O rio Nilo tem sido uma importante fonte de vida para pelo menos 11 países africanos, sendo o Egito o seu usuário mais conhecido, principalmente pelas grandes produções históricas que lembram os impérios egípcios e a importância do Nilo neles. Mesmo neste século, o rio Nilo continua sendo de extrema importância para a subsistência, produção de energia e controle ambiental, por isso o seu controle está provocando um ambiente de guerra entre Egito, Etiópia e Sudão, há alguns anos. Essa “guerra hídrica” vem tendo tentativas falhas de conciliação, inclusive envolvendo forças externas, como os EUA, porém ano após ano, as tentativas falham.
A grande questão envolve uma usina hidrelétrica que está sendo construída no “Nilo Azul”, como é chamado, que é a parte do Nilo que passa pela Etiópia. Quando concluída, a Grande Barragem da Renascença da Etiópia, como é chamada, em tradução livre, será a maior usina hidrelétrica da África e uma das poucas construídas sem investimento estrangeiro e sim investimento governamental.
A sua construção começou em 2011 no afluente do Nilo Azul, de onde correm 85% das águas do Nilo, e a construção fica muito próxima do ponto em que “nasce” a água do Rio Nilo.
No cerne da disputa está o temor do Egito de que o projeto permita à Etiópia controlar o fluxo do rio mais longo da África. As usinas hidrelétricas não consomem água, mas a velocidade com que a Etiópia enche o reservatório da barragem afetará o fluxo da mesma. Tanto o Egito quanto a Etiópia têm fortes inclinações sobre o projeto.
A barragem de 4 bilhões de dólares está no centro dos sonhos manufatureiros e industriais da Etiópia. Quando concluído, espera-se que seja capaz de gerar eletricidade para toda a população etíope sem acesso a ela, já que a Etiópia tem uma escassez aguda de eletricidade, com 65% de sua população sem acesso. A energia gerada será suficiente para ter seus cidadãos conectados e vender a energia excedente aos países vizinhos, o que também vai ajudar sua balança comercial a se recuperar. Países vizinhos, incluindo Sudão, Sudão do Sul, Quênia, Djibouti e Eritreia, provavelmente se beneficiarão da energia gerada pela barragem, já que ela poderá regulamentar o nível do rio o ano todo, se bem sucedida, e alguns desses países também sofrem com grandes cheias nos períodos de inundação do rio.
O Egito, por sua vez, é uma nação que tem tido que lidar com cada vez mais escassez de água. Como sua população continua a crescer a uma taxa elevada – quase 2 por cento ao ano – as necessidades de água do Egito agora superam seu acesso e uso. O GERD, que é a sigla para a barragem etíope, tornou-se o símbolo dessa escassez de água, sendo sua construção assimilada como uma ameaça à subsistência do povo egipcío. Uma das principais preocupações do país é que, se o fluxo de água cair drasticamente, graças ao controle da Etiópia, isso poderá afetar o Lago Nasser, um importante reservatório do Egito, e a represa de Aswan, embora esta seja responsável por apenas uma pequena parcela da eletricidade egípcia, mas que mesmo assim carrega uma importância histórica e política.
Aswan High Dam é uma barragem localizada na fronteira norte entre o Egito e o Sudão. A inundação do Nilo ocorre anualmente, com quase metade da água sendo drenada para o mar de forma a ser desperdiçada. A barragem controla as inundações do rio, regulando seu fluxo e fornecendo água para irrigação durante todo o ano, o que quase duplica a produção agrícola, além de também melhorar a navegação pelo Nilo, beneficiando o turismo e a pesca. O reservatório também ajuda no abastecimento de água durante as secas.
O Egito afirma temer principalmente os períodos de seca, visto que sem o seu controle usual, as águas que abastecem o país nesse período não seriam suficientes, como no passado. A Etiópia já acusou esse de estar usando truques imperialistas para manter um domínio sobre as águas. Essas acusações vieram do fato de que o Egito pautava seu controle num acordo com a Grã Bretanha, de 1929, e de sua modificação de 1959, em que o controle de 48 bilhões de metros cúbicos da água do Nilo ficava sob domínio egípcio, deixando o mínimo para o controle dos demais. O acordo também previa que o Egito não precisaria de consentimento de outros países para construções no seu território, e em sua parte do Nilo, mas poderia vetar o mesmo tipo de ação nos outros países banhados por essas águas.
O Egito ainda clamava pela validação desses acordos, mas a Etiópia não viu como esse tipo de acordo, com o antigo colonizador, poderia continuar a promover efeitos concretos hoje em dia. As operações da hidrelétrica estão começando aos poucos, mas um acordo entre os países sobre o assunto ainda não se mostra tão próximo. Muitos temem que isso leve a uma verdadeira guerra, que afetaria todo o continente, mas, seja como for, o que acontece nesse cenário é uma amostra das guerras que estão por vir no futuro, em que a água será o bem mais disputado no mundo todo, não só em algumas regiões.