Qual a relação de Geografia com as outras ciências?

INTRODUÇÃO

Num momento em que uma série de proposições, questionamentos e impasses (frutos estes, é possível, de certo mal-entendido; ou manifestando, quem sabe, o ressurgimento de pré-juízos bastante equivocados) põem o ensino da Geografia numa pauta de discussão movida a aflições, nos parece prudente reassentar alguns fatos dentro de um quadro mais equilibrado [1]. Em outras palavras, nos parece sensato recuperar alguma das discussões tradicionais que compõem, historicamente, a filosofia da ciência geográfica – sendo que no preciso intuito de coloca-las a serviço de uma reflexão voltada para uma possível requalificação do ensino escolar desta que entendemos ser uma disciplina de ainda importantes aportes à formação intelectual de nossos jovens.

É antiga a preocupação dos acadêmicos que pensam filosoficamente sobre a natureza e os métodos da Geografia, em diagnosticar as origens de seu caráter híbrido (MARTONNE, 1913; VALLAUX, 1929; RECLUS, 1930; HARTSHORNE, 1951; DARDEL, 2015 [1952]; ACKERMAN, 1967). Nem tão longevas ou marcantes, porém, parecem ser as medidas por parte daqueles que pensam especialmente o ensino da disciplina em propor conciliações (GOPSILL, 1966; MAUDE, 1991; HAWLEY, 1997). E nos figura, neste momento, como imprescindível reinvestir esforço intelectual para retomar o problema. Pois que num contexto em que se aventam reformas profundas nos programas escolares, vieram à discussão hipóteses muitas (algumas razoáveis; outras, fruto talvez de certa sedução por teorias complotistas), tais como a possibilidade de diluir os saberes geográficos numa suposta disciplina de “Ciências Sociais” – hipótese esta que, em se verificando, de fato amputaria de vez a genuína identidade dúplice da Geografia: ser um campo para o qual confluem saberes sobre o natural e o social.

Nosso pressuposto aqui é o de que, além de ser possível conciliar as tradições de conhecimento naturalista e culturalista (a partir do tratamento didático de certos temas propensos a abordagens híbridas), é urgente problematizarmos aquela virtual possibilidade de “redução” do escopo da ciência geográfica. Defendemos, aliás, que na eventualidade de uma ampla reforma dos programas escolares brasileiros, o mais sensato seria consagrar à Geografia, justamente, o papel de ponto de convergência das demais disciplinas – conjecturando que ela poderia, por exemplo, constituir-se o pivô dentro de uma ampla família de “Ciências Socioambientais”.

A Geografia como campo científico estabelecido no rol do conhecimento acadêmico, possui particularidades no que concerne ao seu fundamento epistêmico-discursivo. O espaço, como categoria agregadora dos estudos geográficos, possui uma identidade dual e, por isso, de não tão fácil ou pacífica resolução metodológica. Quer dizer, nos referimos aqui aos empreendimentos (de poucos sucessos até agora) que poderiam levar a um concerto entre os praticantes da ciência inclinados às questões naturalistas/ambientais e os praticantes, por sua vez, inclinados aos processos de ordem sociocultural ou político-econômica. Daí, historicamente, ter advindo uma diversidade de leituras ou visões permeando uma e outra vertente – tenha sido a confiança no potencial explanatório dos números e modelos fisicalistas; tenham sido as ambições de síntese ou de captação da “totalidade” de fatores e valores que conformam o universo social (BITETI, 2007; DA SILVA, 2010; MARINHO, 2010; MARQUES, 2012).

Isso posto, nos ocorre naturalmente de pensar ser necessário um engendramento de estratégias e metodologias que ao menos operassem uma possibilidade dialógica entre essas tantas vozes discordantes, que têm vindo ora da jurisdição das humanidades, ora das ciências duras. É certo que essa identidade dúplice da Geografia encontra precedentes, origens exteriores; bem como se manifesta ou reaparece em outros quadrantes interiores à própria história da disciplina. Porque se há indícios pretéritos do fato na clássica distinção Erklären versus Verstehen (MAINOR, 2005), também é certo que ele se replica nos tradicionais antagonismos geografia “física” versus “humana” (CLAVAL, 2011) e abordagem “nomotética” versus “ideográfica” (BRANSEN, 2001).

UM ANTECEDENTE ESCLARECEDOR: “EXPLICAÇÃO CAUSAL” OU “ENTENDIMENTO EMPÁTICO”?

Embora um debate mais antigo, o exercício de delimitação sistemática se deve a W. Dilthey (1833-1911), que desejou discernir o campo de ação das “Ciências do Espírito” (como se denominava à época), emancipando-as das ciências naturais: “La razón por la cual ha nacido la costumbre de separar en unidad estas ciencias de las de la naturaleza encuentra sus raíces en las honduras y en la totalidad de la autoconciencia humana” (DILTHEY, 1951, p. 14). Seria preciso, segundo o personagem, um melhor entendimento da consciência e seu estudo.

Pela clássica diferença entre Erklären e Verstehen, os cientistas físicos e humanos observariam de modo distinto os fenômenos que estudam. No campo das humanidades, a predominância da compreensão ou entendimento interpretativo; enquanto a faticidade e causalidade, imperantes no mundo da investigação da matéria, caracterizariam o campo das ciências naturais (buscadoras de leis governantes).

Reside nessa concepção dual a ideia de que, por exemplo, nos experimentos e teorias sobre o mundo físico não interfeririam os crivos moral, subjetivo, social, dos intelectuais que os executam ou as elaboram. Trata-se da afirmação de que “what is crucial to social phenomena such as human actions is that they mean something, which makes them much more similar to mental appearances such as texts than to natural phenomena such as leaf-fall in autumn” (BRANSEN, 2001, p. 3, grifo dos autores).

Crê-se, então, espontaneamente, que nas diferentes áreas dos estudos naturais e mesmo matemáticos, tenderá a haver algum nítido distanciamento dos juízos de valor – aqueles, por sua vez, irresistivelmente feitos por pesquisadores do comportamento humano, em dado momento de seu inquérito investigativo. E, se assim é, parecerá mesmo impossível uma equiparação entre as análises que um possa fazer sobre os mecanismos operantes numa reação química, e outro, sobre as decisões de um sujeito em contexto de coação social, por exemplo. Há, pois (voltando a Dilthey), a necessidade desse olhar mais específico, diante de uma dualidade que a história da ciência ocidental nos demonstrou existir:

El problema fundamental reside, por lo tanto, en fijar un determinado género de incomparabilidad entre las relaciones de los hechos espirituales y las uniformidades de los fenómenos materiales que excluya la acomodación de los primeros, su consideración como propiedades o aspectos de la materia y que, por consiguiente, debe ser algo muy diferente de la diferencia que existe entre los diversos grupos de leyes de la materia tal como los representan la matemática, la física, la química y la fisiología, con una relación de subordinación que se desenvuelve cada vez con mayor consecuencia. Una exclusión de los hechos del espíritu del plexo de la materia, sus propiedades y leyes, supondrá siempre una objeción que se opondrá a los intentos de subordinar las relaciones que se dan entre los hechos de un campo a las relaciones de los hechos del outro. (DILTHEY, 1951, p. 19).

O filósofo da ciência Mario Bunge (1981) também tratou da questão, centrando-se num discernimento metodológico que realça os parâmetros da racionalidade e da objetividade envolvidas na respectiva produção de conhecimento – sendo que:

Por conocimiento racional se entiende: a) que está constituido por conceptos, juicios y raciocinios y no por sensaciones, imágenes, pautas de conducta, etc. [...]; b) que esas ideas pueden combinarse de acuerdo con algún conjunto de reglas lógicas con el fin de producir nuevas ideas (inferencia deductiva) [...]; c) que esas ideas no se amontonan caóticamente o, simplemente, en forma cronológica, sino que se organizan en sistemas de ideas, esto es en conjuntos ordenados de proposiciones (teorías) [...] (BUNGE, 1981, p. 10).

É claro que seria pertinente introduzir no debate a possibilidade (inevitabilidade?) de identificarmos vestígios de uma decisão (teórica, metodológica) moralmente orientada dos praticantes das ciências, em seus respectivos postulados ou estilos de explanação – pensem estes praticantes conseguir aplicar suas técnicas com o devido “distanciamento” do objeto sob inquérito; pensem, ao contrário, ser incontornável uma incursão nas nuances do “fato” em questão.

Gramsci (2001, p. 20) é incisivo com respeito a essa inevitabilidade da infiltração das visões de mundo dos intelectuais em sua produção de conhecimento – e poderíamos aplicar seu diagnóstico aos campos natural e humano: “A relação entre os intelectuais e o mundo da produção não é imediata, como ocorre no caso dos grupos sociais fundamentais, mas é ‘mediatizada’, em diversos graus, por todo o tecido social, pelo conjunto das superestruturas, do qual os intelectuais são precisamente os ‘funcionários’”. Tende a ser profusa, como se vê, a discussão em torno das posturas diferenciais em ciência – se pelo caminho da interpretação compreensiva; se pelo da concepção de princípios legislativos.

UMA VERSÃO PARTICULAR: O “NOMOTÉTICO” E O “IDIOGRÁFICO”

Pode-se dizer que a mesma natureza de argumentação, considerando cindidos linguística e metodologicamente aqueles dois universos do saber, replica-se também noutras modalidades de reflexão epistemológica (insistindo estas numa perspectiva identitária, é claro). Segundo Mainor (2005, p. 53, grifo do autor):

Una de las principales formas discursivas en que se introdujo el dualismo metodológico en el análisis científico de la sociedad consistió en postular una división tajante entre lo nomotético y lo ideográfico [...] las ciencias naturales se basan en criterios universalizadores; es decir, en leyes (de allí el término “nomos”) que son aplicables de manera extensiva a una misma categoría de objetos ónticos; es decir, de fenómenos físicos.

No caso das disciplinas humanas (culturais, sociais, históricas, espirituais), elas seriam fundamentalmente “idiográficas”, posto que, por sua vez, “buscan captar lo individual, lo biográfico y, por ende, lo irrepetible en el acontecer humano” (MAINOR, 2005, p. 53, grifo nosso). Logo, está implícita uma relativa sintonia entre a ideia de ciência do tipo “nomotética” e os campos disciplinares da família Erklären – isso ressoando da concepção de que seria plausível ambicionar um conhecimento mais exato acerca dos fenômenos ali inscritos como objeto; fenômenos cuja natureza parece se ajustar a um governo por leis (law-involving character).

Mas como posto anteriormente, é preciso considerar que, independentemente de se tratar de ciência do regular ou do singular, os posicionamentos e inclinações de seus praticantes raramente não estarão carregadas de intencionalidade – fato que, sem dúvida, complexifica o debate no âmbito externalista. Porque as atitudes destes sujeitos investigadores, se por um lado exprimem um comportamento racional no sentido da correção de contingências (em busca das leis causais), pressupõem também que, para os casos “human phenomena” (quando agora em busca de um empathetic sense), deverá ser aceito que os próprios agentes investigados operam de acordo com o que creem e desejam; agem, portanto, em função do que entendem ser verdadeiro e valoroso (BRANSEN, 2001).

Bunge (1981), apesar de pautar por um modelo de ciência objetiva e racional, está ciente de que sua prática só chegara aos propósitos almejados se determinadas “condições favoráveis” e “circunstâncias sociais” se apresentarem. E podemos detectar aqui um quase paralelismo com a linha de raciocínio que Gramsci traçara: a investigação científica é passível de ser analisada pelo viés de condicionantes que, sendo de natureza “extracientífica”, a definem, limitam ou estimulam.

El arte de formular preguntas y de probar respuestas [...] es cualquier cosa menos un conjunto de recetas. [...] La investigación es una empresa multilateral que requiere el más intenso ejercicio de cada una de las facultades psíquicas, y que exige un concurso de circunstancias sociales favorables; por este motivo, todo testimonio personal, perteneciente a cualquier período, y por parcial que sea, puede echar alguna luz sobre algún aspecto de la investigación. (BUNGE, 1981, p. 40).

O mundo real, com suas limitações e efeitos coativos, leva os intelectuais, mesmo que de forma não plenamente consciente, a tomar decisões sobre estratégias representativas e modos de explanação a respeito do que pretendem investigar. Como Bunge (1981) nos esclarece, as investigações científicas sempre serão “multilaterais” – o que torna irrecorrível a consideração da trajetória de desenvolvimento daquelas posturas decisórias (sobre práticas técnicas, dispositivos experimentais, etc.). Trajetória que, se formos avaliar criteriosamente, assinala a importância de um olhar de questionamento (“filosófico”, então) sobre nossas práticas. Práticas que, mais uma vez, são condicionadas por conjunturas que lhe são favoráveis e das quais extrairemos certos “sentidos” do fazer (ainda que os feitos subsequentes venham a pô-los em xeque).

Não há atividade humana da qual se possa excluir toda intervenção intelectual, não se pode separar o homo faber do homo sapiens. Em suma, todo homem [...] desenvolve uma atividade intelectual qualquer, ou seja, é um “filósofo” [...] possui uma linha consciente de conduta moral, contribui assim para manter ou para modificar uma concepção do mundo, isto é, para suscitar novas maneiras de pensar. (GRAMSCI, 2001, p. 52-53).

Transladando a questão já para o domínio da ciência geográfica e seu ensino, teríamos de averiguar de que forma (e o quanto) ela se rebate em nossas tradicionais ambivalências. Percepção do espaço, explicação do espaço; espaço social, espaço natural; espaço regional, espaço mundial.

PROPOSIÇÕES AO ENSINO DE UMA GEOGRAFIA, CIÊNCIA HÍBRIDA

No desenvolvimento de nosso campo assistimos, reincidentemente, ao “dualismo” apresentado aqui: o de enfatizar ora o natural, ora ou social; a objetivação e a subjetivação. No entanto, estranhamente, o que se constata é a desistência de um diálogo ou intercâmbio que pudesse operar cursos convergentes. E uma vertente assim agregadora não seria o mais razoável para a efetiva prática da Geografia? Por essa razão é que, segundo Koutsopoulos (2011, p. 7), para se chegar a uma perspectiva holística, há ainda um desafiador decurso a ser vencido. E ele, como se presume, é na direção da conjunção de saberes – no expresso desígnio de chegar a uma “interdisciplinary approach and integration”.

Essa hipótese, a nosso juízo, não deve ser mais ignorada; e sobretudo quando se instauram debates acerca do papel e da identidade que a disciplina deve assumir no ensino escolar. Conquanto este fato (de ordem prática) pareça dissociado de uma reflexão epistemológica, pensamos que é justamente o caso de empreendermos um esforço em inquirir nossas capacidades disponíveis. Elas nos habilitam ainda a responder demandas e enfrentar dificuldades inerentes ao mundo contemporâneo (para explicar seu funcionamento e complexidade)? Este é o real desafio posto à nossa frente.

Os professores de Geografia (não menos que os pesquisadores geógrafos) precisam estar melhor esclarecidos sobre os efeitos, tanto problemáticos quanto inspiradores, daquelas ambivalências referidas. Mesmo porque elas nunca deixaram de estar presentes na produção do conhecimento – saberes que em seguida aplicamos, testamos e ensinamos (enquanto chancelados por nossa comunidade). O geógrafo francês Paul Claval (2011, p. 83) sustenta que os praticantes da ciência:

[...] procuram tornar viva sua apresentação de maneira a reter a atenção daqueles aos quais se dirigem [...] para consegui-lo, utilizam todos os meios de expressão disponíveis [...] acompanham seus discursos ou seus textos de cartas, croquis, fotografias, filmes, registros sonoros.

Acontece que, no caso da Geografia, mesmo explorando os variados meios comunicativos disponíveis, pela natureza tão diversificada desta ciência (em termos do espectro de estudos pertinentes), uma gama considerável de variáveis tende a apresentar-se como de relevância potencial ou inquestionável. E eis aí um fato que embaraça qualquer projeto de uma resolução teórico-metodológica para a unidade da disciplina.

Como elemento complicador, e que deve, portanto, merecer nossa atenção em exercícios de vigilância e autocrítica, está a “interferência” (como um fato, mas não necessariamente fatídico) dos posicionamentos que geógrafos e professores veem-se instigados a tomar, em suas rotinas diárias de campo, laboratório, gabinete, sala de aula. Nos contextos particulares em que está em jogo não uma retórica de convencimento de pares (quando, por exemplo, da apresentação de resultados de pesquisa em congressos de área, ou da submissão dos mesmos a pareceristas de periódico), mas sim um discurso para formar jovens, futuros profissionais, a responsabilidade na manobra daquela interferência poderia estar melhor revestida de cuidados?

Cada professor tende a formar uma “escola” própria, tem seus pontos de vista determinados (chamados de “teorias”) sobre determinadas partes de sua ciência, que gostaria de ver defendidos por “seus seguidores ou discípulos”. [...] Por isso, na própria faculdade, existe concorrência entre professores de matérias afins na disputa de alguns jovens que já se tenham distinguido [...] Neste caso, o professor realmente guia o seu aluno; indica-lhe um tema, aconselha-o no desenvolvimento, facilita-lhe as pesquisas, [...] e se apodera dele definitivamente. (GRAMSCI, 2001, p. 59-60).

Essa “situação” acima colocada traz-nos já propriamente o local de ensino; a escola, a universidade – epicentros de direcionamento e tomada de posição. Rumos decisivos cabem ali aos professores; logo, desde ali também é que discursos são (re)transmitidos. Se até há pouco expúnhamos os extremos nos quais a ciência pode se estabelecer e agir (em seu trato com o mundo que quer elucidar), é de se dar agora atenção ao fato de que, para fazer confluírem visões e técnicas heterogêneas, não se deve preterir tal ou qual metodologia. De modo a ter como horizonte uma legítima confluência de olhares, perante um objeto de estudo que é fatalmente miscigenado.

O caminho de encontro dos universos discursivos teria de se dar por um mote de conciliação. E, por esse exato motivo, sem que se sacrifique o fato de que, em se tratando de aspectos mentais (operantes seja no objeto investigado, seja nas elucubrações do investigador), “significado”, “interpretação” são cruciais para conferir sua fidedignidade (BRANSEN, 2001). Apesar de realmente difícil, é preciso evitar ao máximo as unilateralidades. Melhores dinâmicas de ensino e aprendizagem certamente serão as que advierem deste preciso cuidado: não levar nossos alunos a restarem em um dos dois extremos – o da explicação causal de corte naturalista, ou o da compreensão interpretativa de gênero cultural-relativista. Afinal, “o estudante absorve um ou dois dos cem ditos pelo professor: mas se os cem são constituídos por cem unilateralidades diversas, a absorção não pode deixar de ser muito baixa” (GRAMSCI, 2001, p. 151).

Uma via sem provável saída (embora, muito frequentemente, opção sedutora) é o da suposta integração das teorias e metodologias das ciências naturais e sociais; imagem que mantém obscurecido o fato de que já dentro de um e outro universo há enormes dissintonias e notáveis heterogeneidades (bastando considerar os casos Física e Biologia, no primeiro; e Economia e Antropologia, no segundo).

Logo, para o caso da Geografia, também não parece inteligente apostar num virtual elo entre os expedientes que marcam a produção de conhecimento nos subcampos que estudam dinâmicas naturalistas e processos socioculturais ou político-econômicos (metodologias do geomorfólogo e do geógrafo rural, por exemplo). Embora uma aproximação geral destes campos, sim. Porque, conforme aludido por Dilthey mesmo, há um estrado de conhecimentos engendrado pela ciência natural que pode muito bem constituir a base para o estudo dos fatos “espirituais”.

Em ambientes de ensino é importante que a aprendizagem se dê, tanto quanto possível, pela proposição de um campo de visão mais amplo do que aquele que se faz entender pelas restrições convencionadas. Nos referimos às “fronteiras” que aceitamos haver entre as ordens de fenômenos e de linguagens; as quais definiram toda uma hierarquia de disciplinas particulares. Ou seja, o empreendimento teria de prever um estilo de conhecimento complexo, coletivo; manifesto mais além das ideias de recinto ou jurisdição. Seria até mesmo louvável desejarmos a “não dualidade”; a complementaridade dos modos explicativos e interpretativos. Meta dirigida na condição de que juízos de valor, visões de mundo, de um intelectual instrutor de jovens, de vez que não são suprimíveis deste seu trabalho de formação, consigam não tornar litigiosa a trilha a ser seguida.

FEEDBACKS E INSIGHTS EM UMA OFICINA DE SIMPÓSIO REGIONAL

Nos dias 9 e 10 de Junho de 2017, na cidade de Brasília, aconteceu o “o I Encontro de Ensino de Geografia do Distrito Federal”; iniciativa conjunta de Professores da Universidade de Brasília e da Rede Pública do DF. Na expectativa de promover um frutuoso intercâmbio de experiências entre profissionais com já expressiva vivência na realidade escolar e jovens pesquisadores interessados em questões de ensino e aprendizagem, o encontro previu sessões de pôsteres, oficinas e mesas redondas. Atividades ao longo das quais os participantes discutiram temas como educação inclusiva, reforma do ensino, identidade epistemológica e relações entre juventude contemporânea e atualização dos modos de aprendizagem.

Ali, dentro da sessão de oficinas, tivemos a intenção de provocar um debate com professores de Geografia da Rede de Ensino Público do DF, licenciandos e pós-graduandos em Geografia, a partir da hipótese de que as abordagens sobre conteúdos programáticos da disciplina permanecem ainda muito “separatistas”. Isto é, de que elas próprias já tendem a não contribuir a uma imagem integradora de ciência geográfica – inviabilizando, pois, qualquer projeto de conferir um papel de destaque a este campo do saber.

MOSTRUÁRIO DE TEMAS POTENCIAIS PRESENTES EM LIVROS DIDÁTICOS DO ENSINO FUNDAMENTAL

Linha normativo-causal Erklären

Para os sétimos anos do EF, nos conteúdos relacionados à demografia, por exemplo, é possível trabalhar questões tais como “padrões estatísticos”, e mesmo projeções matemáticas sobre uma determinada dinâmica populacional. No campo dos “indicadores” (taxa de natalidade, mortalidade infantil, crescimento vegetativo), apresenta-se a oportunidade de lidar com a representação abstrata dos fenômenos; sendo que a “objetividade” desta representação pode ser problematizada com a ideia de “cenários especulativos” – caso em que as faixas de população, inscritas na “pirâmide etária” do país, favorecem um exercício reflexivo sobre a espécie de raciocínio aí envolvida.

Nos sextos anos, o conhecimento a respeito da estrutura da Terra, suas definições e aspectos gerais, costuma ser de cunho meramente informativo e não interpretativo. Um bom exemplo são os dados sobre a duração do dia e ano (concomitantes ao conteúdo sobre os movimentos planetários – rotação e translação). Outras ocorrências a serem aprimoradas têm a ver com uma série de exposições recomendadas pelos programas (contudo, sem ultrapassar o simples teor introdutório), que tangenciam temáticas astronômicas – como a explanação a respeito dos equinócios e solstícios, por exemplo.

Linha valorativo-interpretativa Verstehen

Nos nonos anos do EF são apresentados debates a respeito do “desenvolvimento” e “subdesenvolvimento”. Para isso alude-se à funcionalidade interpretativa de parâmetros tais como: projeções econômicas, problemas sociais, quadros políticos e protagonismo (ou não) dos países nas trocas comerciais em âmbito internacional. Mas para esse conteúdo seria importante um tratamento mais amplo por parte dos professores. A correlação de diferentes fatores como, por exemplo, a concomitância com os acontecimentos históricos do pós-guerra, e o lugar do Brasil nesta distribuição de riquezas na geopolítica mundial, operaria uma compreensão mais satisfatória dos próprios parâmetros arrolados como significativos.

Nos sétimos anos, quando as “regiões brasileiras” (de acordo com a divisão do IBGE) são apresentadas aos alunos, há aspectos específicos cujo entendimento precisa ser buscado para além das explicações fisicalistas. Bom exemplo desta exigida complementaridade (da interpretação) é o tratamento do caso “Região Nordeste” que, ao trazer a questão da seca, mobiliza uma série de fatores e variáveis, extrapolando os parâmetros naturalistas do regime pluviométrico ou da pedogeomorfologia típicos daquela realidade espacial. Sendo necessário expor o histórico político-econômico que conferiu singularidade àquela seca regional; suscitando nos alunos indagações sobre o complexo de determinantes por trás do fenômeno.

POSSIBILIDADES DE TRATAMENTO DE TEMAS PROPENSOS A UMA ABORDAGEM HÍBRIDA

Indicadores sociais

O desafio posto seria o exercício de decodificar os números, os dados estatísticos, a linguagem matemática, para constituir um olhar que alcance o que possa estar além do exposto em gráficos ou tabelas. Há uma complexidade (não imediatamente revelada) inerente aos indicadores sociais. A potencialidade dos dados existentes é proporcional a possibilidade de sua utilização e “tradução” nos temas geográficos presentes nos diferentes conteúdos, estratégias de aprendizagem e procedimentos didáticos executados na sala de aula.

Transposição do Rio São Francisco

A temática ambiental é um dos fronts de diálogo entre as ciências. Curiosamente, nem tão explorado na realidade escolar. Estabelecer para o ensino de Geografia o propósito de ser o ponto de conexão de diferentes áreas produtoras de conhecimento a respeito do tema parece utópico; mas é um projeto bastante razoável. Tendo em vista que, em teoria, espera-se que os discentes construam (numa pedagogia de autonomia) pontes entre os diferentes saberes com os quais interagem no percurso escolar, um estímulo mais intenso às operações intelectuais conectivas poderia trazer excelente saldo. Interpretação de textos e materiais imagéticos; análise das ações dos sujeitos e poderes locais, frente à estrutura e resiliência de formas naturais singulares; etc.

Tecnopolos

A relação entre o desenvolvimento urbano e as atividades industriais não é uma novidade. No entanto, o crescimento dos centros de alta tecnologia é algo que, apesar de estar na pauta das esferas de decisão política contemporâneas, precisa ser melhor tratado em sala de aula. Por possibilitar diferentes olhares, este fenômeno (verificado nas escalas mundial, nacional e regional) favorece uma análise mais completa sobre o Brasil e sua inserção no sistema mundo. Além disso, projetos nacionais (SUDAM, SUDECO, SUDENE) ou regionais (Arranjos Produtivos Locais), por fomentarem, de forma profícua ou não, o estabelecimento dos tecnopolos, ajudam muito no entendimento da economia das cidades. De igual maneira, a rede de tecnopolos traz consigo uma amplitude de múltiplos tratamentos e análises possíveis de serem explorados em atividades que visem a trans e interdisciplinaridade.

DESIGN DE UM MODELO DE BASE E CONJECTURA DE TÓPICOS PROPENSOS A UMA ABORDAGEM HÍBRIDA

Decidimos apresentar o problema, tomando por ponto de ignição um modelo que pudesse sistematizar um fato “paralelo”, por assim dizer: o de que, na própria história da ciência geográfica (ressaltando, porém, que se trataria, a princípio, de uma conjuntura apenas nacional), já está presente uma dinâmica de alteração de interesses temáticos pela comunidade de geógrafos – o que isso possivelmente coopere, talvez de modo indireto, para um desestímulo ao ensino aproximativo.

O modelo preveria quatro quadrantes, sempre validados para uma escala de tempo definido pelo historiador da ciência, em função de seu propósito analítico. Esses quadrantes reuniriam tópicos “tradicionais” (TT), “abandonados” (TAb), “atuais” (TAt) e “férteis” (TF). Os primeiros, dizendo respeito a temas mantidos, há muito, como de interesse corrente do geógrafo; logo, tornados verdadeiros “clássicos” da pesquisa geográfica, e, enquanto tal, que dificilmente virão a ser descartados. Os segundos têm a ver justamente com uma situação inversa: por força de condicionantes de época (de ordem econômica, por vezes), os praticantes da ciência não se sentiriam mais atraídos por certos temas, em geral suplantados por questões mais sedutoras ou prementes.

O terceiro tipo, por sua vez, poderia englobar duas situações alternativas interessantes: o tema poderia se mostrar “atual” porque ele é verdadeiramente “inédito” (ou seja, apenas recentemente seduziu o olhar de dada comunidade científica) ou porque ele, a bem dizer, foi “recuperado” (um antigo tema que agora, sob novas vestes, ressurge em contexto contemporâneo). Por fim, os últimos são denominados férteis no preciso sentido de que, até o momento, não chegaram a chamar a atenção de um contingente apreciável de cientistas da área, muito embora isso pudesse (ou até mesmo “devesse”) acontecer. Trata-se, neste caso, de um julgamento de naturezas axiológica, prognóstica e quase prescritiva por parte do historiador da ciência; o qual entende ser importante que sua comunidade se inscrevesse entre os profissionais que já perceberam ser contextualmente relevante tratar do tema em questão.

Dinâmica populacional e políticas de habitação (1º Quadrante: “TT”)

Trata-se efetivamente de uma família de temas que povoa, há bastante tempo, os manuais escolares – e que acaba refletindo um âmbito de pesquisa cujo mérito tem sido preservado entre os praticantes da ciência geográfica. Este âmbito é precisamente demarcado pela relevância dos fenômenos demográficos; e, se articulado ao problema das formas de ocupação do solo, define um rico universo de parâmetros interconectados. Seu caráter provocativo reside no fato de que, a princípio, mesmo professores tendem a enxergar esses temas como conexos à Geografia chamada “humana” – posto que, previsivelmente, os aspectos a serem abordados falarão de determinantes econômicos e sequelas sociais. Isto é, nem todo professor se arriscaria a agregar aos seus tratamentos as variáveis a ver com o quadro ecológico da região onde as dinâmicas populacional e habitacional se dão. Uma outra área, sugerida pelos participantes do Encontro de Ensino de Geografia, e com grande potencial de exploração nas aulas, diz respeito às áreas de risco, seu estudo, entendimento e aspectos econômicos e políticos, principalmente. Levando-se em consideração a palatável realidade de muitos alunos, habitantes de áreas classificados como de risco, o campo de uso e debate deste tema ganha ainda mais relevo.

Clima, topografia e planejamento urbano (1º Quadrante: “TT”)

A exemplo do tópico anterior, estamos aqui diante de um universo temático pleno de elos conectivos. Universo que, sem dúvida, legitima o emprego de modelos descritivos inspirados em modernas teorias de sistema (equilíbrio dinâmico, auto-organização, criticalidade, fractalidade, etc.). A curiosidade a ser explorada é que, apesar de (“separados”) esses temas serem mesmo bastante longevos na pesquisa geográfica (seja a físico-ambiental; seja urbano-regional), poucos se atreveriam a, de modo sistemático, trata-los numa visão conjugada – quer dizer, concebendo exemplos realísticos pelos quais os alunos percebessem que, de fato, um entrosamento dos fatores naturalistas (regime de chuvas, formas de relevo) e societários (atendimento a expectativas ou anseios de classe) pode conferir uma explanação mais completa de fenômenos que, na realidade, são de interface: a “vulnerabilidade socioambiental”, por exemplo, dados certos zoneamentos e tipos de uso do solo aí verificados.

Rede de transportes e desenvolvimento regional (2º Quadrante: “TAb”)

Este é um conjunto de temas que já esteve em melhor conta junto aos geógrafos brasileiros. E chegou a encontrar lugar central nas preocupações, de inquérito e planejamento, daqueles profissionais que atuaram, entre os anos 1950 e 1970, no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Acontece que com o advento do discurso crítico-radical essa espécie de preocupação (decerto, ligada a um raciocínio estratégico e logístico) terminou, aos poucos, marginalizada pela Geografia praticada nos círculos acadêmicos. Daí, então, o fato de muitos cursos universitários deixarem de contar com disciplinas relacionadas ao fenômeno “circulação” (no sentido de um tráfego espacial de pessoas e mercadorias). Também o interesse por “desenvolvimento”, na escala da economia regional, perdeu crédito junto aos geógrafos sociais – crentes em que o tema estaria dando respaldo a ideários capitalistas “hegemônicos”, bem como a modelos econômicos assentados numa lógica de eficiência (portanto, não necessariamente “sensíveis” ao interesse das classes marginalizadas). Por conseguinte, o desafio aqui era o de refletir sobre dois aspectos pertinentes: 1º) que este abandono pode ter significado também uma deliberada retirada do geógrafo das cenas investigativa e propositiva relacionadas aos temas (e, com a “fuga”, o grande público tendeu a não mais associar a Geografia a esse gênero de preocupações – o que, obviamente, também reduziu o mercado de trabalho de nossos bacharéis) e 2º) que o tópico, apesar de abandonado, oportuniza bons exemplos de uma conjugação possível entre as abordagens “nomotética” (causalidades físicas, princípios econômicos) e “idiográfica” (singularidades locais, demandas históricas).

Geomorfologia fluvial e abastecimento hídrico (2º Quadrante: “TAb”)

Aqui se verifica um outro caso semelhante de abandono e, por consequência, de “cessão de direitos” a outros profissionais. Hoje nas mãos de pesquisadores ligados às engenharias ou a investigações geológicas, a família de temas já teve notável tradição na literatura geográfica nacional – numa época em que ainda seria natural localizar geógrafos atuando como consultores técnicos em projetos de intervenção no quadro físico. Como se deduz, o mesmo viés ideológico que tendeu a segregar do campo geográfico os estudos de desenvolvimento, afastou da alça de mira do geógrafo esta temática centrada no problema crucial “água”. No entanto, este problema, suscitador de debates tão candentes nas últimas décadas, enseja um espetacular centro de convergência de aspectos, simultaneamente governados por leis (hidrodinâmica e mecânica dos solos) e movidos por sensibilidade perceptiva (impressões de “qualidade de vida”, “bem-estar”). As principais sugestões, neste tópicos, se deu no âmbito de uma participante da região norte do país, relatando a maneira como uma visão integrada entre tecnologia, aspectos ambientais (neste caso a fluviometria como principal deles) e atores civis, políticos e econômicos, podem contribuir para uma melhoria em situações que vão desde o foco do abastecimento hídrico, mas também em toda uma forma de vida pautada no uso dos recursos hídricos, como é o caso da amplitude da região amazônica, e porque não, em outras áreas de grande influência fluviométrica do país.

Etnocartografia e gestão de conflitos (3º Quadrante: “TAt”)

A linguagem dos “mapas”, marca registrada do trabalho geográfico, apesar de ter-se sofisticado grandemente, graças aos contínuos avanços em aparato computacional, não ficou restrita às semiologias lógicas e racionalistas. Soube também jogar seu papel de representação da informação espacial numa escala sígnica mais atenta aos simbolismos culturais. De certa maneira, é como se uma linguagem tradicionalista estivesse agora posta a serviço da defesa de valores culturais (não-hegemônicos), normalmente vinculados a grupos minoritários – indígenas, quilombolas, agricultores familiares. Por isso, possivelmente se apresente como um tema atual do subtipo “inédito”, visto se provar bastante original este atributo “mais social” do instrumento cartográfico. A sugestão de um debate em torno do tema nos pareceu válido por ele ensejar a abordagem de várias ambivalências (que parecem estar em jogo quando ao instrumento decidimos atribuir a função de informar uma tomada de decisão social ou ambientalmente sensível). Isso quer dizer que o tópico híbrido, porque conjuga “etnia” e “gestão”, realmente envolve valores de diferentes ordens, que podem desenhar uma situação conflituosa: o sentido de pertencimento a um território (ou de preservação de uma biodiversidade) diante de uma decisão racionalista de empreendimento industrial, por exemplo. O mapeamento etnocartográfico demonstrou-se como de grande interesse para uso em atividades de “imersão” geográfica, propostas pelos participantes do evento. Em situações de grande diversidade étnica e cultural, como são as grandes cidades, este cenário de diferentes linguagens, expressões e diálogos ganha ainda mais força, tendo em vista a margem de alcance dos instrumentos cartográficos em situações que envolvam desde políticas públicas a decisões em escala comunitária, por exemplo.

Geografia médica e vulnerabilidade socioambiental (3º Quadrante: “TAt”)

Já aqui teríamos um tópico que se prova atual, mas no preciso sentido de ilustrar a “recuperação” de um tema que, outrora, chegou a ser tradicional entre geógrafos. Trata-se do tema da “saúde”, que nas primeiras décadas do século XX inspirou, entre os praticantes de nossa ciência, um literal mapeamento de regiões do mundo, sazonal ou cronicamente “endêmicas” com respeito a determinadas doenças (febre amarela, malária, etc.). O feliz “retorno” ao interesse pelo tema explica-se muito pelas novas ondas de doenças endêmicas, que mobilizaram especialistas de várias áreas, das biológicas às sociais, para respectivas contribuições seja para prevenções preventivas, seja para ações remediadoras. Sendo assim, bem analogamente ao caso “Clima, topografia e planejamento urbano”, o tópico foi apresentado aos participantes da oficina como bom exemplificador das arestas de contato entre uma ordem naturalista de fenômenos, explanáveis na linha Erklären (inoculação, ciclo viral, efeitos fisiológicos), e uma ordem culturalista, que dá margem a pensarmos sobre as construções sociais e morais, em torno das consequências vivenciadas (contaminação, doença, morte). Neste tópico, a sugestão de correlação com a cartografia foi mencionada pelos participantes, em especial no que diz respeito ao “mapeamento” de epidemias ou doenças de fácil espalhamento espacial. Estes seriam bons exemplos de diálogo entre políticas de saúde pública em meio às dificuldades de atuação nestas ocasiões como, por exemplo, os últimos alarmes de risco infeção do zika vírus e chikungunya, em meio a ocorrência de grandes eventos esportivos internacionais no Brasil.

Comércio internacional e segurança sanitária (4º Quadrante: “TF”)

Dentro agora de um rol de temas que, entendemos, poderia atrair a atenção de nossos pares (o que, sobretudo, lhes facultaria o direito de ingressar nos novos recintos da ciência aplicada), encontramos alguns com um especial caráter miscigenado – e, por isso, passível de explanação por um olhar que esteja na encruzilhada das geografias física e humana. Porque está claro que as discussões relacionadas ao tráfego de espécies vegetais (mudas, sementes), com fins de teste de adaptação ou decidida expansão produtiva, envolvem tanto os saberes ecológicos (que interligam fatores naturalistas, bióticos e abióticos), quanto o quadro complexo dos fatores humanos – conector que é de variáveis tantas, como as político-econômicas (jogo de interesses empresariais e governamentais; acordos de impacto geopolítico) e as agrícola-sanitárias (segurança alimentar, riscos de propagação de pragas). A sugestão dos participantes do encontro, neste tópico, se deu principalmente em exemplos práticos de barragem em produtos com potencial risco de infecção à populações de países importadores. Um dos exemplos citados foi a recente crise da carne bovina brasileira, gerando toda uma cadeia de eventos geograficamente relacionados ao tema, desde os lugares de produção da carne até os destinos aos quais o produto fora enviado antes dos incidentes de riscos de contaminação gerarem todo a preocupação sobre o consumo de carne.

Geoarqueologia e proteção ambiental (4º Quadrante: “TF”)

E este que é um tema bastante útil para o geógrafo perceber novas possibilidades de atuação no mercado de trabalho (dadas as requisições de um profissional capacitado a fazer diagnósticos paisagísticos e emitir laudos favoráveis ou não aos empreendimentos econômicos), se mostra mais um rico ponto de convergência de saberes. Porque se de um perito cientista de campo, bem instruído sobre dinâmicas hidrológicas e morfoestruturais, pode-se esperar um inventário “técnico” acerca de virtuais sítios arqueológicos (relatório sinalizador de um ancestral grupo humano e sua organização espacial de então), também deveria ser possível estimar que ele possua habilidades para propor uma “educação ambiental” – útil a que comunidades locais, por exemplo, compreendam o sentido de território que aquelas civilizações possuíam (dada a produção pictórica e material que possam ter deixado). Nesta estratégia temática foram sugeridos, pelos participantes do Encontro de Ensino de Geografia, o uso de atividade extraclasse como via para se chegar as objetivações do tópico. Apesar dos desafios de ordem técnica que, porventura, possam vir a aparecer no cotidiano dos profissionais de educação, vale o esforço de conciliar visitas dirigidas a sítios arqueológicos, facilmente encontrados no Distrito Federal e arredores goianos, fomentando múltiplas dialogias disciplinares com os discentes.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O debate sobre as dualidades teóricas e epistêmicas do pensamento geográfico está longe de ser esgotado. No decorrer do presente trabalho apresentamos alguns destes pontos, ligados direta e indiretamente ao ensino e aprendizagem da Geografia escolar. O percurso iniciado na conceitualização sobre as explicações causais ou do entendimento empático foram correlacionados, num âmbito maior de problematização com a temática envolvendo a ideia de Erklären e Verstehen e, igualmente, com a noção de ciência nomotética e idiográfica.

Tendo como base estas discussões, chegamos na especificidade que foi exposta, concernente à Geografia, em especial ao seu dualismo no que se refere ao objeto de estudo que a define e, também, a dinâmica relacional, no espaço geográfico, envolvendo o ser humano e a natureza. Estas vias do pensar e fazer geografia chegaram, inevitavelmente, às salas de aula, nos livros didáticos e na retórica dos professores.

Após estas considerações coloca-se como uma perspectiva de preocupação necessária a questão envolvendo o ensino de Geografia nas escolas. Tendo os movimentos de alteração constante, seja nos currículos ou nas demais bases legais de regulação da prática docente em sala de aula, um papel de protagonismo tanto num olhar mais atento a estas intervenções, do entendimento a respeito da ciência geográfica em seu âmago teórico e metodológico, quanto uma melhor fundamentação dos profissionais da educação, atuantes do Ensino Básico ao Superior, diante das transformações em curso, no cerne do fazer, pensar e ensinar da ciência geográfica, desafio posto nestas breves páginas, com um caminho longo ainda a ser percorrido.

Que relação existe entre a Geografia e as outras ciências?

A Geografia oferece uma enorme possibilidade de integração. Um dos principais aspectos que permitem o desenvolvimento de um intercâmbio entre a Geografia e as outras disciplinas é o fato de a mesma ter como objeto de estudo o espaço geográfico, construído ou natural.

Quais são as ciências que possuem relação com a Geografia?

1) Climatologia: é o ramo da Geografia que estuda o clima e os padrões de comportamento da atmosfera. Por meio de fatores e elementos climáticos, é possível fazer uma análise dos climas no mundo todo. 2) Geomorfologia: é o ramo da Geografia que estuda as formas da superfície da Terra, ou seja, as paisagens.

O que diferencia a Geografia das outras ciências?

A geografia humana distingue-se das outras ciências porque é a única ciência que tem como preocupação principal o espaço e a localização. Os seres humanos vivem a sua vida no espaço, distribuem as suas atividades e deslocam-se nesse mesmo espaço.