Quando se fala em problemática atual das comunidades indígenas, não se
pode dizer que nasceram na atualidade, mas sim que são resquícios de
problemas que nasceram ainda na colonização, nos primeiros séculos do “descobrimento” do Brasil.
Os principais problemas que as comunidades indígenas enfrentam hoje são a
consequência daqueles que surgiram há anos. Nos dias atuais há
problemas como a miséria, o alcoolismo, o suicídio, a violência
interpessoal, que afetam consideravelmente essa população.
Além do processo de colonização, conforme Eliane Potiguara, houve no
Brasil o processo de Neocolonização, que foi o período em que o interior
do Brasil passou a ser ocupado, acabando de inúmeras formas com as
comunidades indígenas, período este que foi até em meados do século XX.
Assim, houve intromissão de inúmeros segmentos, como as madeireiras, os
garimpeiros, latifundiários, mineradoras, hidrelétricas, rodovias, entre
outros. De acordo com a autora, esta intromissão “causou nas últimas
décadas o desmatamento, o assoreamento de rios, a poluição ambiental e a
diminuição da diversidade local, trazendo as enfermidades, a fome e o
empobrecimento compulsório da população indígena.”
Vamos ver a seguir os problemas que estes povos
enfrentam, com enfoque na questão fundiária e na relação do índio com a
natureza.
Degradação do meio ambiente e a relação com os problemas das comunidades indígenas
O século XX foi marcado pela industrialização global, porém as
industrializações foram feitas de forma desenfreada, com o intuito de
lucro imediato, sem pensar em proteger o meio ambiente, posto que
ainda não havia a conscientização ambiental.
Além dos fatores de degradação ambiental que ocorria em todo o mundo
gerados pelo desenvolvimento econômico e industrial das grandes cidades,
o interior do Brasil, que ainda tinha suas florestas nativas intactas,
passou a ser povoado a fim de iniciar o processo de plantio e
agropecuária das regiões Norte, Centro Oeste, Sul e Sudeste do País,
sendo que as comunidades indígenas que ainda não tinham sido
“descobertas” passaram a ser desbravadas neste processo de
Neocolonização.
A partir de então, as aldeias passaram a ter seu espaço reduzido e os
problemas aumentaram.
A Amazônia, como explica Leonardo Boff, principalmente durante o Regime
Militar, entre as décadas de 70 e 80, passou a ser povoada, por conta do
lema “terra sem homens para homens sem terra”. Entretanto, este
povoamento foi realizado sem nenhum controle ambiental. Hidrelétricas,
rodovias e a agropecuária passaram a ser desenvolvidas, desmatando as
florestas e matando indígenas.
Da mesma forma, Paulo de Bessa Antunes explica que:
Os graves problemas fundiários existentes no Brasil, igualmente, não
podem ser solucionados sem que se resolvam os problemas relativos às
terras indígenas. Assim, a expansão da fronteira
agrícola verificada na década de 70 do século XX e a construção de
diversas rodovias, tais como a Transamazônica, implicaram o deslocamento
de inúmeros povos indígenas das terras que tradicionalmente ocupavam, ou
mesmo a invasão das terras indígenas por colonos originários das mais
diferentes regiões do país.
Não eram somente os indígenas da Amazônia que sentiam os problemas
gerados pela degradação do meio ambiente. Eles eram sentidos em todo o
território nacional, devido à exploração das matas nativas, da
construção de hidrelétricas e da construção de rodovias, que serão
estudados a seguir.
Construção de rodovias e hidrelétricas
O período que antecedeu a criação do SPI, até meados do século XX,
continuou sendo de bruto massacre contra os indígenas . No entanto,
estes massacres eram em decorrência do desenvolvimento do país, das
construções de hidrelétricas e rodovias, bem como do avanço da
agropecuária.
O antropólogo Sílvio Coelho dos Santos relata alguns destes fatos, como a construção da estrada de ferro noroeste do Brasil, em São Paulo, em
que a população indígena da etnia Kaingang foi praticamente dizimada.
Nesse local, os trabalhadores “brincavam de passarinhar” índios, ou
seja, matavam os índios da mesma forma em que se caçavam pássaros.
Da mesma forma, o antropólogo relata fatos ocorridos nas construções de
hidrelétricas, como no caso dos indígenas da reserva de Ibirama,
localizada no Vale do Itajaí em Santa Catarina, em que a construção da
usina ocasionou diversos problemas à comunidade indígena, pelo
fato de terem sido inundadas suas terras e não ter sido feito nenhum
projeto preventivo para eles.
Silvio Coelho dos Santos explica:
“Logo que aconteceram as primeiras enchentes, os Índios de Ibirama
tiveram prejuízos concretos. Roças foram inundadas; casas destruídas;
currais e depósitos carregados pelas águas; animais mortos. As
reclamações começaram a ser feitas, as primeiras indenizações dos
prejuízos causados começaram a se concretizar. Entretanto, nenhum
trabalho esclarecedor procedeu essa entrega de recursos. Resultado: em
poucos meses os indígenas haviam repassado os ganhos da indenização para
o comércio de Ibirama.(…) Em decorrência da falta de planejamento e
da inépcia administrativa, a população indígena de Ibirama abandonou
quase que totalmente as práticas agrícolas e a pequena criação. A
depredação de recursos florestais é enorme.”
O empreendimento acarretou em inúmeros problemas para a
população indígena de Ibirama, tendo em vista que eles perderam parte de
sua terra produtiva, perdendo então sua subsistência, necessitando do
comércio local para sobreviver. Não tendo eles conhecimento
sobre o dinheiro, acabaram perdendo em poucos meses todo o dinheiro
recebido na indenização em compra de alimentos. Além deste fato, como o
local era rico em biodiversidade, diversos madeireiros da região
passaram a agredi-lo, gerando grande devastação da área, sendo que o
lucro que os madeireiros receberam muitas vezes não era repassado aos
indígenas e, quando o era, o valor era irrisório.
O fato ocorreu no início da década de 80. Todavia, as consequências
ainda são vistas na atualidade. Os indígenas vivem na
miserabilidade, necessitando de políticas públicas assistencialistas
para a sobrevivência, ocasionando, assim, outras consequências, como o
alcoolismo e a prática de delitos.
Caso parecido com esse ocorreu em 2002, na construção da hidrelétrica
na cidade de Minaçu, em Goiás, onde parte das terras dos índios da etnia
Avá-Canoeiro foi inundada e “as áreas utilizadas pela tribo para
cultivo, assim como a vegetação, cachoeiras e outras barreiras naturais,
ficaram submersas”.
Em relação às rodovias, uma das mais dramáticas histórias foi a da
rodovia que liga a cidade de Cuiabá, capital do estado do Mato Grosso, à
cidade de Santarém, no estado do Pará, a BR-163, conhecida como rodovia
Transamazônica, uma das mais extensas do país. Ela foi construída
durante o Regime Militar.
Como conta o Coronel Severo em
reportagem feita pelo Jornal Nacional, durante o período da construção
os caminhões traziam a mensagem “integrar para não entregar a Amazônia”.
Isto porque, naquela região, viviam índios Panarás, que nunca tinham
sido contatados. Desta forma, acreditava-se que era necessário
integrá-los à Comunhão Nacional para que o Brasil não perdesse a
Floresta Amazônica. Graças ao trabalho dos irmãos Villas Bôas,
durante os contatos não houve conflitos, mas por conta das doenças que
os homens brancos transmitiram aos indígenas, mais precisamente o
sarampo, dois anos depois havia somente 82 índios Panarás naquela
região.
Além dos problemas causados durante a construção das rodovias, hoje o
principal problema é a questão de haver estradas que “cortam” as
aldeias, trazendo diversos problemas dos “não índios” para dentro da
comunidade, além de haver vários atropelamentos dentro das aldeias.
Conclui-se então que o desenvolvimento do país com a construção de
hidrelétricas e de rodovias gerou diversos problemas às comunidades
indígenas.
Intensificação da Agropecuária
Também durante o Regime Militar, na fase do “progresso” do Brasil, as
regiões aldeadas por índios passaram a ser povoadas por fazendeiros, a
fim de intensificar a agropecuária.
O sociólogo Octavio Ianni analisa, em sua obra “Ditadura e Agricultura”, o
desenvolvimento do País durante este período e os prejuízos causados na
Floresta Amazônica no período de expansão capitalista, bem como os
prejuízos causados às Comunidades Indígenas neste período na região
amazônica.
As terras tribais eram praticamente todas as terras da região. Depois,
pouco a pouco, ou com rápida violência, os indígenas foram sendo
rechaçados de suas terras. A catequese, a evangelização, o extrativismo,
a pecuária, a agricultura sob as mais diferentes formas, estenderam a
sociedade e a comunhão nacionais pelas terras, comunidades e culturas
indígenas.
Assim como Octavio Ianni, Leonardo Boff também faz críticas ao processo
de intensificação da agropecuária na Amazônia durante o regime militar,
em que conclui que “as maiores vítimas da penetração de relação de
exploração das riquezas da Amazônia foram, entretanto, os indígenas”.
Assim como ocorreu durante o regime militar nas comunidades indígenas da
Amazônia, Friedl Paz Grünberg explica que no Estado do Mato Grosso do
Sul, com os indígenas Guaranis, ocorreu o mesmo. Várias aldeias guaranis
foram, com o tempo, perdendo espaço para os grandes latifundiários:
As atividades de desmatamento começaram a ser executadas de forma cada
vez mais intensa nos anos 70 e 80 do século passado. O comércio de
madeira foi a atividade mais importante, o grande negócio que hoje
latifundiários e madeireiros desejariam possuir. Com exceção de plantios
de milho e de soja, hoje em dia nesta região predomina a criação de
gado bovino. Para isso foram semeadas, nas áreas desmatadas, os capins
africanos do gênero brachiária para pasto, que é extremamente agressivo e
se espalha facilmente sobre cada pedacinho livre de terra, e que se
espalhou, também, sobre a superfície de cultivo dos Guarani.
Este fato demonstra que a pecuária também prejudicou as comunidades
indígenas, tendo em vista que os pastos atingiram o cultivo dos
indígenas, como explicado pelo citado autor.
Indígena em relação harmoniosa com a natureza
Dos estudos de que se têm notícia, colhe-se o ensinamento de que o indígena
sempre teve uma relação harmoniosa com a natureza, como já explicado
por Rousseau e Luiz Donizete Grupioni. Nesse mesmo sentido, a consultora
da Universidade Pedagógica Nacional do México, Maritza Gómez Muñoz, que
conviveu com indígenas dos Altos Chiapas, concluiu que o indígena
valoriza o saber comunitário e a natureza, a chamada “mãe terra”. Em um
de seus estudos, aliados à análise antropológica e à convivência junto
aos Maya-Tzeltal, relata que:
No cultivo, o homem os faz irmãos. O milharal representa o espaço
potencial da nutrição; no cultivo estão implícitos os saberes do
alimento da memória ancestral. Os saberes que surgem dessa convivência
cotidiana referem-se não só ao cultivo; vai sendo estruturada uma noção
de si mesmo originada na tarefa e nas atividades e disposições
requeridas para a aprendizagem do saber cultivar. Entre os diversos
traços e emoções implicados no desempenho está um longo tempo dedicado
ao silêncio e ao sofrimento. A existência fica impregnada de ‘força
vital’ através do cultivo como saber sagrado. Para saber cultivar, é
necessário o respeito à ‘mãe terra’ e o cuidado.
Seu relato explicita quão importante é a terra para o indígena. E
justamente por adorarem a terra, a protegem, uma vez que estes povos
contam, na prática, somente com os recursos ambientais bióticos e
abióticos para realizar suas necessidades de subsistência. Sua cultura,
com relação às atividades agrícolas, por exemplo, não está voltada para o
consumo de bens de mercado, como adubos ou implementos agrícolas. Por
conseguinte, não faz parte dos costumes e hábitos indígenas esse tipo de
relação com o mercado, pois vivem uma realidade própria, diversa da do
homem ocidental comum.
Os indígenas, assim como as ditas comunidades tradicionais, respeitam o
meio ambiente, visto que ele é o meio de vida deles. Sua sobrevivência é
diretamente dependente da conservação da natureza. Em reportagem
realizada por Anthony Anderson e Darrell Posey, em 1987, publicada na revista
“Ciência Hoje”, foi abordada pesquisa sobre o reflorestamento feito por
índios Kayapós, no sul do Pará. Desta pesquisa, concluiu-se que é possível cultivar a terra sem prejuízo do ecossistema, pelo recurso e
técnicas de manejo que, ao contrário das usualmente empregada por nós,
respeitam as características básicas das áreas manejadas e fomentam a
diversidade que lhes é própria.
Essa pesquisa mais uma vez demonstra o conhecimento que essas populações
têm ao manejar o meio ambiente, manejo este que não compromete o
ecossistema e acaba beneficiando o solo.
Conforme os estudos de Leonardo Boff acerca a Floresta Amazônica, as
comunidades indígenas desenvolveram grande manejo de floresta, todavia
respeitando a singularidade de cada espécie, não destruindo a natureza.
Conclui que “ser humano e floresta evoluíram juntos numa profunda
reciprocidade” , ficando demonstrado o respeito do indígena para com
a natureza.
Nestes termos, Paulo de Bessa Antunes ressalta que:
Outro aspecto extremamente importante a ser observado é o da íntima
relação entre os povos indígenas e a preservação do meio ambiente e a
ecologia. Os povos indígenas são, dentre todos, aqueles cujas formas de
vida guardam maior proximidade com a natureza e o meio ambiente. A
preservação do meio ambiente é uma condição fundamental para a
reprodução da vida, nos moldes tradicionais, nas comunidades indígenas.
Há que se considerar então que existe relação de respeito entre o índio e
a natureza, podendo-se afirmar que o índio, para sua sobrevivência,
dentro dos métodos tradicionais, não agride o meio ambiente, como faz o
homem que vive na sociedade hegemônica.
Privação do uso da Terra
Como estudado, a terra para o indígena é o seu meio de sobrevivência.
Sem ela não há vida.
Conforme estudo acerca da situação dos índios da etnia Guarani, do Mato
Grosso do Sul, realizada por Friedl Paz Grünberg, conclui-se que a
principal fonte das problemáticas destes índios é a perda da terra, das
florestas:
O
prejuízo advindo da perda da floresta vai muito além do componente
econômico. Para os Guarani a floresta com seus campos naturais era “tudo
o que contava”, era tudo o que conheciam do mundo, era o seu mundo.
Domesticar a floresta com seus perigos era a oportunidade que tinham os
homens para desenvolver sua personalidade e para obter prestígio. A
comunicação vital com os animais e com os espíritos da floresta
permitia-lhes desenvolver sua rica vida espiritual. Tudo isto está
irremediavelmente perdido, pois com a perda da floresta também se
perderam, quase ao mesmo tempo, os saberes a ela relacionados e a prática
da convivência vital com as plantas e os animais.
Hoje há diversos problemas de ordem social ocasionados pela
falta de terra, acarretando em falta de produtividade. Além da falta de
terra, muitas aldeias estão em áreas em que não há solo fértil, tampouco
caça e pesca, ou então, estão em áreas que não podem ser cultivadas,
como era o caso da Aldeia Araçá-Í, localizada no município de Piraquara,
Região Metropolitana de Curitiba, tendo em vista que ela está inserida
em área de preservação ambiental da SANEPAR (Companhia de Saneamento do
Paraná), não podendo ser mantida agricultura neste local. Por isso, desde o ano de 2000, data em que passaram a viver neste local, recebem
cestas básicas do governo.
No entanto, no caso da Aldeia Araçá-Í, o Ministério Público do Estado do
Paraná realizou Termo de Ajustamento de Conduta com a SANEPAR
garantindo um espaço para que a população desta aldeia possa cultivar
alimentos para subsistência.
Ocorre que, em outros casos, esta forma de solução não foi tomada, tendo
os indígenas como única forma de subsistência a arrecadação de cestas
básicas de entidades governamentais e não governamentais.
Políticas assistencialistas
Como forma de diminuir as desigualdades sociais entre os “homens
brancos” e os indígenas, o País adotou a política assistencialista. O Estado fornece suprimentos aos indígenas, como
doação de cestas básicas, sem se preocupar com a autossustentabilidade do
indígena, o que prejudica a qualidade de vida destes povos.
Marcos
Terena, indígena e coordenador de defesa dos direitos indígenas da ONU,
enfatiza que a falta de terras faz com que o índio produza menos,
fazendo com que dependa do Estado e conclui que: “essa política
assistencialista, de doação de cestas básicas, adotada por alguns
governos, não melhora a qualidade de vida e sim aumenta a dependência. Além disso, colabora para que estas injustiças se perpetuem.”
Verifica-se que a maioria das aldeias não são autossuficientes,
necessitando então de políticas públicas assistencialistas para a
sobrevivência.
Alcoolismo
O alcoolismo entre os indígenas tem sido um dos principais problemas das
comunidades indígenas. Em projeto desenvolvido pela FUNASA nas aldeias
Ocoy, Mangueirinha, Rio das Cobras, Araçá-Í, São Jerônimo da Serra e
Apucaraninha, do Estado do Paraná, constatou-se que o alcoolismo é uma
“questão social, uma vez que ele é gerado pela ociosidade, falta de
inserção no mercado de trabalho, falta de perspectivas e fácil acesso à
bebida”. (Informação Verbal) .
Os índios, conforme suas tradições, sempre tiveram contato com a bebida
alcoólica fermentada, produzida por eles mesmos em rituais típicos. Um
exemplo é a bebida típica dos indígenas da etnia Kaingang, o Kiki, que é
produzida de forma fermentada, à base de milho e mel.
Entretanto, com a colonização, foram introduzidos alambiques nas
aldeias, fazendo com que o índio passasse a consumir bebida destilada.
Para Henrique Carneiro, a bebida destilada foi mais uma das formas de
dizimação da cultura das comunidades indígenas no período colonial.
Em estudo realizado pela psicóloga da Fundação Nacional da Saúde, órgão
responsável pela saúde indígena, conclui-se que, a princípio, as bebidas
fermentadas “não provocavam transtornos de ordem física ou biológica,
como acontece agora com as bebidas destiladas”.
Então, a bebida alcoólica é mais um dos problemas da sociedade “não
índia” que atingiram o indígena. Em consequência do uso do álcool, diversos
outros problemas são acarretados, como explica Camila Borges:
O consumo de álcool aparece com frequência no quadro de morbidade
ambulatorial. Tem sido identificado como principal coadjuvante nas
causas de mortalidade por fatores externos (acidentes, quedas,
agressões, etc). Doenças como cirrose, diabetes, pressão arterial,
doenças do coração, estresse e depressão também são identificadas como
comorbidades ligadas ao consumo abusivo de bebidas alcoólicas.
O problema do alcoolismo está presente em diversas aldeias do Brasil e,
além dos problemas citados acima, desencadeia outros, como o
cometimento de crimes e a desnutrição. Isso porque muitas vezes os
indígenas acabam trocando alimentos recebidos pelo governo por bebidas
alcoólicas, em vez de utilizarem os alimentos para a sua subsistência e
de sua família.
Em relação à prática de delitos, o indígena fica mais suscetível ao
cometimento de crimes quando há influência de álcool. Em pesquisa acerca
da situação dos detentos indígenas no Estado do Mato Grosso do Sul,
constatou-se que dos processos criminais em trâmite, envolvendo autores
indígenas, em 21% o autor estava sob influência de álcool; 1% a vítima
estava alcoolizada; e 36% autor e vítima estavam alcoolizados, sendo que
somente 42% não havia evidência de álcool.
Essa pesquisa demonstra que o álcool, além de causar doenças e
interferir na cultura, acaba influenciando na prática de delitos.
Suicídio
Infelizmente, o suicídio tem sido uma prática comum entre os indígenas,
principalmente entre a etnia Guarani, visto que eles sempre tiveram como
ideário de vida a liberdade, as terras e os cultivos. Além disso, os
“não índios” têm intervindo há centenas de anos na cultura e na crença
destes povos, o que causa perda de referências e
desestruturação da sociedade indígena.
Émile Durkheim aponta quatro definições de suicídio dentro do aspecto
sociológico, quais sejam, egoísta, altruísta, fatalista e anômico. Este
último é característico dos suicídios ocorridos nas sociedades
indígenas, uma vez que esta forma de suicídio é aquela em que um grupo
social perde sua identidade e as pessoas inseridas neste meio acabam
cometendo este ato.
Tatiana Azambuja Ujacow Martins, em sua pesquisa na aldeia Bororó, no
município de Dourados, Mato Grosso do Sul, explicita que:
Observa-se que as causas de suicídio, na maioria das vezes, são
atribuídas à bebida, às drogas, ao feitiço, a fatores sobrenaturais ou à
desesperança. Porém, esses fatores estão intrinsecamente ligados à
morte da cultura indígena. Toda a interferência do não índio na vida do
índio resultou em um etnocídio. Hoje, o índio não se percebe mais, não
sabe mais quem ele é. Nota-se, também, que a bebida serviria como fator
encorajador do suicídio. Percebe-se que os índios vivem uma crise de
identidade e autoimagem, o que leva a pensar que, quando se suicidam,
não estão matando eles mesmos, porque não existe mais eu. O ego cultural
se foi, junto com seus rios e com suas matas.
Em pesquisa realizada por Cleane S. de Oliveira e Francisco Lotufo Neto,
acerca das estatísticas de suicídio em povos tradicionais, conclui-se
que, entre todas as comunidades tradicionais, o maior índice está entre
os indígenas.
Esse estudo revela, então, que os problemas que as comunidades indígenas
enfrentam atualmente estão todos interligados. Os principais causadores
são as interferências do “não índio” na cultura indígena, assim como a
falta de terras e de produtividade. Estes problemas, muitas vezes,
acarretam o alcoolismo que, por sua vez, impulsiona o suicídio.
Desnutrição
A desnutrição é uma das principais causas de óbito de crianças
indígenas, sendo que no ano de 2007 foi criada uma Comissão Parlamentar
de Inquérito (CPI) para investigar a causa da desnutrição. De acordo com
o Programa do Governo Federal Fome Zero, em 2000 a incidência de
desnutrição era de 74,6 casos para cada 1000 índios, enquanto que em
2007 este número foi reduzido para 46,7.
A maioria dos casos de desnutrição está diretamente ligada ao
alcoolismo, visto que muitos indígenas trocam alimentos por bebidas,
deixando de alimentar para beber, ou então, os pais, por serem
alcoolistas, não dão atendimento necessário aos filhos, deixando-os em
estado de desnutrição, como explica Camila Borges: “sabe-se também que
várias crianças apresentam patologias ligadas à situação dos pais
alcoolistas, como a desnutrição”.
Um Relatório de Violência contra os povos indígenas dos anos de 2003 a
2005, elaborado pelo Conselho Indigenista Missionário (CIMI), constatou
que o falecimento de crianças por desnutrição da etnia Guarani-Kaiowá,
no Estado do Mato Grosso do Sul, estão diretamente ligadas à situação
atual da comunidade, como a escassez de terra para plantar e alto índice
de desemprego e de alcoolismo.
Fica demonstrado que os problemas atuais das comunidades indígenas
estão todos interligados, sendo que todos são consequência do descaso do
governo para com os índios durante centenas de anos e hoje sofrem por
não terem terras e não poderem mais produzir alimentos como antigamente.
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