Como podemos preservar as linguagens e culturas indígenas no Brasil?

Como podemos preservar as linguagens e culturas indígenas no Brasil?
Apresentação cultural de Kwakwaka (povos indígenas da costa noroeste do Pacífico) durante evento de alto nível para lançar Ano Internacional das Línguas Indígenas. Foto: ONU/Manuel Elias

Centenas de línguas ancestrais ficaram em silêncio nas gerações recentes, levando com elas a cultura, o conhecimento e as tradições das pessoas que as falavam. Para preservar e revitalizar aquelas que continuam existindo, as Nações Unidas deram início oficialmente na sexta-feira (1) ao Ano Internacional das Línguas Indígenas, na sede da ONU, em Nova Iorque.

Durante discurso de abertura do evento, um líder de uma comunidade Kahnawà:ke do Canadá prestou homenagem à Mãe Terra.

“Como indígenas, nossas línguas são as línguas da Terra. São essas línguas que usamos para falar com nossa Mãe”, disse Kanen’tó:kon Hemlock. “A saúde de nossas línguas está ligada à saúde da Terra”.

“Quando nossas línguas ficam em silêncio, perdemos nossa conexão e nossos meios antigos de conhecer a Terra”, afirmou, destacando que “pelo bem das gerações futuras, precisamos garantir que elas também possam falar a língua de nossos ancestrais”.

A presidente da Assembleia Geral da ONU, María Fernanda Espinosa, destacou a conexão íntima entre línguas indígenas e cultura e conhecimentos ancestrais, dizendo que estas “são muito mais do que ferramentas para comunicação, são canais para que legados humanos sejam transmitidos”.

“Cada língua indígena tem um valor incalculável para a humanidade”, disse, chamando cada uma de “um tesouro repleto de história, valores, literatura, espiritualidade, perspectivas e conhecimento, desenvolvido e colhido ao longo de milênios”.

“Quando uma língua morre, ela leva consigo toda a memória que está dentro dela.”

Línguas indígenas são símbolos da identidade de um povo, “vetores para valores, estilos de vida e expressões de suas ligações com a Terra”, afirmou a presidente da Assembleia Geral.

Línguas indígenas também abrem as portas para práticas e conhecimentos ancestrais, como em agricultura, biologia, astronomia, medicina e meteorologia. Embora ainda haja 4.000 línguas indígenas no mundo, muitas estão à beira da extinção.

“Este ano internacional tem o objetivo de servir como uma plataforma na qual possamos reverter a tendência alarmante de extinção de línguas indígenas”, para recuperá-las e preservá-las, incluindo por meio da implementação de sistemas de educação que favoreçam o uso de uma língua nativa, afirmou.

Por sua vez, o presidente da Bolívia, Evo Morales, falou sobre a sobrevivência de povos e línguas indígenas sob o jugo da colonização.

“Hoje viemos aqui tendo sobrevivido à era colonial que tentou colocar nossos anciãos de joelhos e esmagá-los com o peso da injustiça”, afirmou.

Morales pediu aos presentes para trabalharem juntos através de diálogo para promover políticas que possam ajudar a preservar vidas, identidades, valores e culturas indígenas.

Há 770 milhões de indígenas espalhados por 90 países, representando 6% da população global, vivendo em regiões ricas em biodiversidade, destacou o presidente boliviano. Ele lembrou que, ainda assim, a “ganância capitalista” deixou os indígenas entre os 15% mais pobres da população, afirmou.

Alertando que ganância está anexando ainda mais recursos indígenas, ele afirmou que há um “silêncio criminoso” por parte de líderes mundiais “no que diz respeito a se manifestar contra este fenômeno”, destacando a hipocrisia de falar aos povos indígenas sobre democracia e direitos humanos enquanto suas identidades e línguas são massacradas e sofrem risco de extinção.

“Língua é cultura, língua é uma expressão de uma cosmovisão e isso é uma maneira de ver o mundo”, disse. “Se línguas desaparecerem (…) as memórias que elas carregam irão desaparecer, assim como o povo”.

Encorajando todos a “preservarem o conhecimento e a sabedoria de nossos ancestrais”, Morales pediu que um novo paradigma seja introduzido — um paradigma que seja fruto de povos indígenas e “campeões da Mãe Terra”.

Os povos indígenas no Brasil e no mundo têm procurado jeitos de valorizar e fortalecer suas línguas.

Um desses jeitos é através da escola. Antes de conquistarem o direito de criar suas próprias escolas nas aldeias e de ensinar as suas línguas, os povos indígenas, por muito tempo, foram obrigados a falar o português. As crianças e jovens indígenas eram punidos quando falavam suas línguas nas escolas ou internatos criados por instituições não indígenas em diferentes momentos da história do país.

Depois de muita luta pelo reconhecimento dos direitos indígenas, esse quadro mudou. Hoje muitas escolas indígenas, construídas nas próprias aldeias, são formadas por professores indígenas e lá as crianças podem aprender a ler e escrever em suas línguas nativas.

Outro jeito de fortalecer as línguas indígenas é por meio de iniciativas relacionadas à pesquisa, documentação e registro escrito ou audiovisual de suas línguas e dos saberes que elas fazem circular. É o que alguns povos, como os Yawanawá, os Kanoê e os Paresi, têm feito com o apoio do Projeto de Documentação de Línguas Indígenas, do Museu do Índio/Funai.

A imagem a seguir é do encarte de um livro feito pelos Paresi sobre as narrativas antigas de seu povo que poderá servir como material didático em suas escolas.

Canção Kawaiwete

Veja essa canção de autoria de Wyra, Awasiuu, Tome e Jamanary do povo Kawaiwete que vive em Terras Indígenas no estado do Mato Grosso.

Os versos a seguir falam sobre a importância de se valorizar o idioma Kawaiwete.

Kawaiwete ramũ
Jane jemu’ei
Aipore pe
Jare je’enga re
Simuja’jaw
Ka’arana re
Jare je’nga jaw
Kawaiwete
Si mamuakat
Jare je’enga jaw
Kawaiwete ramũ
Jare je’enga jaw

Nós Kawaiwete
Nós estamos estudando
Na Aiporé
Sobre a língua
Para colocar
no papel
Sobre a língua
Kawaiwete
Para reforçar
nossa língua
Nós Kawaiwete
Sobre a língua

Campeonato na Língua Paumari

Os Paumari vivem no sul do estado do Amazonas e falam um idioma da família linguística Arawá. A partir da década de 2000, os Paumari enfrentaram transformações relacionadas à educação escolar nas aldeias que levaram a uma crescente desvalorização da sua língua. Os pais foram deixando de falar o idioma Paumari com os filhos e com o passar dos anos surgiu uma nova geração que não conhece essa língua e que se distanciou dos saberes de seu povo, transmitidos através do idioma indígena.

Como podemos preservar as linguagens e culturas indígenas no Brasil?
Crianças paumari. Foto: Oiara Bonilla

Essa situação criou uma ruptura entre as gerações: de um lado, os mais velhos, fluentes na língua indígena, e de outro, os adultos e jovens, que passaram a valorizar mais o português e a cultura urbana não-indígena. Outro fator que tem influenciado o abandono do seu idioma é a inexistência de escolas diferenciadas, isto é, escolas que realmente respeitem o modo de viver dos Paumari e que tenham à sua disposição materiais didáticos elaborados especialmente para essa cultura.

Para enfrentar a desvalorização da língua e a discriminação que sofrem nas cidades mais próximas de suas aldeias, os professores Paumari decidiram promover ações de fortalecimento do seu idioma, incentivando o interesse das novas gerações e aproximando os jovens dos mais velhos e dos conhecimentos do povo Paumari.

Em 2014, foi organizado um evento chamado de Campeonato da Língua Paumari que reuniu um grande número de pessoas das mais diferentes aldeias. Nesse encontro, os Paumari dividiram-se em times e cada um deles apresentou uma história da sua mitologia. Havia uma única regra: falar na língua indígena sem usar uma só palavra em português. Para contá-las ao público, os times produziram cartazes e desenhos, fizeram a leitura de textos e também pode-se ouvir os relatos orais dos mais velhos. À noite, foram organizados concursos de cantos na língua Paumari que também ajudaram a aproximar as diferentes gerações. Essa competição virou uma grande festa!

Assista ao vídeo do Primeiro Campeonato da Língua Paumari

Essa experiência deu tão certo que, em 2015, os Paumari realizaram o Segundo Campeonato da Língua Paumari na aldeia Santa Rita, Terra Indígena Paumari do Lago Marahã, na beira do Rio Purus, no Amazonas. A história vencedora da competição foi transformada em um desenho animado produzido pelos próprios Paumari que é falado na língua indígena e legendado em português.

Confira a animação Basori Varanihini Hida (A história do boto cor-de-rosa: a origem das plantas cultivadas), baseada na apresentação do grupo Jirikavahari da aldeia Ilha da Onça.

Como podemos preservar as línguas e a cultura indígena no Brasil?

“O papel das escolas indígenas para a preservação da cultura é fundamental. O fortalecimento dessas instituições faz com que novas gerações continuem a acessar a língua materna de seu povo e aprenda os elementos ligados à sua identidade”, afirma.

Como podemos preservar as línguas indígenas?

Como medida para reverter a extinção de muitas línguas indígenas, uma das ações é fazer com que os sistemas de educação favoreçam o uso de uma língua ancestral, já que elas são carregadas de conhecimento em áreas de estudos como agricultura, biologia, astronomia, medicina e meteorologia.

Qual e a importância da preservação da língua e da cultura indígena brasileira?

A cada língua que morre, portanto, desaparecem também partes do patrimônio cultural e histórico da humanidade. É justamente nesse sentido que preservar as línguas e culturas brasileiras é fundamental.

O que e importante preservar a cultura indígena?

A divulgação da cultura indígena pode sensibilizar a população para a importância de viver de forma sustentável e, assim, utilizar práticas conservacionistas e transmitir para as futuras gerações o conhecimento adquirido por esses povos. A valorização da cultura indígena é um dever de todos os países do mundo.