Qual o problema envolvido em processos de introdução de espécies exóticas?

A introdução de espécies exóticas é, atualmente, a segunda principal causa de perda de biodiversidade global

Crescer e multiplicar. Ao longo do tempo, diversas espécies desenvolvem mecanismos para se perpetuar em regiões distantes e o próprio ser humano acaba sendo um importante vetor para atravessar barreiras geográficas. Mas quando esse transporte de animais e plantas se torna desenfreado a ponto de atropelar o processo natural, gera-se um dos principais problemas ambientais da atualidade: a proliferação de espécies exóticas, que na ausência de predadores naturais pode se tornar uma verdadeira praga, comprometendo o equilíbrio natural e até ocasionando prejuízos econômicos para o ser humano.

De acordo com o biólogo cearense Marcelo Freire Moro, doutorando em Biologia Vegetal pela Universidade de Campinas (Unicamp), a introdução de espécies exóticas é, atualmente, a segunda principal causa de perda de biodiversidade global, vindo depois da destruição de ecossistemas por meio do desmatamento, poluição etc.

"Nem todas as espécies introduzidas geram problemas. Qualquer espécie que chega de fora de uma região é exótica, mas ela só gera problemas caso se torne invasora, ou seja, caso comece a se espalhar sem controle. Antes de se fazer a introdução de uma planta ou animal em um novo local, existem protocolos de biossegurança para se avaliar qual o risco da espécie se tornar invasora", afirma o biólogo.

O problema, de acordo com ele, é que por motivações que vão desde pressões políticas para cultivar uma espécie com interesse econômico imediato, modismos em relação a plantas ornamentais ou bichos de estimação até a introdução clandestina ou mesmo acidental, estas espécies podem invadir ambientes naturais, prejudicando os exemplares nativos.

Nim-indiano
No Ceará, conforme pesquisa realizada pelo Instituto Horus, foram detectadas 34 espécies exóticas. Dessas, segundo Marcelo Moro, as que vem causando problemas mais evidentes são o escargot africano (Acatina fulica), o arbusto viuvinha (Cryptostegia grandiflora), a leucena (Leucaena leucocephala) e a azeitona-roxa (Syzygium cumini).

Outra espécie que vem sendo observada com atenção é o nim-indiano (Azadirachta indica), muito usada para fins ornamentais e por conta de seu potencial para produzir um inseticida natural. Na opinião do biólogo, a forma indiscriminada como estas plantas são utilizadas pode fazer com que a diversidade das espécies nativas fique desconhecida para os cearenses.

"No livro ´Monoculturas da Mente´, Vandana Shiva lamenta que, na Índia, onde o nim é nativo, as pessoas estejam cegamente plantando árvores de outros países, enquanto ignoram a biodiversidade nativa de lá. Aqui cometemos o mesmo erro: ignoramos as nossas plantas e só cultivamos o que vem de fora. Vandana Shiva provavelmente lamentaria se soubesse que expulsamos as plantas nativas do Ceará das nossas cidades e fomos buscar na Índia plantas totalmente estranhas para cultivarmos", alerta ele.

Com o desenvolvimento de meios de transporte mais modernos e capazes de estar em diferentes continentes, aumenta o potencial de levar espécies exóticas de um lugar para outro. Segundo a professora Helena Matthews-Cascon, doutora em Zoologia pela Universidade de New Hampshire, o trânsito de navios e plataformas de petróleo pelo litoral favorece este intercâmbio, o que pode trazer graves prejuízos para o equilíbrio marinho.

As espécies podem se incrustar no casco de navios ou numa plataforma, sendo levadas para ambientes onde proliferam pela ausência de predadores naturais. Também há o caso delas serem transportadas por meio da água de lastro, que é armazenada em tanques nos porões dos navios, com o objetivo de dar estabilidade às embarcações quando elas estão navegando sem carga.

"Quando esta água é captada no litoral, pode vir carregada de espécies, e quando o navio atraca no destino, a água de lastro é despejada e, junto com ela, traz estas espécies indesejáveis. Há legislações que determinam que a captação e o despejo sejam feitos em alto mar, mas muitas vezes isso pode ser perigoso pelo risco do navio virar".

A professora participa de uma equipe que monitora o aparecimento de espécies exóticas em áreas portuárias. O projeto envolve pesquisadores da Universidade Federal do Ceará (UFC), Universidade Federal do Paraná (UFPR) e Universidade de São Paulo (USP), por meio do Programa Nacional de Cooperação Acadêmica (Procad). "Fazemos o monitoramento na praia e na área portuária, mas o ideal seria se tivéssemos acesso ao local onde fica armazenada a água de lastro, mas é difícil conseguirmos permissão para entrar", diz Helena Cascon.

No litoral cearense, os pesquisadores já identificaram três espécies exóticas: uma concha bivalve oriunda do Caribe, de nome científico Isognomon bicolor, uma espécie de siri do Pacífico (Charybdis helleri) e o Phragmatopoma sp., um polychaeta (lê-se poliqueta) que constrói tubos de areia na praia, de origem desconhecida. Apesar de ainda não ter sido detectados problemas ambientais por aqui, há registros de desequilíbrios em outras regiões do País.

Opinião do especialista
Ser humano mudou 60% da caatinga

A caatinga é uma vegetação adaptada à seca, espinhosa e que perde suas folhas periodicamente. Por muito tempo, foi o bioma brasileiro menos estudado ecologicamente. Talvez, por conta de sua aparência inóspita e a falsa impressão de baixa riqueza biológica. Contudo, atualmente, vem sendo valorizados sua biodiversidade e serviços. Logo, diferentes frentes de investigação surgiram e, rapidamente, produziu-se um diagnóstico, nada agradável, sobre a integridade da biodiversidade. Constatou-se que uma enorme área da mata branca, acima de 60%, já havia sido alterada pelo homem, produto de anos de destruição de habitats, extração excessiva, poluição, fragmentação da paisagem e contaminação biológica. Contaminação biológica é a introdução e adaptação de espécies exóticas num dado lugar. O agente envolvido nesse processo é chamado de bioinvasor, que pode ocupar o espaço de uma espécie nativa e levá-la à extinção; pode quebrar vários processos ecológicos estáveis como cadeia alimentar, polinização, controle biológico etc.; e criar novas paisagens. Os desdobramentos dessas ações podem enfraquecer o desenvolvimento futuro de produtos na área agrícola, médica e industrial, gerando grande impacto econômico e social para a área atingida. As plantas estrangeiras se tornaram tão familiares entre nós, que a olhamos como plantas nativas. Essas plantas nos alimentam e nos alegram com a beleza apresentada, no entanto, algumas delas estão invadindo sutilmente nossas paisagens naturais e levando a significativas transformações.

Arnóbio Cavalcante
Pesquisador do Ministério da Ciência e Tecnologia

Mais informações
Departamento de Biologia da Universidade Federal do Ceará (UFC)
Campus do Pici, Bloco 906
(85) 3366.9810

KAROLINE VIANA
Repórter

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Qual o problema da introdução de espécies exóticas?

A introdução dessas espécies tem consequências negativas não só para o meio ambiente, pois afeta a segurança alimentar, o controle de doenças como a malária e a dengue, entre outras, assim como prejudica a economia.

Qual a problemática associada a introdução de espécies exóticas nos ecossistemas?

A introdução de espécies exóticas em comunidades naturais é, geralmente, mediada pela atividade humana e pode afetar tanto a biodiversidade – por causarem a perda de diversidade biológica, podendo ser considerados “poluentes biológicos”– quanto às atividades econômicas, com danos à atividade pesqueira, riscos ...

Quais são os problemas que pode causar a introdução de uma espécie exótica e dê exemplo de um caso ocorrido no Brasil?

Alguns animais silvestres também encabeçam a lista de problemas ambientais por se estabelecerem fora de seus habitats naturais. Dentre eles estão o javali e o sagui-de-tufos-pretos. O sagui, além de prejudicar as espécies nativas, ao competir por alimento, representa um grande risco à saúde pública.

Quais problemas uma espécie exótica de fora pode trazer para um ecossistema?

Essa espécie invade casas, se alimenta de várias espécies vegetais, causando danos à agricultura e pode transmitir doenças às diferentes espécies, inclusive a humana.