Porque é importante identificar uma pessoa com altas habilidades superdotação?

Desconstruir estigmas para potencializar Altas Habilidades

O Dia Internacional da Superdotação é celebrado no dia 10 de agosto. Com o propósito de desconstruir estigmas e ampliar a conscientização sobre a importância do reconhecimento das potencialidades e necessidades de pessoas com altas habilidades, aqui estão dez respostas para dez perguntas frequentes sobre esse tema.

1. O que é superdotação?

No campo de estudos da neurodiversidade, superdotação é o conceito usado para classificar pessoas que apresentam um alto nível de inteligência em uma ou mais áreas de interesse.

De acordo com a Teoria da Superdotação dos Três Anéis de Renzulli (1978, 1988), ao realizar tarefas que lhe despertam interesse, a pessoa com altas habilidades (PAH) irá sempre apresentar três importantes traços de comportamento:

• Capacidade acima da média: habilidade de processar informações, integrar experiências e adquirir conhecimentos necessários para se adaptar a novas situações;
• Criatividade: curiosidade e capacidade de juntar diferentes informações para propor novas soluções, com originalidade no pensamento, sensibilidade aos detalhes, senso de humor e abertura ao novo e ao diferente;
• Comprometimento com a tarefa: o expressivo interesse em determinada área de atuação pode ser percebido no entusiasmo, na dedicação, na persistência, na adaptabilidade e na autoconfiança que ela demonstra ao resolver seus problemas

2. Onde estão as pessoas superdotadas?

Em todas as áreas da sociedade, se destacando academicamente com alto desempenho em diversas disciplinas ou colocando suas habilidades a serviço da produção criativa, trabalhando em problemas e áreas de estudo que conversam com seus interesses.

Segundo a Organização Mundial de Saúde, cerca de 5% da população mundial é superdotada. Isso quer dizer que, numa sala com 40 estudantes, duas provavelmente possuem altas habilidades e numa empresa com 700 colaboradores, pelo menos 35 pessoas irão apresentar estas características.

Cabe ressaltar que os números da OMS consideram somente pessoas com o QI superior a 130, identificadas em testes que avaliam habilidades mais valorizadas socialmente, como linguística e lógico-matemática. Entretanto, os testes padronizados de inteligênciasão limitados pois desconsideram comportamentos importantes como capacidade de liderança, comunicação e resolução de problemas do dia-a-dia, além de não serem capazes de avaliar fatores emocionais e intrapessoais.

Em 2001, a Associação Gaúcha de Apoio Altas Habilidades / Superdotação (AGAAHSD) entrevistou 1054 estudantes de 384 escolas públicas e privadas da região metropolitana de Porto Alegre e, com base em uma metodologia de avaliação mais integral, encontrou o índice de aproximadamente 8% de pessoas superdotadas.

3. Como identificar uma pessoa superdotada?

O processo de identificação de pessoas com altas habilidades, que leva em conta história de vida, contexto socioeconômico e cultural, a manifestação de potenciais e a intensidade, a frequência e a consistência de seus comportamentos, pode levar de quatro meses a um ano.

A pessoa superdotada é normalmente muito ativa e, quando criança, a falta de desafios educacionais adequados às suas necessidades especiais pode fazer com que ela demonstre desmotivação e falta de interesse. Com base nestes sintomas, muitas são erroneamente diagnosticadas com TDAH (transtorno de déficit de atenção com hiperatividade) e acabam sendo medicadas com drogas com efeitos colaterais perigosos para o seu desenvolvimento.

Em outros casos, devido ao desempenho superior em testes de QI e alta capacidade de memorização, não é raro encontrar pessoas superdotadas sendo diagnosticadas por engano com pertencentes ao espectro do autismo, consequentemente, encaminhadas para tratamentos inadequados. Entretanto, há uma diferença importante entre as duas condições: apesar de muitas vezes se encontrarem em situações de isolamento social por consequência de seus interesses diferenciados ou pelo medo da rejeição, as pessoas superdotadas não apresentam, por natureza, dificuldades com interações sociais.

Uma identificação precoce pode ajudar a família da pessoa superdotada a encontrar espaços que possibilitem que ela se conheça melhor, entenda seus anseios e conviva com pessoas que apresentam características semelhantes, oportunizando um processo de desenvolvimento mais harmônico.

4. As crianças-prodígio da TV são superdotadas?

Nem sempre. Muitas vezes, as reportagens sensacionalistas da TV apresentam crianças com elevado nível de memória — uma capacidade acima da média — mas que não possuem altos níveis de criatividade e comprometimento com as tarefas, como acontece com as superdotadas.

Normalmente, quando atinge a idade adulta, essa criança deixa de chamar a atenção, pois seu desempenho passa a ser condizente com o desempenho de outras pessoas da sua faixa etária. Enquanto a pessoa superdotada irá, dentro da sua área de interesse, ter um desempenho diferenciado de seus pares por toda sua vida.

5. Quais as características de uma pessoa superdotada?

Apesar de não ser possível consolidar um perfil homogêneo, já que o desenvolvimento de alguns traços pode variar de acordo com o contexto sociocultural de cada pessoa, é possível listar as características mais comuns de uma pessoa superdotada:

• rapidez na aprendizagem;
• facilidade para abstração, associações, análise e síntese, generalizações;
• leitura voraz e vocabulário avançado;
• flexibilidade de pensamento;
• produção criativa;
• capacidade de julgamento;
• habilidade para resolver problemas com soluções próprias;
• memória e compreensão incomuns das situações vividas;
• independencia de pensamento;
• talentos específicos, como esportes, música, artes, dança, informática;
• muita curiosidade;
• senso crítico exacerbado;
• senso de humor desenvolvido;
• comportamento cooperativo;
• sensibilidade e empatia ao se comunicar;
• habilidade no trato com as pessoas;
• autoconsciência;
• liderança;
• interesse por assuntos novos e por várias atividades ao mesmo tempo;
• concentração prolongada em atividades de interesse;
• aborrecimento com a rotina;
• gosto por desafios;
• persistência e adaptabilidade perante dificuldades inesperadas;

6. As pessoas com altas habilidades são boas em tudo que fazem?

Os estereótipos e preconceitos associados às pessoas superdotadas reforçam compreensões equivocadas sobre as mesmas, como expectativas de que elas sempre irão realizar contribuições originais, que já nascem sabendo, que pensam de forma mais rápida ou que nunca irão errar.

Na realidade, como qualquer pessoa, a pessoa com altas habilidades também precisa de tempo e empenho para sedesenvolver em suas áreas de interesse. Como, na maioria das vezes, ela se propõe metas incomuns em comparação à seus pares, seus esforços precisam ser ainda maiores para que ela consiga concretizar seus objetivos.

Através da experimentação, ela poderá ir descobrindo novas áreas de interesse, mas não será necessariamente boa em tudo.

De acordo com a Teoria das Inteligências Múltiplas de Gardner (1994, 1999), a pessoa com altas habilidades (PAH)apresenta um desempenho excepcional em uma ou mais áreas do potencial humano, como:

• Inteligência espacial: habilidade de compreender figuras e elaborar mapas, desenhos e esquemas;
• Inteligência corporal: capacidade de usar o próprio corpo para se expressar ou alcançar algum objetivo, como pintar quadros, fazer teatro ou praticar yoga;
• Inteligência musical: sensibilidade em relação a notas e timbres e habilidade de criar músicas e padrões;
• Inteligência linguística: capacidade de aprender idiomas, conhecer palavras, escrever e se comunicar com precisão;
• Inteligência lógica: habilidade para compreender fórmulas, criar raciocínios lógicos, identificar padrões e resolver problemas matemáticos;
• Inteligência interpessoal: facilidade para falar com outras pessoas e compreender expressões faciais, de voz, de gestos e de postura;
• Inteligência intrapessoal: habilidade ligada ao autoconhecimento, nos permite realizar avaliações exatas sobre nossos sentimentos e percepções;
• Inteligência naturalista: sensibilidade em analisar a natureza, identificar espécies e lidar com animais

7. As pessoas superdotadas se envolvem em vários projetos simultâneos?

Nas pessoas superdotadas, o alto grau de curiosidade faz com que a busca por novas atividades e experiências — comportamento observado na maioria das pessoas — seja mais intensa e em um número maior de campos. Além disso, o comprometimento com as tarefas e o alto nível de exigência na execução das mesmas pode fazer com que a pessoa deixe de lado as atividades que não a satisfazem mais para se conseguir se dedicar às atividades que lhe agradam e desafiam.

O interesse por novas atividades também pode vir acompanhado de imersões e momentos onde ela precisa ficar sozinha. Desde que isso não seja prejudicial e não implique num isolamento total, é importante que família e colegas entendam esta necessidade.

8. Como as pessoas com altas habilidades se relacionam?

Ao longo da vida, nem sempre a pessoa com altas habilidades irá encontrar outras pessoas de sua faixa etária com as quais ela possa compartilhar seus interesses. Esse descompasso pode fazer com que ela procure a companhia de pessoas mais velhas (geralmente mais seguras e conscientes de seus interesses) ou de crianças (que ainda não construíram preconceitos e ficam encantadas com quem fala com entusiasmo sobre coisas novas ou diferentes).

Além disso, não é raro encontrar uma pessoa superdotada que, por medo de ser vista como anormal e, consequentemente, ser rejeitada por seus pares, acaba escondendo suas características ou reduzindo seu desempenho. Não poder assumir sua identidade é extremamente prejudicial para a autoconstrução de qualquer pessoa e, para que a pessoa com altas habilidades consiga se aceitar e reconhecer suas potencialidades e limitações, é fundamental o convívio com pessoas que consigam acolher e respeitar seus interesses.

9. As pessoas superdotadas têm mais sucesso profissional?

Na maioria das organizações, predominam relações marcadas por desconfiança e competição, processos rígidos, normas contraditórias, funções com área de atuação limitada, pouca integração entre setores e comunicação deficitária. Infelizmente, ambientes assim não favorecem ninguém, muito menos as pessoas com altas habilidades, que encontram restrições que as impedem de explorar todo seu potencial produtivo e criativo.

“É preciso que as sementes da criatividade, presentes em cada um, sejam permanentemente regadas e cultivadas em um ambiente de trabalho rico em estímulos e desafios, onde haja reconhecimento do potencial e competência de cada indivíduo e onde as relações interpessoais sejam marcadas pela tolerância às divergências, pela harmonia, pelo respeito e pela confiança.”
– Dra. Eunice Soriano de Alencar

O desempenho profissional das pessoas com superdotação depende, em grande parte, do reconhecimento e valorização das suas áreas de interesse e das oportunidades oferecidas pelo ambiente, fazendo com que elas se sintam úteis e capazes de realizações criativas.

10. As pessoas com altas habilidades podem se perder?

A ausência de um ambiente que respeite, estimule e valorize o potencial de uma pessoa com altas habilidades pode resultar num alto grau de angústia, frustração e na compreensão equivocada de que ela não deve investir em seus interesses. Com o tempo, isso pode levar ao desenvolvimento de um comportamento de eterna busca, onde são cristalizados sentimentos de insatisfação, baixa autoestima e descrédito da própria capacidade, fazendo com que seu potencial fique adormecido.

Referência

“Altas Habilidades / Superdotação : respostas a 30 perguntas”
Susana Graciela Pérez Barrera Pérez, Soraia Napoleão Freitas e Associação Gaúcha de Apoio Altas Habilidades / Superdotação (AGAAHSD)
Porto Alegre, Redes Editora, 2011 (1ª edição)

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