Considerado por muitos historiadores como um dos principais eventos históricos do século XX, a Revolução Russa, iniciada em 1917, representou a construção de um Estado e de uma sociedade considerada por muitos especialistas como socialista. A Revolução Russa teve várias fases que proporcionaram importantes alterações nos rumos da construção da sociedade russa.
A Revolução Russa iniciou-se em fevereiro de 1917 quando a população de São Petersburgo saiu às ruas contra o czar Nicolau II, pedindo melhorias nas condições de vida, de trabalho e de alimentação, bem como a retirada das tropas russas da I Guerra Mundial.
Em virtude dessa manifestação popular e de uma conjuntura política não favorável ao poder despótico de Nicolau II, o czarismo teve fim, sendo constituído em seu lugar um governo provisório, que iria governar o país até a elaboração de uma Constituição para a Rússia. O governo provisório era apoiado pela Duma, o parlamento russo, que administrou o país sem, no entanto, conseguir atender às reivindicações da população russa.
Ainda em fevereiro, os operários de São Petersburgo voltaram a criar os sovietes. Criados inicialmente em 1905, durante a Revolução Russa de 1905, os sovietes eram os conselhos de operários, formados apenas por delegados de origem trabalhadora, e que tinham por função ser um órgão de administração política e econômica. Os sovietes foram constituídos também dentro das fábricas, passando a ser órgãos de gestão do processo de produção.
A existência simultânea da Duma e dos sovietes caracterizou a situação que foi denominada de duplo poder, com a Duma representando os interesses da burguesia e da aristocracia russa, e os sovietes, os interesses dos operários.
Alguns partidos políticos disputavam a direção do movimento revolucionário, que se expandiu entre fevereiro e outubro de 1917, alcançando todo o território do Império Russo. Os principais partidos estavam à esquerda do cenário político. Dois deles eram decorrentes de uma cisão do Partido Operário Social-Democrata Russo (POSDR), que deu origem aos mencheviques e aos bolcheviques.
Os mencheviques eram partidários, em linhas gerais, de que a revolução passasse inicialmente por uma democracia representativa burguesa para estimular o desenvolvimento das forças de produção capitalista, estágio necessário para a chegada ao comunismo. O principal líder menchevique naquele momento era Kerenski, que chegou a dirigir o governo provisório até outubro de 1917.
Os bolcheviques discordavam dessa posição, pois eram partidários da tomada do poder de Estado pelos trabalhadores, com a direção de seu próprio partido. O objetivo era constituir a ditadura do proletariado, que conduziria a sociedade russa para o socialismo, tendo o Estado como principal impulsionador do desenvolvimento das forças produtivas.
Havia ainda uma importante participação de anarquistas na organização das massas trabalhadoras russas, principalmente ligadas à luta dos comitês de fábrica e à constituição de um forte movimento operário e camponês na Ucrânia, liderado por Nestor Makhno.
Ainda do lado dos camponeses havia os Socialistas-Revolucionários, partido político que representava esse grupo social, que compunham a imensa maioria da população russa. Os camponeses não esperaram ações do governo provisório para verem atendida sua principal reivindicação, que era a distribuição das terras pertencentes à nobreza e à Igreja Ortodoxa. As ocupações de terras cresceram entre fevereiro e outubro, fortalecendo a luta pela reforma agrária.
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Mas foram os bolcheviques que conseguiram liderar o movimento, principalmente depois da chegada de Vladimir Ilich Lenin, em abril de 1917. Como um dos principais líderes bolcheviques, Lenin conseguiu orientar o partido no sentido da tomada do poder de Estado, buscando o apoio das massas através de duas expressões de ordem principais: “Paz, pão e terra”, que tinha por objetivo apontar a necessidade de retirada do país da I Guerra Mundial, acabar com a fome da população e realizar a reforma agrária; já a palavra de ordem “todo poder aos sovietes” indicava a necessidade do poder estar baseado na organização criada pelos trabalhadores, entendendo o operariado como liderança na construção do socialismo.
Em outubro de 1917, os bolcheviques e os socialistas-revolucionários de esquerda decidiram pela tomada do poder de Estado. A ação principal aconteceu em São Petersburgo após a formação da Guarda Revolucionária pelo soviete da cidade. A principal ação foi a tomada do Palácio de Inverno, onde se reunia o Governo Provisório. A partir desse momento, os bolcheviques construiriam sua liderança na revolução e um novo Estado na Rússia.
Com a tomada do poder, iniciou-se uma nova etapa da Revolução Russa, caracterizada pela guerra civil, que durou de 1917 a 1921. Os bolcheviques formaram o Exército Vermelho, que cresceu rapidamente, e passaram a enfrentar o Exército Branco, formado por generais ligados à aristocracia e burguesia russa, com o apoio dos países capitalistas do Ocidente. Outro grupo que passou a enfrentar o Exército Branco foi a makhnovitchina, composta por camponeses e trabalhadores ligados a Nestor Makhno.
A guerra civil foi composta de combates duros e levou a sociedade a uma situação de extrema penúria, com a falta de alimentos e a morte de centenas de milhares de pessoas. Para organizar o nascente Estado, os bolcheviques adotaram como forma de administração política e econômica o que ficou conhecido como comunismo de guerra, que consistia na militarização do trabalho nas cidades e no confisco da produção agrícola dos camponeses. Essa situação causou um extremo desgaste com os últimos, além da prática de confisco ter ainda incentivado a formação de um mercado clandestino.
A guerra civil terminou em 1921 com a vitória do Exército Vermelho, a eliminação da oposição política aos bolcheviques e o desmantelamento do exército de Makhno. Outro fato simbólico do fim da guerra civil foi o esmagamento pelo Exército Vermelho da revolta de Kronstadt, ocorrida em uma fortaleza naval que representava o principal foco de enfrentamento ao czarismo desde 1905. A principal reivindicação dos revoltosos era a eleição de sovietes livres, sem o monopólio bolchevique, em uma posição semelhante a que existiu em fevereiro de 1917. Ameaçados, os bolcheviques esmagaram a revolta, pondo fim à chamada terceira Revolução Russa – depois da primeira de fevereiro de 1917 e a segunda de outubro de 1917 – e consolidando seu poder no comando do Estado. A partir desse momento, iniciava-se o período de construção do Estado soviético, marcado pela reconstrução econômica e pelas lutas de disputa interna ao poder do partido.
Por Me. Tales Pinto