).

Outro marco importante na história das prisões brasileiras foi a Lei de Execução Penal (Lei número 7.210, de 1984) que regulou e regula a disciplina carcerária. Acerca do instrumento normativo afirma Roig (2005) que:

Tal diploma, não obstante os inegáveis progressos trazidos, tais como a posição do princípio da legalidade em sede executiva, ainda se encontra influenciado pelo modelo neodefensivista social, consagrando a ressocialização do condenado como objetivo anunciado da pena, reincorporando a noção de periculosidade do agente e primando pela ideia de “tratamento de delinquente.”

No entanto, a mais sentida deficiência da normatização penitenciária contemporânea reside, salvo melhor juízo, na carência de comando legais capazes de eficazmente tolher o enorme discricionarismo administrativo com o qual nos deparamos. É absolutamente imperioso percebermos que a estratégia de controle disciplinar carcerária passa necessariamente pela supressão da intimidade, do autodiscernimento e da confiança do preso no sistema legal de garantias. Tal confiança é rapidamente eliminada quando o indivíduo constata que a efetividade de seus direitos elementares depende do exclusivo alvedrio da autoridade custodiante, e não da potestade do comando normativo, muito distante da realidade da cadeia. Com isso, garantias legais se transformam, quase que por milagre, em benesses da impune e soberana autoridade penitenciária, reforçando os convenientes laços da submissão (ROIG, 2005, p. 138).

A Lei de Execução Penal é um meio de controle das condutas carcerárias, com o suposto objetivo de proporcionar a “reintegração” social do condenado, resguardando um acervo de direitos sem aplicabilidade, desse modo delegou aos órgãos da execução penal julgar o comportamento dos presidiários, para tanto dispôs de uma série de procedimentos, tendo em vista a organização nos presídios (ROIG, 2005, p. 138).

A verdade é que o Brasil desenvolve suas políticas penais de exclusão há muito tempo. Julgar a pena de prisão como necessária e adequada é uma meio de esconder a sua verdadeira finalidade a de neutralizar a classe que incomoda o governo. O sistema prisional além conjugar problemas relativos com a falta infraestrutura e o aumento significante do número de presos, é uma medida que gera violência institucional (ROIG, 2005, p. 174). A prisão é visada como melhor remédio de conter o indivíduo, pois tirar sua liberdade e justificar essa ação com a promessa de melhorar o “defeituoso” e fazê-lo ser útil novamente, parece convencer a sociedade, que fica alheia a realidade do sistema carcerário. O problema da prisão não é somente sua estrutura frágil ou sua falta de assistência, pois a única medida adotada é criar mais vagas, e sim o fato do encarceramento ser utilizado de forma ilimitada e estar focado nos efeitos e não nas causas da criminalidade (ROIG, 2005, p. 174-175).

6. CONCLUSÃO

Diante da pesquisa realizada, podemos concluir sobre a história da pena de prisão que a ideia de privar o indivíduo da liberdade “amadureceu” com o tempo.

A pena de prisão está presente na história da humanidade desde a Idade Antiga. Por óbvio não existia nos moldes atuais, mas a prática de tirar a liberdade de quem agisse em desconformidade com as condutas estabelecidas já se apresentava de forma implícita, uma vez que a prisão servia como custódia.

Foi no Direito Canônico que a percepção da prisão como pena ficou mais palpável, visto que as prisões eclesiásticas eram utilizadas como meio de arrependimento do indivíduo. Esse momento histórico foi o responsável por disseminar uma das principais características da pena, qual seja a imposição de um sofrimento para os que praticassem o que era considerado mal.

Com o fim do feudalismo o comércio desenvolveu-se, ensejando o reaparecimento das cidades em companhia da formação de massas camponesas desempregadas, que provocou o empobrecimento dos camponeses expropriados convertidos em mendigos e “vagabundos”. Diante desses fatores, como meio de controle social a pena de morte foi utilizada em larga escala para conter a crescente criminalidade, gerada pela falta de assistência básica experimentada pela classe menos favorecida.

No absolutismo, a aplicação da pena passou a ser um espetáculo, utilizada para confirmar o poder do monarca. Nesse período, destacou-se o suplício, que tinha a finalidade de fazer sofrer o condenado.

Ao passo que ocorria transformações sociais o absolutismo enfraqueceu. Surgiu o mercantilismo, que gerou uma modificação na forma de aplicar a pena privativa de liberdade, o foco desse movimento foi disciplinar os ociosos para explorar sua mão-de-obra. Para tanto foram criadas casas de trabalho e correção primeiramente na Inglaterra e na Holanda, onde o capitalismo já havia se desenvolvido e depois se espalhou pelo mundo.

Nesse ínterim, surgiu o Iluminismo, que supostamente colocaria um basta nas arbitrariedades do Estado, o movimento pregava o humanismo, lutando por cárceres mais dignos e defendendo o caráter “ressocializador” da prisão. Desse modo, garantiu a confirmação da pena privativa de liberdade como meio adequado para resolver os problemas sociais.

Por meio da consolidação da pena de prisão surgiram os sistemas penitenciários, criados para regulamentar a sua execução. Novamente, a privação da liberdade estava embasada em um discurso humanitário e sua aplicação era justificada pelo seu suposto objetivo “ressocializador”, mas que na verdade ainda cumpria o papel de explorar o trabalho do condenado e depois, quando não era mais útil ao capitalismo, o de neutralizá-lo.

Foi nesses parâmetros que o Brasil adotou a pena de prisão. Da mesma forma que as demais experiências internacionais, em nosso país a pena privativa de liberdade foi considerada um importante instrumento para manter o controle social.

Os objetivos propagandeados por quem defendia sua aplicação não divergiam das justificativas apadrinhadas pelo Iluminismo. Não obstante, era a melhor solução para manter os indesejáveis afastados dos olhos da sociedade e servir de escora para a promoção do discurso político em época de eleição, o que persiste até a presente data.

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Quem eram os povos bárbaros e por que eram chamados assim?

Os bárbaros eram, na ótica grega, todos os povos que não falavam o idioma grego e nem compartilhavam da mesma cultura e modo de organização da sociedade grega. O termo foi assimilado pelos romanos e tornou-se um sinônimo para referir-se aos povos estrangeiros de forma estereotipada.

O que foram os bárbaros?

Entenda quem foram os bárbaros Eram chamados de bárbaros grupos de pessoas que tinham, além do idioma, outras diferenças em relação aos gregos. Eram povos com cultura, crenças religiosas e até formas de se vestir diferentes, também não tinham o mesmo tipo de governo, de educação e até de engenharia.

O que explica as invasões bárbaras?

A desordem política e a disseminação do cristianismo foram dois fatores que, somados às Invasões Bárbaras, foram responsáveis pela crise do Império Romano. Esse processo de ocupação foi realizado pelos bárbaros, povos que eram assim chamados pelos romanos por viverem fora dos territórios do Império e não falarem latim.

O que foi a invasão dos bárbaros Brainly?

invasões barbaras foram responsáveis pela crise do Império Romano. Esse processo de ocupação foi realizado pelos barbáros, povos que eram assim chamados pelos romanos por viverem fora dos territórios do império e não falavam latim espero ter ajudado !!