Quais as pessoas jurídicas de direito privado descritas no Código Civil?

PERSONALIDADE JUR�DICA EMPRESARIAL

Personalidade jur�dica � a ideia de que uma pessoa, seja f�sica (pessoa natural), seja jur�dica (empresa, ente p�blico, associa��o sem fins lucrativos) tenha capacidade de adquirir direitos e contrair deveres na sociedade (direito civil). 

Para fins pr�ticos, no caso de empresas, temos que a personalidade jur�dica confere � sociedade uma exist�ncia diversa em rela��o aos s�cios, sendo ent�o uma entidade jur�dica individualizada e aut�noma.

Adquire-se a personalidade jur�dica pela inscri��o do ato constitutivo da sociedade no registro pr�prio:

- na Sociedade Empres�ria: Registro P�blico das Empresas Mercantis (Junta Comercial); e

- na Sociedade Simples: Registro Civil das Pessoas Jur�dicas.

A extin��o da personalidade jur�dica ocorre com a averba��o da dissolu��o e respectiva liquida��o da sociedade no mesmo �rg�o de registro de sua abertura.

Os efeitos advindos da personalidade jur�dica decorrem do fato de a sociedade constituir: nome pr�prio, patrim�nio pr�prio, domic�lio pr�prio, etc., acarretando desta forma, a separa��o patrimonial da sociedade em rela��o aos seus s�cios, para efeitos de responsabilidade quanto �s obriga��es assumidas pela sociedade.

Bases: C�digo Civil Brasileiro de 2002, artigos 1, 45, 985 e 1.150.

As Fundações e o Novo Código Civil

Através de questionamento trazido individualmente ao crivo deste Centro de Apoio Operacional das Promotorias da Cidadania, com atribuições em matéria fundacional, apresenta-se extremamente oportuno fazer algumas reflexões sobre o atualíssimo tema das finalidades para as quais uma fundação pode ser instituída, sobretudo frente às inovações trazidas pelo novo Código Civil, sob o prisma das particularidades que essas pessoas jurídicas de direito privado apresentam.

Aproveitando a abordagem do caso concreto — não identificado propositalmente[1] — nota-se da leitura dos dispositivos destacados do projeto de estatuto submetido à aprovação do Ministério Público, que, a par do ponto central da reforma estatutária pretendida no capítulo das “finalidades”, justificada pela entrada em vigor do novo Código, identifica-se outro tema, de igual ou até superior importância no contexto atual, representado pela inserção na proposta de alteração estatutária da expressa possibilidade de que a entidade fundacional se utilize de seu patrimônio no desenvolvimento de atividades econômicas, ora como meio de atingir suas finalidades assistenciais, ora sendo estas atividades econômicas coincidentes com as mesmas finalidades (econômicas).

No caso em espécie, trata-se de verificar a possibilidade, frente ao aparato legal, de se instituir uma fundação com as finalidades a seguir transcritas:

Artigo 2° . A Fundação CANAL LARANJA[2] tem por finalidade específica: prestar assistência genérica, com os objetivos em frente delineados.

Parágrafo primeiro - na forma prevista no Parágrafo único, do artigo 62 da Lei 10406/2002, respeitando as suas finalidades primitivas, conforme preceitua o inciso II do artigo 67, da mesma Lei, a FUNDAÇÃO CANAL LARANJA concentrará suas atividades em finalidades de Assistência Social, mais precisamente as ações conforme descritos no artigo 203 incisos I a V, da Constituição Federal do Brasil de 1988.

Parágrafo segundo – Para atingir os seus objetivos, a FUNDAÇÃO CANAL LARANJA poderá colocar o seu Patrimônio a trabalhar em atividades econômicas, conforme lhe assegura o artigo 170, parágrafo único, da Constituição Federal de 1988, sendo os seus resultados canalizados para suas finalidades de Assistência Social, podendo concomitantemente as atividades econômicas serem coincidentes com as mesmas finalidades. (GRIFOS MEUS)

Pois bem, a par das diversas imprecisões de natureza formal apresentadas nas disposições citadas — que serão abordadas em parecer dirigido à situação particularizada — , podemos destacar, nesta análise, três aspectos de interesse geral para o estudo da matéria fundacional, que passarão a ser objeto de reflexão na seguinte ordem: 1) a aplicação do parágrafo único do artigo 62 do Código Civil; 2) o exercício de atividade econômica por fundações visto sob a ótica das modificações trazidas pelo novo Código Civil às pessoas jurídicas de direito privado; 3) a previsão de adequação das entidades fundacionais já existentes à disciplina do novo Código Civil (artigos 2.031 à 2.033).

1 - A Aplicação do parágrafo único do Artigo 62 do Novo Código Civil

Inicialmente é preciso registrar as premissas normativas que serão objeto de interpretação neste trabalho:

Estabelecia o artigo 24 do Código Civil de 1916:

“Para criar uma fundação, far-lhe-á o seu instituidor, por escritura pública ou testamento, dotação especial de bens livres, especificando o fim a que destina e declarando, se quiser, a maneira de administrá-lo.”

Através da disposição correspondente, no artigo 62 do novo Código Civil (Lei n° 10.406 de 10.01.2002), o legislador prevê, adotando redação semelhante, que:

“Para criar uma fundação, o seu instituidor fará, por escritura pública ou testamento, dotação especial de bens livres, especificando o fim a que se destina, e declarando, se quiser, a maneira de administrá-la.”

Todavia, acrescenta a essa disposição um parágrafo único, no qual delimita os fins para os quais poderão ser instituídas as pessoas jurídicas fundacionais:

“A fundação somente poderá constituir-se para fins religiosos, morais, culturais ou de assistência.”

Sobre a inovação mencionada, importa observar, desde logo, que tramita no Congresso Nacional um projeto de lei do próprio Deputado Ricardo Fiúza, propondo a supressão deste parágrafo único, justificada pela inconveniência da limitação dos fins das entidades fundacionais (PL n° 7.160, de 27.08.02).[3][4]

Não é sem razão que esta disposição tem sido objeto de atenção — e porque não dizer de preocupação —, dos diversos agentes envolvidos na identificação da posição jurídica e do papel social das fundações privadas, dadas as limitações que a sua incidência concreta poderá ensejar quando da criação de novas entidades fundacionais.

Dentre as opiniões já editadas sobre a matéria, ressaltamos o abalizado posicionamento de José Eduardo Sabo Paes, em sua obra “Fundações e Entidades de Interesse Social”[5], o qual adverte que: “A limitação da fundação é totalmente contrária ao interesse público e inconveniente ao interesse da sociedade.”

Este entendimento coincide, na íntegra, com aquele defendido pela “Associação Nacional dos Procuradores e Promotores de Justiça de Fundações e Entidades de Interesse Social –PROFIS”[6], cujos membros, na recente reunião ordinária ocorrida em 28 de abril de 2003, em Brasília, por ocasião do “IV Simpósio Ministério Público e o Terceiro Setor em Convergência com o Interesse Social”, ratificaram o entendimento já anteriormente manifestado, contrário à referida restrição, diante da notícia da resistência, por parte de alguns parlamentares, acerca do projeto que propõe a supressão desta norma, ao argumento de que a limitação imposta evitaria o desvirtuamento das finalidades para as quais foram previstas ditas entidades em sua origem, e o mau uso que vem sendo feito das receitas auferidas com a renúncia e os incentivos fiscais para fomentar-lhes as atividades de cunho social.

É preciso deixar assente, entretanto, que ao mesmo tempo em que é encampado o posicionamento de que a limitação das finalidades fundacionais não atende ao interesse da sociedade, assume-se, em contrapartida, o crescimento da responsabilidade do velamento pelo Ministério Público, no intuito de impedir que algumas entidades, “sob o manto do formato fundacional”, atuem como verdadeiras “bancas de negócios”, privilegiando e enriquecendo ilicitamente alguns apaziguados, utilizando-se da via da concorrência comercial desigual e desleal, propiciada pelo tratamento tributário diferenciado das fundações (imunidades e isenções à entidades de interesse público), ou através da burla — hoje bastante comum — da legislação trabalhista (“voluntariado”), previdenciária (“pilantropia”) e administrativa, sobretudo na contratação com o Poder Público (fraude à lei de licitações e à exigência de concursos).

Oportuno consignar a respeito, que este Centro de Apoio Operacional das Promotorias da Cidadania-Núcleo das Fundações, vem expandindo a sua atuação neste campo de grande interesse social, anotando que, no Paraná, na maioria dos casos, o exercício da função de velamento vem sendo realizado há vários anos mediante a verificação “in loco”, por auditores do Ministério Público, da documentação referente às contas apresentadas. Além disso, encontra-se em fase de progressiva implantação, o controle finalístico de aplicação de recursos dessas entidades, medidas essas que têm permitido aos Promotores de Justiça a adoção de medidas tendentes a coibir abusos e ilegalidades, não obstante as dificuldades práticas que envolvam esta árdua tarefa.

Isto posto, e voltando ao enfrentamento da temática proposta — da interpretação da regra do parágrafo único do artigo 62, hoje em vigor —, para abrir o debate da questão, iniciamos com o registro do entendimento do ilustre Procurador de Justiça, Coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Tutela de Fundações de Minas Gerais, doutor Tomáz de Aquino Resende[7], apresentada em atualíssimo artigo sobre a matéria, no qual pontifica:

Ao acrescentar o parágrafo único ao artigo 62 do Código Civil, buscou o legislador, pensamos, tornar mais claro ainda que no direito pátrio, como tradição secular, não se admite a figura de pessoa patrimonial a administrar interesses exclusivamente privados, como acontece em outros países, onde são criadas fundações para administrar fortunas em favor de alguns poucos herdeiros.

Como já tivemos oportunidade de asseverar em outros trabalhos, este desejo da sociedade, expressado através dos legisladores, em não admitir o nascimento de fundação para administrar interesses particulares, vem muito claro no artigo 11 do Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942 (Lei de Introdução ao Código Civil) que nos leva, aí sim, numa interpretação literal, à conclusão irrefutável de que, obrigatoriamente, só poderão existir sociedades sem fins lucrativos (hoje associações) e fundações, se objetivarem as mesmas, em seus especificados fins, a questões de interesse coletivo, como se vê:

“ As organizações destinadas a fins de interesse coletivo, como as sociedades e as fundações....”

Assim, além de desnecessária, a inovação posta através do parágrafo único acima mencionado, com o claro intuito de repetir a restrição já existente, é de uma redação deveras confusa e imprópria, vez que se não ambíguos, os termos nela contidos demandariam complementação, vez que totalmente desnecessários e indevidos, tanto que proposta do Deputado Ricardo Fiúza sugere a supressão total do mencionado parágrafo[8].

O ilustre Procurador de Justiça discorre, ainda, em seu artigo, sobre interpretação das finalidades elencadas na precitada disposição, tais como: os “fins religiosos” e os “fins culturais”, que, a seu ver, prescidem de maiores comentários; os “fins morais”, lembrando que já não são permitidas entidades imorais em nosso ordenamento ou que tenham objeto ilícito; e os “fins de assistência”, que representam, na verdade, a intenção do legislador em deixar claro que “as entidades sem fins lucrativos continuam obrigadas a prestar assistência às questões de interesse coletivo”, para, ao final de sua exposição, concluir:

Portanto, ainda que desconsiderando o trocadilho, embora o mesmo tenha mais sentido do que o dispositivo legal em comento, não sendo imorais (entendam-se por ilícitos) os fins, nem tendo como objetivo a administração de interesses particulares, dessume-se da legislação brasileira a possibilidade de instituição de fundação para qualquer das inúmeras finalidades demandadas pelo interesse coletivo, como até então vem se fazendo. Ou seja, nenhuma contribuição houve, com o acréscimo de parágrafo ao artigo 62 do Código Civil, o qual deverá ser excluído da lei, ou, mesmo se mantido, não gera qualquer efeito de ordem prática com relação ao já estabelecido para a instituição de fundações em nosso País.”

Com todo o respeito aos valorosos fins defendidos pela visão transcrita, impõe-se reconhecer que diante do absoluto silêncio que pairava na legislação anterior, a simples inserção desta norma, citando expressamente os fins para os quais pode uma fundação ser instituída, leva, objetivamente, ao reconhecimento do seu caráter restritivo, ainda que a sua redação possa ensejar a pesquisa do significado e do alcance da terminologia utilizada.

Nesse contexto, não vemos outro caminho senão a de procurar identificar, sob a perspectiva legal, quais seriam essas finalidades “morais”, “religiosas”, “culturais” e “de assistência”, que possam traduzir o alcance social para os quais essas entidades de interesse coletivo, sem fins econômicos ou lucrativos, podem ser instituídas, valendo destacar, nesta tarefa, o seu aspecto mais polêmico, qual seja, as ditas finalidades “de assistência”.

Como norte desta empreitada, lembramos, primeiramente, o que dispôs o constituinte originário para a concretização das políticas públicas decorrentes dos princípios fundamentais da dignidade humana, da cidadania, da justiça social, dentre outros, estabelecendo no artigo 6º da Constituição Federal, os Direitos Sociais:

“São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma dessa Constituição.”

Expressam ainda as políticas públicas voltadas ao apoiamento dos direitos sociais, entre outras, o disposto no artigo 203 da Constituição Federal, o qual indica como objetivos da assistência social, regulamentados pela LOAS – Lei Orgânica de Assistência Social (Lei n° 8.742/93): a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice; o amparo a crianças e adolescentes carentes; à promoção da integração ao mercado de trabalho; à habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária.

Outrossim, o Decreto n° 2.536/98, que dispõe sobre a concessão do CEBA - Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (antigo certificado de filantropia), considera como entidade beneficente de assistência social, sem fins lucrativos, além das entidades que atuem nas áreas acima, aquelas que promovam, gratuitamente, assistência educacional ou de saúde.

Ao lado dessas fontes primárias de interpretação, extraídas do direito positivo, mas não fora da sua abrangência, retornaremos então ao estudo apresentado pelo Procurador de Justiça mineiro, Tomás Aquino Resende[9], acerca da interpretação do novel regramento:

“(...) Quanto a “fins de assistência” melhor sorte não merece, vez que além dos argumentos acima alinhavados, aqui também plenamente cabíveis, devemos entender que a intenção do legislador foi a de deixar ainda mais claro que as entidades sem fins lucrativos continuam obrigadas a prestar assistência às questões de interesse coletivo.

Se, como dizem alguns, os fins fossem os de prestar serviço gratuito ao atendimento das necessidades de pessoas desprovidas de recurso, imprescindível seria o acréscimo da expressão social. Assim, se não se trata de assistência social, o foco do legislador ao mandar acrescentar o termo à lei, evidentemente foi o de estabelecer que só se admitem fundações com o fim de, nos mais diversos campos do interesse coletivo, colaborar, apoiar, proteger e amparar, pois esta a interpretação léxica da expressão assistência, considerando, inclusive, o contexto onde a mesma está inserida.

E, colaborar, apoiar, proteger, amparar, enfim, prestar assistência (muito diferente da assistência social, repita-se com ênfase) pode ser realizado em qualquer das áreas de interesse coletivo: Meio ambiente, pesquisa, esportes, saúde, educação, etc.,etc.”

De forma plenamente compatível com esta linha de raciocínio, registramos, ainda, o ponto de vista de Maria Helena Diniz[10], a qual, se reportando às conclusões do Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal[11], refere-se às fundações privadas e suas finalidades da seguinte forma:

“É, portanto, um acervo de bens livres, que recebe da lei a capacidade jurídica para realizar as finalidades pretendidas pelo seu instituidor, em atenção aos seus estatutos, desde que religiosos, morais, culturais ou assistenciais (CC, art. 62, parágrafo único). Não tem fins econômicos, nem fúteis. Logo, “a constituição de fundação para fins científicos, educacionais ou de promoção do meio ambiente está compreendida no Código Civil, art. 62, parágrafo único” (Enunciado nº 8 do Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal), por ser meramente enunciativa e por indicar a exclusão de fins lucrativos. E, além disso, cultura em sentido amplo pode abranger a educação, inclusive a ambiental, a pesquisa científica, a preservação do patrimônio cultural, a valorização e a difusão de manifestações culturais, o desenvolvimento intelectual etc. “O art. 62, parágrafo único, deve ser interpretado de modo a excluir apenas as fundações de fins lucrativos” .

Além dos argumentos visitados, outro aspecto que enseja a máxima atenção do aplicador da lei, é o contexto e a oportunidade em que a previsão surgiu, justamente, quando também ocorreram mudanças afetas às demais pessoas jurídicas de direito privado interno.

Significativamente, no Código Civil atual, as sociedades civis sem fins lucrativos desaparecem, subsistindo apenas como sociedades civis as que possuem fins lucrativos, simples ou empresárias.

Atualmente, sem fins lucrativos serão apenas as associações e as fundações.

Sob este prisma encontra-se realçada a idéia de que as fundações, tal como as associações, não se coadunam com objetivos econômicos ou lucrativos, razão pela qual as finalidades para as quais podem ser instituídas deverão atender, puramente, a objetivos de interesse coletivo. Nesses moldes, mostra-se justificável a limitação pensada pelo legislador, quanto às finalidades religiosas, morais, culturais e de assistência.

Assim sendo, e levando em conta as idéias acima expostas, relacionamos as seguintes conclusões:

1) O legislador inseriu uma norma de caráter restritivo às finalidades para as quais podem ser constituídas as fundações, cuja forma de exposição permite, e reclama, o exercício de interpretação, sobretudo teleológica, sobre o conteúdo da disposição comentada;

2) A restrição surgiu simultaneamente às modificações introduzidas quanto às demais pessoas jurídicas de direito privado, significativamente, quando desaparece a figura das sociedades sem fins lucrativos, as quais, ao lado das fundações e das associações, compreendiam as entidades de interesse social, reforçando a noção de fundações como organizações destinadas a fins coletivos; a impossibilidade de sua utilização para fins econômicos ou lucrativos; a vedação para a administração de interesses particulares.

3) Segundo as fontes positivas de interpretação, os fins assistenciais compreendem: a assistência à educação, à saúde, ao trabalho, à moradia, ao lazer, à segurança, à previdência social, à proteção à maternidade, à infância e à adolescência; a assistência aos desamparados, à promoção da integração ao mercado de trabalho; à habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária.

4) Como fins culturais, além do apoio, valorização e a difusão de manifestações culturais, propriamente ditas, podem inserir-se a educação ambiental para a preservação do meio ambiente.

5) A viabilidade, sob a ótica da essência do instituto fundacional, da interpretação extensiva da norma, admitindo-se como fins de assistência: a colaboração, o apoio, o amparo, a prestação de assistência direta a questões coletivas em qualquer das áreas de interesse coletivo: como o meio ambiente, a pesquisa científica, a preservação do patrimônio cultural, a valorização e a difusão de manifestações culturais, o desenvolvimento intelectual, os esportes, etc., desde quem sem fins econômicos.

6) O reconhecimento de que, mesmo antes da mudança em questão, já havia para o Ministério Público, ao aprovar os estatutos de uma fundação, a obrigação de verificar se esta, a despeito das expressões formais que utiliza no texto estatutário, se coaduna com a noção de entidade de interesse social, sem fins econômicos ou lucrativos.

Em arremate, frisamos que, dentro dos parâmetros legais e doutrinários expostos, e sob o prisma de que uma fundação nasce sempre para beneficiar uma coletividade, por meio da dotação de bens livres destinados a uma finalidade eminentemente social, deverá o intérprete perquirir[12], em cada caso concreto, a possibilidade jurídica da instituição de determinada fundação, independentemente de conter em seu estatuto expressões “formais” pinçadas do texto legislativo atual.

2 - A Previsão de Finalidades Econômicas e o exercício de Atividade Econômica por Fundações visto sob a Ótica das Modificações trazidas pelo Novo Código Civil às Pessoas Jurídicas de Direito Privado

Não chega a ser incomum surgirem interessados em defender a possibilidade de se instituir fundações com fins econômicos, sob a justificativa de que o resultado desta seria inteiramente aplicado em finalidades de caráter social, invocando, em regra, dois argumentos principais: a ausência de vedação legal expressa e o princípio geral de atividade econômica insculpido no artigo 170, parágrafo único, da Constituição Federal, o qual estabelece: é assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos salvo nos casos previstos em lei.

Iniciando o exame desta questão, é preciso deixar claro, desde logo, que combatemos intransponivelmente tal entendimento, senão por sucumbir a uma análise mais profunda, à luz das mesmas fontes jurídicas invocadas para lhe dar sustentação, mas sobretudo porque, na prática, tem dado concretude a péssimos exemplos de fraudes à ordem jurídica (econômica, tributária, trabalhista, previdenciária,administrativa,etc.), viabilizando importações com isenção fraudulenta de impostos para o uso dos equipamentos em fins comerciais comuns; contratação mascarada de trabalhadores como “voluntários” ou “estagiários” em detrimento da abertura de vagas de trabalho regular e registro em carteira; desvio de receitas públicas e emprego de verbas de cunho social, obtidas com os incentivos fiscais e parafiscais usadas para o pagamento de despesas particulares de diretores e seus familiares; concorrência desleal frente ao comércio formal, etc, etc, etc....

Todas essas atividades acima mencionadas — verificadas por esta Promotoria de Justiça em casos práticos —, têm gerado nenhum ou insignificante retorno social frente aos benefícios obtidos com as renúncias e incentivos fiscais concedidos a essas entidades, razão pela qual vêm as mesmas sendo alvo de inquéritos civis e ações de intervenção e extinção de fundações, não raro quando o mal já se encontra irremediavelmente consumado, perdendo-se preciosos recursos que deveriam ser aplicados pelo governo na carente realidade social brasileira.

Mas, afinal, o que são fundações? A resposta a essa singela questão, que pode nos parecer, a princípio, óbvia, assume grande importância para a solução da temática proposta, conforme restará evidenciado.

O artigo 62 do Código Civil não oferece um conceito direto, mas a delineia da seguinte forma: Para criar uma fundação, o seu instituidor fará, por escritura pública ou testamento, dotação especial de bens livres, especificando o fim a que se destina, e declarando, se quiser, a maneira de administrá-la.

Segundo Pontes de Miranda, fundação é “uma universalidade de bens personalizada em atenção ao fim que lhe dá unidade”.

Para Clóvis Bevilaqüa: “uma universalidade de bens personalizada, em atenção ao fim, que lhe dá unidade ou um patrimônio transfigurado pela idéia, que o põe ao serviço de um fim determinado.”

Ao lado das clássicas definições, Carvalho de Mendonça, também: “o patrimônio que compõe a fundação pertence à sociedade ou a uma parcela desta, pois quando a pessoa jurídica fundacional (patrimônio destinado a um fim social) adquire personalidade (no momento em que ocorrer o registro no cartório de registro civil das pessoas jurídicas) aqueles bens que passaram a constituir a fundação se desvincularam totalmente do instituidor — surge uma pessoa nova, um novo sujeito de direitos e obrigações, o qual não detém, por si, capacidade para exercitar direitos ou cumprir tais obrigações, de vez que o próprio patrimônio é também a pessoa (não pertencendo ao instituidor, ou aos membros de sua administração, nem ao Estado, tampouco ao seus usuários), necessitando, assim, de uma assistência diferenciada por parte do Estado, uma vez que é público objetivo e indeterminado o “dono” do patrimônio.”[13]

Maria Helena Diniz[14], modernamente, conceitua fundações particulares como “universalidades de bens, personalizadas pela ordem jurídica, em consideração a um fim estipulado pelo fundador, sendo este objetivo imutável e seus órgãos servientes, pois todas as resoluções estão delimitadas pelo instituidor.”

José Eduardo Sabo Paes[15] anota que as fundações, historicamente, procuram beneficiar a coletividade por meio de finalidades eminentemente sociais. A vontade dos instituidores deverá sempre estar ligada a um interesse geral, uma vez que os destinatários dos benefícios que uma fundação pode prestar são, de uma maneira geral, a própria sociedade ou comunidade em que ela se inserir.

Assim, podemos concluir, com Tomás Aquino Resende[16], que uma fundação é um patrimônio que se transforma em pessoa jurídica, patrimônio este que pertence à sociedade desvinculando-se de seu instituidor e passando ao domínio público, em razão de sua finalidade social; complementam ou substituem a atividade governamental; prestam serviços de forma desinteressada, com a predominância do interesse público, em caráter gratuito e sem fins lucrativos e o fazem dentro dos objetivos e finalidades estabelecidas pelo instituidor; sua estrutura deve ser organizada, de forma a tornar possível a consecução das finalidades estabelecidas, pois os fins, na pessoa fundacional, são perenes e imutáveis na sua essência; como cooperam com a organização estatal no atendimento à coletividade, recebem benefícios e isenções tributárias, merecendo um especial tratamento por parte do Estado.

Nesse passo, e delineadas as noções principais da figura fundacional, como uma universitas bonorum[17] é preciso, então, situá-las no plano jurídico geral, quanto às funções e capacidade das pessoas jurídicas:

Segundo a classificação adotada por Maria Helena Diniz:

As pessoas jurídicas de direito privado, instituídas por iniciativa de particulares, conforme o art. 44, I a III, do Código Civil, dividem-se em: fundações particulares, associações, sociedades (simples e empresárias) e, ainda, partidos políticos (Lei nº 9.096/95, art. 1º, CF, art. 17, I a IV, §§1º a 4º; Decreto n. 4.199/2002; CC, arts. 2.031 a 2.034), que, atualmente, ante o disposto na Carta Magna (art. 17, §2º), têm a natureza de associação civil, sendo pessoa jurídica de direito privado.

O Código Civil atual, em seu artigo 53, estabelece que as associações são entidades constituídas para fins não econômicos e coerentemente com esta disposição, o parágrafo único do artigo 53, prevê que não existe entre os associados, direitos e obrigações recíprocas, o que seriam caracterísicas próprias das sociedades.

A sociedade simples (sociedade civil), tratada pelos artigos 997 a 1.038 do CC, segundo Maria Helena Diniz[18], “ é a que visa fim econômico ou lucrativo, que deve ser repartido entre os sócios, sendo alcançado pelo exercício de certas profissões ou pela prestação de serviços técnicos.” (grifos meus)

Por sua vez, as sociedades empresárias (sociedades mercantis) são aquelas “que visam lucro, mediante exercício de atividade mercantil.”

A partir da nova normatização civil, depreende-se que as sociedades passam a ter finalidade, exclusivamente, econômica ou lucrativa, não mais se assemelhando à noção de associações, estas como entidades destinadas ao desenvolvimento de finalidades de interesse social, e aquelas, visando, sempre, objetivos econômicos ou lucrativos.

Nesse passo, à luz dos dispositivos expostos, posicionamo-nos no sentido de que as fundações, ao lado das associações, ocupam a posição legal de pessoas jurídicas de direito privado sem fins econômicos ou lucrativos, configurando-se como entidades de interesse social.

Pois bem, delimitado-se que as fundações não possuem fins econômicos, a primeira observação a ser feita é a de que embora as fundações também não visem a aferição de lucro, já que o seu patrimônio é especialmente vinculado à consecução dos objetivos de caráter social propostos pelo instituidor, tem-se que não há vedação alguma quanto à obtenção de superávit a ser reaplicado nas próprias finalidades fundacionais e no fortalecimento da estrutura patrimonial.

A respeito, vale anotar:

“Tanto o lucro como o superávit podem ser definidos como o resultado econômico-financeiro positivo de uma atividade, apurado em um determinado período. A distinção entre um e outro não reside na forma de apuração, que em termos simples é a diferença entre as receitas e as despesas, mas na natureza e finalidade do ente que auferiu o resultado positivo. O superávit é típico das entidades que têm por objetivo gerir recursos para a consecução suas atividades finalísticas, de interesse social. É a diferença entre a captação de recursos, quer por meio de doações ou prestação de serviços, quer por quaisquer outros meios lícitos, e a despesa realizada em prol de seus fins. Não é objetivo da entidade de interesse social o atingimento do superávit em si, mas este é conseqüência, uma sobra a ser utilizada no desenvolvimento de suas atividades em benefício da sociedade”.[19]

Todavia, ressalta-se que os fins econômicos são a ela estranhos, quer porque o legislador civil delimitou, ainda mais, as formas jurídicas próprias para a consecução das finalidades econômicas (sociedades simples e empresárias), quer porque a finalidade econômica se afasta inteiramente do espírito do instituto, voltado à consecução de fins de caráter geral e de interesse social e, sobretudo, dos objetivos buscados pelo constituinte ao conceder a essas entidades um tratamento fiscal diferenciado para fomentar as atividades sociais para as quais estão essencialmente vocacionadas.

Em suma, a essência diferenciada da fundação — reconhecida e levada em conta pela própria Constituição Federal ao abrigá-la do poder tributário do Fisco — não permite que, de forma conflitante com a posição adotada pelo constituinte, venha a entidade a atuar, competitivamente, no mesmo campo destinado a outras figuras jurídicas de direito privado, conquanto estas não gozem do mesmo tratamento que lhe é proporcionado.

Trata-se da simples aplicação do princípio constitucional da isonomia.

Ora, buscando os próprios princípios gerais que informam a atividade econômica, inseridos no artigo 170 da Constituição Federal, constata-se que um dos pilares da organização econômica do país reside na livre concorrência, o que pressupõe, para o Estado, a vedação da intervir na atividade econômica em favor de entes particulares em detrimento de outros.

Pois bem, o Estado, objetivando fortalecer essas entidades de interesse social e garantir-lhes condições de estabilidade e transparência, diante da alta função social que desempenham, concede-lhes favores ou concessões especiais[20], em reconhecimento aos serviços prestados em fins humanitários e sociais a que se dedicam.

Como precisamente colocado pelo Promotor de Justiça paranaense Divonzir José Borges, em seu artigo “Fiscalizando as Fundações e Entidades Sem Fins Lucrativos”[21]:

“Para o fomento das políticas públicas de enfrentamento da pobreza, utiliza-se também o Estado do instituto da renúncia de receita. A renúncia de receita, também nominada doutrinariamente de renúncia fiscal ou gasto tributário[22], corresponde a uma abdicação, integral ou parcial, de tributos incidentes sobre produtos, serviços e rendas. Desta forma, os valores não recolhidos aos cofres públicos equivalem a uma transferência desses recursos às instituições assistenciais. Em contrapartida, as entidades beneficiadas com o incentivo fiscal[23] devem aplicar integralmente ditos recursos[24], mediante a prestação de serviços assistenciais, baseados na ética, transparência e responsabilidade à comunidade que deles necessitam. O Estado deixa de receber o valor da arrecadação renunciada, porém não abre mão da contrapartida social que a receita deve proporcionar à população[25]. A renúncia fiscal vem sempre acompanhada de algum objetivo a atingir.”

Nesse prisma, ainda que reconheçamos que o direito é em si lacunoso, especialmente no que se refere à matéria fundacional, temos que, se a fundação se lança na prática de atividades econômicas — ainda que não distribua lucros —haverá que fazê-lo par e passo, em igualdade de condições com as demais pessoas jurídicas de direito privado que exercem atividades econômicas, sob pena de ferir o princípio da isonomia e especialmente o da livre concorrência, este último erigido na mesma seara constitucional com a qual os interessados, no caso “sub judice”, pretendem defender a existência de fundações com fins econômicos.

De outro vértice, no que tange ao exercício de atividades econômicas, conforme precisamente colocado por José Eduardo Sabo Paes, nos parece bastante pertinente a seguinte ilação:

Admite-se, no entanto, a realização de atividades econômicas por parte das fundações. Primeiro, quando elas sejam necessárias para o melhor cumprimento dos seus fins estatutários e estejam a eles (fins) diretamente ligadas; segundo, quando a fundação seja acionista ou cotista de uma sociedade comercial. [26] (grifos meus)

De qualquer modo, a realização de atividade econômica ou de caráter industrial por uma fundação, mesmo quando ligadas diretamente às finalidades essenciais da fundação (fins sociais), é de ser vista com a máxima cautela e em caráter extremamente excepcional, em cada caso concreto, na medida em que tem sido fonte de desvirtuamento do instituto e de fraudes à ordem jurídica, lembrando que a questão tem sido encontrada na jurisprudência, justamente, quando há discussão inerente ao alcance das imunidades constitucionais e isenções tributárias de que gozam estes entes jurídicos, não raro por representarem o completo desvirtuamento do instituto fundacional.

No caso em mesa, verifica-se que a interessada dispõe em seu estatuto que “para atingir os seus objetivos, a FUNDAÇÃO CANAL LARANJA poderá colocar o seu Patrimônio a trabalhar em atividades econômicas, sendo os seus resultados canalizados para suas finalidades de Assistência Social, podendo concomitantemente as atividades econômicas serem coincidentes com as mesmas finalidades.”

O que primeiro chama à atenção neste caso, é o fato de consignar, expressa e genericamente, no próprio texto estatutário, que a fundação poderá colocar o seu patrimônio para trabalhar em atividades econômicas.

A segunda anotação, diz respeito à previsão de que estas atividades econômicas poderão ser, concomitantemente, coincidentes com as mesmas finalidades. Ou seja, através de um jogo de palavras, insere-se no conteúdo da norma que a fundação poderá ter também finalidades econômicas, as quais coincidirão com as próprias atividades econômicas representadas.

Ora, ao se inserir no texto do estatuto que a entidade possui caráter assistencial — a qual gozaria de imunidades sobre o patrimônio, a renda ou serviços prestados — e ao mesmo tempo estabelecer que poderá exercer atividades econômicas (coincidentes ou não com suas finalidades), pretende a interessada receber um salvo conduto para empreender em sua atividade principal (canal de rádio ou televisão) a prática da concorrência desigual e desleal.

Assim sendo, a previsão “sub examen” não se coaduna com a forma jurídica fundacional, a qual não comporta a finalidade econômica vislumbrada no texto da proposta de reforma estatutária.

3 - A Previsão de adeqüação das Entidades Funcionais já existentes à disciplina do Novo Código Civil (artigos 2.031 à 2.033).

O estudo que vem sendo feito acerca da proposta de alteração estatutária apresentada — no que diz respeito às finalidades das fundações—, enseja ainda o exame da adequação dos estatutos estatutários das entidades fundacionais constituídas antes da vigência do novo Código Civil, com as modificações dele advindas, à luz dos dispositivos supracitados, inseridos nas Disposições Transitórias.

Para tanto, iniciamos por transcrever as disposições pertinentes, aonde se destacam as particularidades relevantes para a presente análise.

O artigo 2.031 estabelece:

“As associações, sociedades e fundações, constituídas na forma as leis anteriores, terão o prazo de um ano para se adaptarem às disposições deste Código, a partir de sua vigência; igual prazo é concedido aos empresários.”

Por sua vez, o artigo 2.032 prevê o seguinte:

“As fundações, instituídas segundo a legislação anterior, inclusive as de fins diversos dos previstos no parágrafo único do art. 62, subordinam-se quanto ao seu funcionamento, ao disposto neste Código”.

Dispõe o artigo 2.033:

“Salvo o disposto em lei especial, as modificações dos atos constitutivos das pessoas jurídicas referidas no art. 44, bem como a sua transformação, incorporação, cisão ou fusão, regem-se desde logo por este Código.”

Pois bem, na situação em comento, a entidade fundacional pretende a reforma dos seus estatutos sob a justificativa de que necessita adequar as suas finalidades, e demais disposições, às regras previstas na lei substantiva civil.

Especificamente, sobre a necessidade ou possibilidade de adequação dos fins de uma fundação já constituída antes da vigência do novo Código Civil, a alguma das finalidades elencadas no parágrafo único do artigo 62, entendemos que a modificação não é exigível, e sequer permitida.

Com efeito, é preciso ressaltar, mais uma vez, que as fundações são entidades jurídicas particularizadas e distintas das associações e sociedades, a primeira como “acervo de bens livres que recebe da lei a capacidade jurídica para realizar as finalidades pretendidas pelo seu instituidor, em atenção aos seus estatutos” [27], enquanto que as últimas giram em torno de um elemento pessoal, de idéias e esforços dos seus integrantes.

Relembrando o que dispõe o artigo 62, quanto à instituição de uma fundação, para criá-la, o seu instituidor fará, por escritura pública ou testamento, dotação especial de bens livres, especificando o fim a que se destina, e declarando, se quiser, a maneira de administrá-la.

Estão presentes no momento da criação de uma fundação, portanto: a vontade do instituidor e os bens destinados a atendê-la.

Dessa ilação, extraída diretamente do texto legislativo, decorrem duas conseqüências já conhecidas a respeito das fundações: a) a disposição de vontade inicial quanto às finalidades, feita no ato de sua criação, possui caráter de permanência, não podendo ser modificada na sua essência; b) a inalienalibilidade dos bens que compõem o patrimônio fundacional, em atenção à sua certa e determinado destinação.

É insofismável que esta inalienabilidade, de natureza legal, sofre, nos casos concretos e em caráter excepcional alguma relativização, como anota José Eduardo Sabo Paes[28]:

“Segundo os tribunais,“os bens das fundações são normalmente inalienáveis, porque representam a concretização dos fins preestabelecido pelos respectivos instituidores, não tendo os seus administradores qualidade para alterar o imperativo da vontade daqueles “(RT 252/661). Note-se, porém que essa inalienabilidade é simplesmente relativa, não tendo caráter absoluto.(...)

A orientação jurisprudencial nesse campo manifesta-se pela relativa inalienabilidade dos bens fundacionais. Caso os mesmos sejam vendidos, exigem os tribunais a aplicação do preço na aquisição de outros bens, que deverão ficar igualmente destinados ao mesmo fim (ct RT 116/650, 138/18, 149/580, 126/127 e 242/232).”

A venda desses bens estará, portanto, sempre condicionada à necessidade, essa decisão será submetida ao Promotor de Justiça com atribuições para velar pelas Fundações, ao qual “caberá assegurar-se que a venda do bem é indispensável para a existência e/ou continuidade das atividades da fundação, exigindo até a sua sub-rogação ou substituição por outro (s) bem(ns) destinado (s) ao mesmo fim”.[29]

O patrimônio de uma fundação, no entanto, estará sempre afetado às finalidades para as quais esta é instituída.

A instituição de uma fundação, no dizer de Arnaldo Rizzardo: “Envolve a destinação de um acervo de bens, que se reveste, por força da lei, de capacidade jurídica para realizar finalidades pretendidas pelo instituidor.”[30]

Como vasos comunicantes, as finalidades e o patrimônio encontram-se vinculados desde o momento da criação da fundação.

Assim sendo, ocorre também uma espécie de preclusão temporal, ligada ao momento consumativo do nascimento da pessoa jurídica fundacional (registro da escritura e dos estatutos), a impedir, sobremaneira, posterior alteração das finalidades de uma fundação.

A ilação também é válida quando estivermos diante de uma fundação instituída por testamento, sobretudo se considerarmos que, quanto às disposições testamentárias, a vontade do testador é absoluta, excetuada apenas a parcela referente à legítima.

Nesse sentido, cabe lembrar, novamente, os ensinamentos de José Eduardo Sabo Paes, tendentes a balizar os limites a que estão sujeitas as alterações estatutárias das fundações:

“Estatuto é norma essencial e perene para a entidade. Todavia, circunstâncias posteriores à instituição da entidade, e apenas constatadas no decorrer do seu funcionamento, podem fazer com que seja absolutamente necessária a reforma ou alteração de dispositivos do estatuto, tendo sempre como último escopo a preservação do seu patrimônio e o aperfeiçoamento e mantença das suas finalidades.” [31]

E prossegue:

“Os fins ditados pelo instituidor também não podem ser desvirtuados ou entregues ao arbítrio dos administradores, uma vez que em sede fundacional não existe a liberalidade de modificações ou alterações dos próprios fins, mesmo implicitamente, sob pena d caracterizar o denominado desvio de finalidade.

Não são admissíveis, portanto, alterações estatutárias dos fins da fundação distanciadas ou contrarias aos propósitos do(s) fundador(es).”

Tais colocações são efetuadas em caráter preliminar com o escopo de embasar o posicionamento ora adotado, de que as alterações introduzidas no parágrafo único do artigo 62 do novo Código Civil não atingem as fundações regularmente instituídas antes da sua vigência, no que tange às suas finalidades.

Esse entendimento é sustentado, ainda, pela própria interpretação literal do artigo 2.033, o qual especifica que a subordinação das fundações instituídas antes do novo Código, se referem ao funcionamento dessas entidades, inclusive daquelas que tinham fins diversos dos agora previstos no parágrafo único do art. 62.

Trata-se, também, de uma norma que especifica o que prevê o dispositivo anterior — art. 2.031 — , de conteúdo mais genérico, a qual pretendeu deixar assente qual a extensão da primeira regra quanto as fundações (interpretação sistemática).

Assim, concluímos que as fundações já instituídas — independentemente dos fins já previstos — deverão se adequar as normas do novo Código no que diz respeito tão-somente ao seu funcionamento.

De outro vértice, essa diferenciação quanto às fundações não foi feita claramente em face do artigo 2.033, o qual dispõe que, salvo o disposto em lei especial, as modificações dos atos constitutivos das pessoas jurídicas referidas no art. 44 (sociedades, associações, fundações), bem como a sua transformação, incorporação, cisão ou fusão, regem-se desde logo por este Código.

Se considerarmos como atos constitutivos a escritura pública e os estatutos da fundação, como visto, a primeira não pode mais ser alterada, e as normas estatutárias, serão passíveis de mudança apenas em algumas hipóteses, dentre as quais não se insere a restrição de finalidades.[32]

Outrossim, há que se considerar que não se aplicam às fundações, os institutos da transformação, da incorporação, cisão total ou fusão.

Nessa perspectiva, entendemos que as regras em relação as quais deverão as fundações já constituídas se adequar, dizem respeito às previsões passíveis de serem alteradas e que sejam pertinentes ao seu funcionamento, tais como, os artigos 67 e 68.

4 - Conclusão

Do exposto, concluímos que as fundações por nascerem da colocação espontânea de um patrimônio para servir à sociedade, alcançando finalidades essencialmente sociais, sem fins lucrativos ou econômicos, deverão buscar a sua viabilidade econômico-financeira de forma compatível com a natureza jurídica da entidade. Ou seja, através da própria dotação inicial de bens e das fontes de recursos previstas no estatuto que garantam a sua sustentabilidade, tais como, rendas sobre o seu patrimônio, doações, legados, convênios, acordos, termos de cooperação, contribuições, subvenções.

Sobretudo após as modificações introduzidas pelo novo Código Civil, as fundações, ao lado das associações, se distanciam ainda mais das entidades que objetivam fins econômicos, valendo registrar que, apesar da interpretação a ser dada ao parágrafo único do artigo 62 deva focar o interesse público, não há como negar o caráter restritivo desta norma, em face das inúmeras facetas que esses entes têm tomado nos últimos tempos, muito distantes da concepção original da pessoa jurídica fundacional.

A análise da viabilidade de instituir-se uma fundação privada, à luz do novo Código Civil, dependerá do exame de cada caso concreto, com vistas em toda a legislação que a envolve, não se atendo apenas aos requisitos formais de sua constituição propriamente dita, mas também o tratamento constitucional dado pelo Estado e o papel social que a justifica.

Com efeito, na tendência imposta ao Estado moderno na busca de novas estruturas de atendimento das questões sociais, a sua descentralização administrativa encontra nas organizações privadas de interesse público (Terceiro Setor), o caminho propício para a consecução dos mandamentos constitucionais que asseguram a dignidade humana, a cidadania plena e a justiça social, vez que essas entidades, constituem-se sem finalidades econômicas ou lucrativas, para prestar serviços de relevância pública, desenvolvendo ações públicas não estatais.

Por fim, temos que as modificações introduzidas junto ao novo Código, não implicam em alterações de finalidades das fundações já constituídas, exceto para aquelas entidades que, porventura, tenham sido instituídas para atingir fins econômicos, as quais encontram, nesta oportunidade, o momento adequado para a redefinição do seu papel social, nos moldes da nova ordem jurídica.

Curitiba, 10 de junho de 2003.

Cibele Cristina Freitas de Resende
Promotora de Justiça

Ataulização: Damtom G P Silva ( )

Quais são as pessoas jurídicas de direito privado segundo o Código Civil?

São pessoas jurídicas de direito privado: as associações; as sociedades e as fundações. Iniciam sua personalidade jurídica com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro, precedida, quando necessário, de autorização do Poder Executivo. Ver artigo 44 e seguintes do Código Civil.

Quais as pessoas jurídicas de direito privado descritas no Código Civil e suas principais características?

As pessoas jurídicas de direito privado estão elencadas no artigo 44. I – as associações; II – as sociedades; III – as fundações*.

Quais as principais classificações das pessoas jurídicas no Código Civil?

As pessoas jurídicas classificam-se, de acordo com o artigo 40 do Código Civil, em pessoa jurídica de direito público, podendo esta ser de direito público interno ou externo (internacional), e pessoa jurídica de direito privado.

Quais são as pessoas jurídicas de direito público e privado?

Conforme o artigo 40 do Código Civil brasileiro de 2002, as pessoas jurídicas (admitidas pelo Direito brasileiro) são de direito público (interno ou externo), como fundações públicas e autarquias, e de direito privado, como associações e organizações religiosas.