Como é a inclusão dos surdos na sociedade?

Como é a inclusão dos surdos na sociedade?

Andréia Márcia Silva [1]

Deyse Almeida dos Reis [2]

RESUMO

O presente estudo apresenta algumas reflexões sobre a importância da integração entre surdos e ouvintes no âmbito educacional, bem como na dimensão cultural e social. Ressalta-se a importância de surdo e ouvinte manterem uma aprendizagem mútua, um aprendendo a língua e a cultura do outro, para, assim, haver uma comunicação efetiva entre ambos. Nesse sentido, destaca-se o valor da educação regular, da escola, enfatizando a realização de atividades que envolvam a Língua Portuguesa e a Língua de Sinais, considerando dessa forma suas contribuições para esse entrosamento amistoso e essencial, e que venha de maneira significativa contribuir para a sociedade no que diz respeito à considerável e desejada inclusão de todos os brasileiros em suas diversidades, para o desenvolvimento social e cultural do país. Esta pesquisa também aborda as possíveis causas a serem alçadas para a resistência e dificuldade da sociedade em integrar o surdo e sua cultura para uma interação de valores. Além disso, descreve também a preocupação dos responsáveis e pais de crianças e adolescentes surdos que encontram barreiras não apenas na comunicação, mas também em outras questões comuns aos surdos.

Palavras-chave: Integração; Cultura Surda; Relações Interpessoais

Abstract

This study presents some reflections on the importance of integration between deaf and hearing people in the educational field, as well as in the cultural and social dimension. The importance of the deaf and the listener is to maintain a mutual learning, one learning the language and culture of the other, so that there is an effective communication between both. In this sense, the value of regular education, of the school, is emphasized, emphasizing the performance of activities involving the Portuguese Language and Sign Language, thus considering their contributions to this friendly and essential interaction, and which will come in a significant way to contribute for society with regard to the considerable and desired inclusion of all Brazilians in their diversity, for the social and cultural development of the country. This research also addresses the possible causes to be raised for society’s resistance and difficulty in integrating the deaf and their culture for an interaction of values. In addition, it also describes the concern of guardians and parents of deaf children and adolescents who encounter barriers not only in communication, but also in other issues common to the deaf.

Keywords: Integration; Deaf Culture; Interpersonal Relations

  1. Introdução

Entende-se que a Língua de Sinais ainda não é vista como língua para muitos. A Libras precisa ser acolhida e entendida como uma Língua de Sinais constituída de três parâmetros: configuração de mãos; ponto de articulação ou localização; e movimento. Os surdos possuem a sua própria língua, sendo capazes de se expressar e se comunicar com os ouvintes, exprimindo até mesmo o abstrato.

Caracteriza-se a comunicação dos surdos e dos ouvintes distintamente, trata-se a primeira de viso-espacial e a segunda de oral-auditiva. Foi (e ainda é) muito difícil a relação dos surdos e ouvintes na sociedade no decorrer da história. Os surdos, em sua maioria, foram por muito tempo privados de usar a sua língua, além de serem forçados ao uso da língua oral e da leitura labial. Eles também eram castigados, tendo pés e mãos amarrados caso insistissem em comunicar por meio de sinais.

No Brasil, também há relatos de que os surdos eram considerados selvagens, e a Língua de Sinais era proibida, sendo vista como “Código Secreto”, usado às escondidas. Isto não intimidou os surdos, pelo contrário, contribuiu para o fortalecimento da Língua, havendo integração, troca e aperfeiçoamento da mesma ao longo dos anos após muita luta e resistência.

Percebe-se que é preciso uma acessibilidade e interação dos ouvintes para com os surdos, conhecendo o jeito próprio deles de identificação e comunicação. Por exemplo, os surdos não se identificam como deficiente auditivo ou surdo-mudo, formas que reforçam o preconceito. O termo certo a ser usado é surdo, apenas.

Também não se deve entender que, pelo fato de o indivíduo ser surdo, ele tenha alguma deficiência intelectual ou cognitiva. O que acontece é que os surdos percebem de maneira diferente o mundo ao seu redor, os olhos são os seus instrumentos de percepção e interação. Os sons, como, por exemplo, a música, são percebidos pelas vibrações (NOVAES, 2010). Diferente do que pensam os ouvintes, os surdos não precisam ser oralizados para que se possa integrá-los à sociedade, isso seria atitude de negação para com a língua dos surdos. Os surdos possuem a identidade e cultura próprias, e não precisam aceitar a ideologia dos ouvintes de que eles devam ser oralizados para interagirem com a sociedade. Os surdos por meio da sua língua, Libras, são capazes de aprender e construir o próprio conhecimento.

No que diz respeito à educação infantil, é notória a expansão da Libras nesse nível de ensino. Isto é uma consequência de decorrentes estudos sobre as especificidades da criança e suas dicotomias em relação ao adulto, inclusive sobre o desenvolvimento infantil, seus modos e meios de aprendizagem.

Antes de inserir Libras na grade curricular, é imprescindível investir na formação de professores, de gestores escolares, enfim, de toda a comunidade escolar. Dessa forma se lança o alicerce de todo esse processo desejado, desde o congresso sobre a inclusão em Salamanca, no ano de 1994. Refletir a relação existente entre a formação dos profissionais da educação e as práticas pedagógicas é imprescindível para que os alunos tenham qualidade na prestação dos serviços educacionais, de modo que os objetivos possam ser atendidos prontamente.

Daí a importância também de os profissionais que já atuam no sistema educacional se profissionalizarem. A pedagogia da exclusão precisa continuar sendo rebatida, pois a segregação não ficou para trás na prática.

  1. A cultura surda

Sabe-se que os surdos interagem com o mundo manifestando a sua cultura pelo uso da Libras, conforme esclarece o Decreto nº 5.626, de 22 dezembro de 2005 (BRASIL, 2005). Eles possuem a sua própria cultura, e desta fazem parte também familiares, ouvintes, bem como intérpretes, o que permite essa ampla interação com o mundo ouvinte, possibilitando uma enculturação por intermédio da Língua Brasileira de Sinais e do Português.

Se para os surdos se comunicarem e interagirem é preciso estudar Libras e Português, assim deve ser interesse natural dos ouvintes também, além de aprender Português, aprender Libras, favorecendo a ampliação de amizades e crescimento cultural e social.

Quanto ao intérprete, ele tem papel fundamental na cultura do surdo para que o mesmo tenha acesso à cultura brasileira de maneira abrangente. Em um teatro, por exemplo, é muito significativo quando há um intérprete para os surdos também possam participar (SACKS, 2010). No entanto, quando se consideram as escolas de ensino regular, a presença do intérprete existe, mas ainda há problemas. Exemplo disso é o que acontece em minha cidade, em que se destina um intérprete de Libras apenas para acompanhar e auxiliar as salas de aulas onde há crianças surdas. Seria mais proveitoso se todas as crianças ouvintes também aprendessem Libras, o básico de início, e no decorrer dos anos escolares, o intermediário e, por fim, o avançado. Seria uma grande conquista da cultura surda que, a passos lentos, vem conseguindo o espaço que é direito de todos na sociedade.

Outra questão que se pode colocar é a seguinte: E se chegar na escola um professor surdo, diretor e pedagoga conseguirão comunicar com o mesmo? E se os pais de alguma criança forem surdos? Como acolherão os mesmos e comunicarão em dias de reuniões escolares?

É muito ampla essa discussão, seria tema para outras e muitas necessárias pesquisas. A base foi lançada e precisa ser mais fortalecida para que a construção desse valioso processo para a inclusão dos surdos seja uma concreta e consolidada conquista não apenas da e para a comunidade surda, mas para e com todo o Brasil.

  1. O intérprete e a relação interpessoal

O bilinguismo se faz com grande empenho e interesse profissional em relação aos estudos regulares e cursos de idiomas, de inglês e de espanhol, por exemplo. A relação interpessoal acontece com grandes motivações, promovendo até mesmo bolsas de estudos para que acadêmicos se especializem na língua desejada, indo para outros países.

Em Libras não é bem assim, contentam-se com o valioso trabalho dos intérpretes de Libras, para os ouvintes não terem que se ocupar em aprender Libras e, portanto, desenvolver uma relação de diálogo direta para com os surdos.

Grande é a dificuldade para a formação de intérprete e muito mais de acadêmicos para que estejam aptos para promover a relação interpessoal entre surdos e ouvintes.

Como já mencionado, a pedagogia da exclusão necessita continuar sendo combatida, visto que na prática a segregação ainda se mantém. A declaração de Salamanca diz também que

inclusão e participação são essenciais à dignidade humana e ao gozo e exercício dos direitos humanos. No campo de educação, tal se reflete no desenvolvimento de estratégias que procuram proporcionar uma equalização genuína de oportunidades. A experiência em muitos países demonstra que a integração das crianças e dos jovens com necessidades educacionais especiais é mais eficazmente alcançada em escolas inclusivas que servem a todas as crianças de uma comunidade (UNESCO, 1994, p. 61).

Observa-se que os surdos passam por sérias dificuldades de comunicação em lugares que não encontram pessoas que saibam Libras. Algumas repartições públicas contam com o auxílio de intérpretes de Libras, mas isso não resolve o problema da inclusão dos surdos na sociedade. Da mesma forma que pessoas ouvintes estabelecem comunicação apropriada em qualquer lugar, o sujeito surdo também deveria estabelecer.

Se o problema da inclusão não for solucionado de uma vez por todas, a sociedade continuará sentindo dificuldades quando necessitar estabelecer comunicação com o sujeito surdo. E consequentemente o surdo e sua comunidade continuarão sem voz perante a sociedade, necessitando urgentemente se fazer ouvir para granjear o respeito à sua identidade.

No sistema educacional há algumas crianças que por algum motivo demonstram dificuldades de compreensão e por isso não assimilam os conteúdos explanados em sala de aula, resultando assim em negativos resultados de desenvolvimento intelectual. Essas dificuldades é que provocam o fracasso escolar. Muitas dessas crianças com baixo rendimento escolar são surdas, e o interessante é que raramente crianças surdas demonstram prejuízos cognitivos, mesmo porque tais problemas não estão relacionados com a surdez.

A psicologia também estudou algumas possíveis causas do fracasso escolar:

Cada aluno possui características individuais, sendo elas as responsáveis pelo sucesso ou fracasso escolar. As diferenças individuais, legitimadas pela Psicologia, eram identificadas por meio da mensuração de aptidões intelectuais, prontidão para aprendizagem, inteligência ou coeficiente intelectual, a partir de testes, escalas, questionários etc. (GRINSPUN, 2011, p. 83).

De acordo com Nietzsche (2007), nossa dor vem da distância entre aquilo que somos e o que idealizamos ser. Essas palavras propõem uma reflexão sobre a dor. Quando estamos distantes da realização de um desejo, seja ele qual for, sentimos dor. Para o sujeito surdo, a dor nasce quando este percebe a significação de ser surdo para a sociedade.

Quando se é surdo, o indivíduo é reconhecido como pertencente ao grupo dos que não ouvem, mas isso não ocorre com o sujeito ouvinte, pois este é reconhecido pelo papel que desempenha em sociedade. Essa diferença produz dor ao surdo, pois isso mostra que ainda não é considerado um ser social (RODRIGUES, 2006). Outra fonte de dor para a cultura surda é o fato de que o direito à comunicação por meio de intérprete já existe, mas esse direito não está disponível em seu cotidiano.

As repartições públicas também precisam se interessar em capacitar os funcionários para que acertem no melhor acolhimento e atendimento aos surdos, em suas mais variadas necessidades, comum às necessidades dos ouvintes. As instituições escolares reconhecem que faltam profissionais qualificados no que diz respeito à comunicação com os surdos, bem como ao conhecimento referente à cultura surda.

Considerações finais

Partindo das constatações feitas até aqui e considerando que a questão da inclusão social de acordo com esta pesquisa se dá no âmbito escolar, é importante salientar que o corpo docente tem um papel fundamental nessa questão, visto que, quando há alunos surdos ou com qualquer outra necessidade especial de aprendizagem, não é apropriado segregar ou prestar um serviço de qualidade inferior por falta de habilidades com a Língua de Sinais, por exemplo. Isso implica dizer que mediar o conhecimento é apenas uma das responsabilidades. E como o ambiente escolar é o lugar onde ocorre interação entre os estudantes e professores, a Língua de Sinais deveria ser objeto de estudo de todos os membros da escola.

Em muitos casos, o que se observa no âmbito escolar é a rejeição ou a avaliação de escrita de menor valor por parte do surdo, embora a Lei nº 10.436/2002 reza que o surdo tem o direito de fazer uso da Libras, visto que é sua língua natural.

Há de acontecer um grande e importante despertar para que as escolas regulares sejam realmente inclusivas e efetivas, promovendo a necessária integração social e cultural. Embora os professores intérpretes sejam importantes, ainda são poucos, o que reforça a necessidade de toda a comunidade educativa aprender Libras.

Referências

BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. SECRETARIA DE EDUCAÇÃO ESPECIAL. Decreto Nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005. Regulamenta a Lei Nº 10.436, de 24 de abril de 2002. 2005.

GRINSPUN, M. P. S. Z. A Orientação Educacional: conflito de paradigmas e alternativas para a escola. 5° edição, São Paulo: Cortez,2011.

NIETZSCHE, Friedrich. Humano, demasiado humano. São Paulo: Escala, 2007.

NOVAES, Edmarcius Carvalho. Surdos – Educação, direito e cidadania. Rio de Janeiro: Wak Ed, 2010.

RODRIGUES, DAVID (org.) Inclusão e Educação: doze olhares sobre a educação inclusiva. São Paulo: Summus, 2006.

SACKS, Oliver. Vendo Vozes – uma viagem ao mundo dos surdos. Tradução Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.

UNESCO- Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura. Declaração de Salamanca e linha de ação: necessidades educativas especiais. Unesco: Salamanca, 1994.

Citação deste artigo

SILVA, A. M.; REIS, D. A. Importância da inclusão dos surdos em escolas regulares. Revista Virtual P@rtes, 2020.

[1] Pedagoga. Especialista em LIBRAS pela Faculdade Educacional da Lapa. E-mail:

[2] Gestora da Qualidade e Bióloga. Doutora em Engenharia Ambiental pela Universidade Federal de Ouro Preto. E-mail:

Qual a importância da inclusão social para os surdos?

Os surdos possuem a identidade e cultura próprias, e não precisam aceitar a ideologia dos ouvintes de que eles devam ser oralizados para interagirem com a sociedade. Os surdos por meio da sua língua, Libras, são capazes de aprender e construir o próprio conhecimento.

Como é a inclusão de surdos na educação escolar e na sociedade?

A inclusão dos estudantes surdos é recente nas escolas, causando ainda muita dificuldade no âmbito escolar e para o próprio professor que muitas vezes não tem habilidade na língua dos sinais “Libras” aprendendo dentro de sala de aulas com os colegas dos estudantes surdos que também se comunicam com dificuldade com os ...

Quais os desafios encontrados na inclusão dos surdos na sociedade?

A principal dificuldade dos surdos é a comunicação, sendo ela crucial para o desenvolvimento humano como ser social e intelectual, a pessoa com surdez sofre devido a problemas na comunicação, não conseguindo ao menos acesso à uma boa educação.

Como incluir os surdos?

Então usem a literatura surda para mostrar a diversidade surda para o aluno surdo e para os demais. É importante explicar aos demais alunos sobre o aluno surdo e como se comunicar com ele. O pré-conceito pode ser amenizado. O preconceito pode ser combatido com informação.