Qual o conceito de principal estabelecimento para fins de definição do juízo competente do processo falimentar?

Processo
CC 163.818-ES, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 23/09/2020, DJe 29/09/2020
Ramo do Direito
DIREITO PROCESSUAL CIVIL, DIREITO FALIMENTAR
Tema
Juízo falimentar e recuperação judicial. Competência absoluta. Principal estabelecimento do devedor. Momento da propositura da ação.
Destaque
É absoluta a competência do local em que se encontra o principal estabelecimento para processar e julgar pedido de recuperação judicial, que deve ser aferido no momento de propositura da demanda, sendo irrelevantes para esse fim modificações posteriores de volume negocial.
Informações do Inteiro Teor
O Juízo competente para processar e julgar pedido de recuperação judicial é aquele situado no local do principal estabelecimento (art. 3º da Lei n. 11.101/2005), compreendido este como o local em que se encontra “o centro vital das principais atividades do devedor”.
Embora utilizado o critério em razão do local, a regra legal estabelece critério de competência funcional, encerrando hipótese legal de competência absoluta, inderrogável e improrrogável, devendo ser aferido no momento da propositura da demanda – registro ou distribuição da petição inicial.
A utilização do critério funcional tem por finalidade o incremento da eficiência da prestação jurisdicional, orientando-se pela natureza da lide, assegurando coerência ao sistema processual e material.
Destaca-se que, no curso do processo de recuperação judicial, as modificações em relação ao principal estabelecimento, por dependerem exclusivamente de decisões de gestão de negócios, sujeitas ao crivo do devedor, não acarretam a alteração do juízo competente, uma vez que os negócios ocorridos no curso da demanda nem mesmo se sujeitam à recuperação judicial.
Assim, conclusão diversa, no sentido de modificar a competência sempre que haja correspondente alteração do local de maior volume negocial, abriria espaço para manipulações do Juízo natural e possível embaraço do andamento da própria recuperação. Com efeito, o devedor, enquanto gestor do negócio, detém o direito potestativo de centralização da atividade em locais distintos no curso da demanda, mas não o poder de movimentar a competência funcional já definida. Do contrário, o resultado seria o prolongamento da duração do processo e, provavelmente, a ampliação dos custos e do prejuízo dos credores, distorcendo a razão de ser do próprio instituto da recuperação judicial de empresas.

Qual o conceito de principal estabelecimento para fins de definição do juízo competente do processo falimentar?

Segundo o art. 3º da Lei 11.101/2005 (Lei de Falência e Recuperação de Empresas), “é competente para homologar o plano de recuperação extrajudicial, deferir a recuperação judicial ou decretar a falência o juízo do local do principal estabelecimento do devedor ou da filial de empresa que tenha sede fora do Brasil”.

O conceito de principal estabelecimento, todavia, não corresponde à noção geral que a expressão suscita inicialmente. De fato, quando se fala em principal estabelecimento, vem em nosso pensamento, de imediato, a ideia de sede estatutária/contratual ou matriz administrativa da empresa. Trata-se, porém, de noção equivocada. Para o direito falimentar, a correta noção de principal estabelecimento está ligada ao aspecto econômico: é o local onde o devedor concentra o maior volume de negócios, o qual, frise-se, muitas vezes não coincide com o local da sede da empresa ou do seu centro administrativo. Nesse sentido, confiram-se os seguintes acórdãos do Superior Tribunal de Justiça:

(…) O juízo competente para processar e julgar pedido de falência e, por conseguinte, de concordata é o da comarca onde se encontra “o centro vital das principais atividades do devedor” (…) A competência do juízo falimentar é absoluta. (…) (STJ, CC 37.736/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ 16.08.2004, p. 130).

(…) Competente para o processamento e julgamento do pedido de falência é o Juízo do local onde o devedor mantém suas atividades e seu principal estabelecimento. (…) (STJ, AgRg no AG 451.614/DF, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ 17.02.2003, p. 275).

(…) A competência para o processo e julgamento do pedido de falência é do Juízo onde o devedor tem o seu principal estabelecimento, e este “é o local onde a atividade se mantém centralizada”, não sendo, de outra parte, “aquele a que os estatutos conferem o título principal, mas o que forma o corpo vivo, o centro vital das principais atividades do devedor” (…) (STJ, CC 27.835/DF, Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro, DJ 09.04.2001, p. 328).

Em suma, o STJ já decidiu que a expressão principal estabelecimento pode significar (embora os acórdãos sejam anteriores à LFRE, o entendimento continua atual): (i) o centro vital das principais atividades do devedor; (ii) local onde o devedor mantém suas atividades e seu principal estabelecimento; (iii) local onde a atividade se mantém centralizada. Nesse sentido, confira­se o Enunciado 465 do CJF: “Para fins do Direito Falimentar, o local do principal estabelecimento é aquele de onde partem as decisões empresariais, e não necessariamente a sede indicada no registro público”.

E há uma razão lógica para a regra do art. 3º da LFRE: é no local do principal estabelecimento do devedor onde se encontram, provavelmente, a maioria dos seus clientes e a maior parte do seu patrimônio, o que facilita sobremaneira a instauração do concurso de credores e a arrecadação dos seus bens. Por isso, ademais, que a competência em questão é de natureza absoluta.


Veja também:

  • Art. 101 da Lei de Falência e Recuperação de Empresas
  • Prazo de resposta do devedor empresário na Falência
  • Regras da LFRE
  • Nome empresarial
  • Governança Corporativa (Corporate Governance)
  • Informativo de Legislação Federal: resumo diário das principais movimentações legislativas.

Conheça as obras do autor (Clique aqui!)

TAGS

LEIA TAMBÉM

Usamos cookies em nosso site para fornecer uma experiência mais relevante, lembrando suas preferências e visitas. Ao clicar em “Permitir todos”, você concorda com o uso de TODOS os cookies. No entanto, você pode visitar "Configurações de cookies" para fornecer um consentimento controlado.

Como definir o principal estabelecimento para a propositura da ação falimentar?

Para o direito falimentar, a correta noção de principal estabelecimento está ligada ao aspecto econômico: é o local onde o devedor concentra o maior volume de negócios, o qual, frise-se, muitas vezes não coincide com o local da sede da empresa ou do seu centro administrativo.

Qual o juízo competente para ingressar com o processo falimentar?

A competência para os processos de falência, de recuperação judicial e homologação de recuperação extrajudicial, bem como para seus incidentes, é do juízo do principal estabelecimento do devedor (LF, art. 3.º).

Qual a competência do juízo falimentar?

“Art. 76. O juízo da falência é indivisível e competente para conhecer todas as ações sobre bens, interesses e negócios do falido, ressalvadas as causas trabalhistas, fiscais e aquelas não reguladas nesta Lei em que o falido figurar como autor ou litisconsorte ativo.

O que se entende por principal estabelecimento?

Como solução ao problema levantado entende-se como principal estabelecimento o local em que se tem o maior montante de negociações da empresa em ação falimentar.