Como o Rio de Janeiro era conhecido?

O período da história republicana do Brasil, envolto na República Oligárquica, foi marcado por tentativas de reurbanização modernizadora de algumas cidades. O caso mais notório foi a reurbanização do Rio de Janeiro, ocorrida na última década do século XIX e nas primeiras do século XX.

Entretanto, se a modernização significava o embelezamento da cidade, na prática ela proporcionou a expulsão de boa parte da população pobre e trabalhadora da região central da capital do Brasil.

A reurbanização do Rio de Janeiro se inseria em uma política de transformação da capital federal, com vistas à erradicação de várias epidemias e de embelezamento urbano afrancesado, criando assim um melhor cartão de visitas aos visitantes estrangeiros interessados em investimentos no Brasil. A principal ação nesse sentido se deu no governo do presidente Rodrigues Alves (1902-1906), cuja proposta de reforma da capital envolvia três frentes de trabalho: a modernização do porto, a reforma urbana e o saneamento básico.

Nas ações de saneamento básico, fazia-se necessário na cidade erradicar diversas epidemias decorrentes da má qualidade sanitária na cidade, principalmente na região central.

Habitada por aproximadamente um milhão de pessoas no início do século XX, a capital federal era alvo constante de surtos de febre amarela, peste bubônica, malária e varíola. A solução proposta, além das vacinações obrigatórias e da fiscalização compulsória das residências, era a demolição das habitações coletivas existentes na cidade, como cortiços, estalagens e casas de cômodos.

O argumento era que, em face das condições insalubres, as habitações coletivas eram propícias à propagação de doenças. O cortiço Cabeça de Porco chegou a ter 2000 habitantes. A isso somava a visão conservadora e moralizadora sobre a vida desses estratos da população.

Everardo Beckheuser, na obra Habitações populares, de 1906, definia da seguinte forma essa situação: “E assim reunida, aglomerada, essa gente, trabalhadores, lavadeiras, costureiras de baixa freguesia, mulheres de vida reles, entopem ‘as casas de cômodos’, velhos casarões de muitos andares, divididos e subdivididos por um sem número de tapumes de madeira, até nos vãos de telhados, entre a cobertura carcomida e o ferro carunchoso. Às vezes, nem as divisões de madeira; nada mais que sacos de aniagem estendidos verticalmente em septo, permitindo quase a vida em comum, em uma promiscuidade de horrorizar”.

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Essa ação ia ao encontro dos objetivos da classe dominante da cidade, desejosa de expulsar da área central a população pobre e explorada da capital, considerada um elemento perigoso para a ordem e disciplina urbana almejada. A maior parte dessa população era formada por ex-escravos africanos e imigrantes, principalmente portugueses.

As demolições dos casarões foram realizadas sem o consentimento dos habitantes e sem o pagamento de indenizações, obrigando os moradores a encontrarem novos locais para a construção de suas habitações. Isso ocorreu principalmente nos morros arredor da região central, onde foram construídos barracões de madeiras, que deram origem às favelas cariocas.

Como o Rio de Janeiro era conhecido?

As favelas foram uma das consequências da reurbanização do Rio de Janeiro no início do século XX

Sobre os escombros dos casarões derrubados, grandes avenidas foram construídas, em uma tentativa de assemelhar a cidade do Rio de Janeiro à capital francesa, Paris. Na década de 1870, Paris passou por uma reformulação urbana com a criação de grandes bulevares, praças e jardins, sob a liderança do barão Haussmann, então prefeito da cidade.

No Rio de Janeiro tal iniciativa coube ao engenheiro Pereira Passos, prefeito do Rio de Janeiro entre 1902 e 1906. Com plenos poderes dados pelo presidente Rodrigues Alves, Passos promoveu uma profunda reformulação urbana, cujos principais exemplos foram a construção da Avenida Central, a reforma do porto e a iluminação pública. Construíram-se luxuosos palacetes, praças e jardins no lugar de 600 edificações.

O processo de reurbanização do Rio de Janeiro exemplifica o aspecto autoritário e excludente das políticas estatais verificadas durante a República Oligárquica, expulsando da área de expansão da modernidade capitalista os grupos sociais considerados perigosos à ordem. Porém, esses grupos não aceitariam passivamente a situação, e a Revolta da Vacina de 1904 deu mostras da resistência da população explorada do Rio de Janeiro a essa situação.

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Quartel general e o Morro da Providência em 1900 (Foto: Anônimo)

Tão marcantes como o Cristo ou o Pão de Açúcar na paisagem carioca, as favelas se espalham pelo cenário do Rio. Hoje, são cerca de 763, segundo dados do Instituto Pereira Passos (IPP). Na série de reportagens em homenagem aos 450 anos da cidade, o G1 conta nesta segunda-feira (12) a história da primeira favela carioca, o Morro da Providência, que ganhou seus primeiros barracos há quase 120 anos.

Dois fatores históricos importantes contribuíram para as primeiras ocupações na região: o grande número de soldados vitoriosos da Guerra de Canudos, que desembarcaram no Rio em 5 de novembro de 1897 sem moradia, e a grande concentração de negros que lotavam a cidade após a abolição da escravatura.

Com a lei do ventre livre em 1871, a cidade do Rio se encheu de ex-escravos em busca de trabalho. Nessa época começam a surgir uma grande quantidade de cortiços na região Central, que até então era considerada área nobre da cidade e se tornou uma importante região de concentração de trabalho com a construção da Central do Brasil, em 1858.

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Cortiço conhecido como Cabeça de Porco abrigava cerca de 4 mil pessoas (Foto: Marc Ferrez)

Mansões que não tinham mais como se sustentar sem os escravos foram transformadas em casas de cômodo. Na mesma época, na segunda metade do século 19, surgiu o maior e mais famoso cortiço da cidade, o “Cabeça de Porco”. “Era um cortiço monumental, com quatro mil residências. O local exato onde ele ficava é onde existe hoje o Túnel João Ricardo, ao lado da Central do Brasil”, ressalta o historiador Milton Teixeira.

O Cabeça de Porco foi destruído em 1893 por ordem do prefeito Cândido Barata Ribeiro, fazendo com que muitas famílias fossem para a travessa Felicidade. Justamente nessa região teve início a primeira comunidade, então denominada “Morro da Favela”.

A origem do termo surgiu após a Guerra de Canudos, onde ficava o Morro da Favela original, graças a uma planta conhecida como faveleira, farta no local. Alguns dos soldados, ao regressarem vitoriosos ao Rio em 1897, não receberem o prometido soldo e foram invadindo uma antiga chácara, com o apoio de um oficial, no Morro da Providência, que ganhou então o "apelido" referente a Canudos.

“Depois de uma confusão em que tentaram matar o prefeito, estabeleceu-se um caos, uma grande desordem. Em função disso, os soldados foram desmobilizados. Eles saem do Ministério do Exército desempregados e sem ter como viver. Atrás dali tinha o Morro da Providência e eles ocupam esse morro”, lembra Milton, ressaltando que nessa época a região já estava lotada de cortiços.

Mas foi com a total abolição da escravatura que a cidade ficou cheia e sem ter moradias para todos. “Todos os escravos do Vale do Paraíba – 200 mil – invadem a cidade do Rio de Janeiro. Aqui eles não tinham onde morar, começam a surgir os primeiros mendigos e o conceito de multidão”, explica o historiador.

O morro da Providência se tornou o local ideal para abrigar as famílias de baixa renda. Cercado de um lado por uma pedreira, fábricas e pelas linhas da Estrada de Ferro Central do Brasil, e tendo do outro um cemitério de protestantes e a região portuária, os terrenos estavam, então, bem desvalorizados e livres.

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As primeiras casas no Morro da Providência em 1905 (Foto: Renascença)

As primeiras casas da Providência começaram a ser construídas na parte baixa do morro, com o mesmo formato das casas existentes em Canudos. Atualmente, nenhuma dessas residências existe mais, pois essa parte do morro começou a ser explorada para a extração de pedras para as obras da região central da cidade.

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Aquela era a única favela autofágica do mundo, pois  consumia o próprio morro onde estava. Os moradores trabalhavam na pedreira que destruía o morro onde eles moravam"

Milton Teixeira, historiador

“Aquela era a única favela autofágica do mundo, pois consumia o próprio morro onde estava. Os moradores trabalhavam na pedreira que destruía o morro onde eles moravam”, afirma o historiador, lembrando que a pedreira foi explorada durante décadas até que, em 1968, uma explosão inesperada soterrou 36 pessoas. Os corpos dessas vítimas nunca foram localizados", conta o historiador.

Em 1904, o governo tentou a primeira remoção da favela da Providência, frustrada por uma revolta popular batizada de “Revolta da Vacina”, onde muitos favelados participaram combatendo as tropas do governo. Depois disso, a situação se acalmou. O próprio governo percebeu que aquela população era fundamental como mão de obra barata para trabalhar na pedreira, nas obras públicas, no cais do porto e nas fábricas e usinas da região.

Início do domínio do tráfico
A violência nas comunidades começou muitos anos depois. Segundo Milton Teixeira, na época da ditadura militar, o governo e a polícia denominavam o pobre e desempregado como “classe perigosa”. “Todo ser humano que não pertence ao estado ou à classe que apoia o estado é potencialmente culpado”. Mas é apenas no final da década de 70 que o tráfico começa a dominar os morros da cidade. Até então, essas regiões eram controladas por contraventores que exploravam o jogo do bicho.

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Vista aérea da operação contra o tráfico realizada pela Polícia Civil no Morro da Providência, na manhã do dia 4 de dezembro de 2014 (Foto: Carlos Eduardo Cardoso/Agência O Dia/Estadão Conteúdo)

Segundo Teixeira, uma série de fatores “empurraram” o tráfico para o morro. “A corrupção policial, o despreparo da polícia, que era mais preocupada em reprimir assuntos políticos do que a criminalidade, a extrema violência que chegou no asfalto... Quem viveu naquela época sabe que a polícia matava tudo que era bandido”, lembra, ressaltando que a conjuntura mundial também favoreceu a passagem do tráfico pelo Rio de Janeiro.

O período foi o apogeu do narcotráfico na Colômbia e o governo americano começou a treinar a sua polícia marítima, a guarda costeira americana, para fechar o Caribe como porta de entrada de drogas. “Com a rota do Caribe fechada, a rota do México fechada, eles encontraram uma rota para distribuir a droga pelo Brasil, encontrando um governo fraco, desorganizado, um país corrompido, muita miséria e área onde o governo não entrava”, explica o historiador.

Como o Rio de Janeiro era chamado?

A cidade recebeu o nome de São Sebastião do Rio de Janeiro, em homenagem ao rei de Portugal na época: dom Sebastião. E por que Rio de Janeiro? O nome tem origem em um engano dos portugueses: quando chegaram pela primeira vez à entrada da baía de Guanabara, em janeiro de 1502, pensaram que se tratava da foz de um rio.

Como o Rio de Janeiro era antigamente?

Capital da Colônia Até o final do século XVII, o Rio era uma cidade pequena que não tinha muito a oferecer. Era praticamente um local para o cultivo de cana de açúcar, e um porto para os escravos africanos desembarcarem na América do Sul. Além disso, durante o século XVII, muitas igrejas foram construídas.

Como era o Rio de Janeiro antes da família real?

O Rio era uma cidade de casas térreas simples, de ruas estreitas, boa parte delas carecendo de calçamento, ocupadas por escravos, libertos, brancos pobres, comerciantes, artesãos e uma pequena presença de senhoras brancas.

Como o Rio de Janeiro era conhecido no exterior antes das reformas urbanas?

Não sem motivo, inúmeros estrangeiros referiam-se à cidade – nada maravilhosa antes das reformas promovidas a partir de 1903 – com o nome de “cidade da morte” ou “porto sujo”. Muitas embarcações chegavam a evitar a Baía de Guanabara, com medo da contaminação. Para sempre em muitas vidas”.